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REVISTA DA ARMADA | 493
Stratεgia 9
NATO E UE
INTRODUÇÃO
No último texto apresentou-se a Estratégia da UE para a Segu-
rança Marítima (EUESM), tendo ficado prometida uma discussão
sobre a articulação entre a NATO e a UE no domínio marítimo.
Contudo, antes dessa discussão, importa abordar, numa perspe-
tiva macro, o relacionamento entre as duas organizações.
NATUREZA DAS DUAS ORGANIZAÇÕES Foto EMGFA
Naturalmente, esse relacionamento é determinado pelos seus Militares portugueses na operação ALTHEA, em que a UE emprega capacidades da NATO
diferentes âmbitos. Assim, enquanto a NATO consiste numa ao abrigo dos acordos de Berlim
aliança político-militar baseada num compromisso de defesa co-
letiva bastante claro, explícito e robusto, a UE tem privilegiado as Europeia de Segurança sublinha a importância dos acordos de
dimensões política, económica e, até, judiciária, no processo de Berlim, que por aquela altura se revelariam bastante úteis para a
integração europeia. UE, nomeadamente em duas ocasiões históricas.
Efetivamente, o célebre artigo 5º do Tratado de Washington, Primeiro, em março de 2003, na Antiga República Jugoslava da
que criou a NATO em 1949, estabelece, sem ambiguidades, que Macedónia, quando a UE encetou a operação CONCORDIA (em
um ataque contra um Aliado é considerado como um ataque substituição da operação ALLIED HARMONY da NATO), empre-
contra todos, prevendo-se explicitamente o uso da força armada gando meios disponibilizados pela NATO.
para restaurar a segurança aliada.
Segundo, em dezembro de 2004, na Bósnia e Herzegovina, quan-
A UE nunca teve uma disposição igual, embora o Tratado de do a UE substituiu mais uma vez a NATO (com a EUFOR – European
Lisboa (que foi aprovado em dezembro de 2007 e entrou em vi- Union Force a tomar o lugar da SFOR – Stabilisation Force, da NATO).
gor dois anos depois) tenha introduzido uma cláusula que esta- Refira-se que esta operação da UE, designada como operação AL-
belece que “se um Estado Membro vier a ser alvo de agressão ar- THEA, ainda se mantém ativa, continuando a beneficiar de capaci-
mada no seu território, os outros Estados Membros devem pres- dades aliadas disponibilizadas ao abrigo dos acordos de Berlim.
tar-lhe auxílio e assistência por todos os meios ao seu alcance”i.
Esta cláusula é menos robusta que a da NATO, por não obrigar a Entretanto, pouco depois da aprovação da Estratégia Europeia
uma resposta militar coletiva. de Segurança, as duas organizações estabeleceram representa-
ções militares permanentes nos quartéis-generais uma da outra,
Além disso, as missões da Política Comum de Segurança e De- para facilitar a coordenação ao nível operacional. Assim, a NATO
fesa (PCSD) incluídas no Tratado de Lisboa (que têm por base as possui uma equipa de ligação junto do Military Staff da UE desde
designadas “missões de Petersberg”ii), apenas preveem o empre- novembro de 2005, ao passo que a UE estabeleceu uma célula no
go de forças de combate da UE em missões de gestão de crises. Allied Command Operations da NATO, a partir de março de 2006.
Finalmente, o próprio Tratado de Lisboa assume que “os com- Em 2010, o Conceito Estratégico da NATO, aprovado na cimeira
promissos e a cooperação neste domínio [da segurança e defesa] realizada em Lisboa, identificou a UE como um parceiro “único e
respeitam os compromissos assumidos no quadro da NATO, que, essencial” da Aliança Atlântica e comprometeu-se a “fortalecer
para os Estados que são membros desta organização, continua a a parceria estratégica com a UE, no espírito mútuo de abertura,
ser o fundamento da sua defesa coletiva e a instância apropriada transparência, complementaridade e respeito pela autonomia e
para a realizar”. integridade institucional de ambas as organizações”.
ALGUNS MARCOS HISTÓRICOS Mais recentemente, a UE dedicou o Conselho Europeu de de-
zembro de 2013 à segurança e defesa, tendo sido convidado para
Com efeito, a UE sempre assumiu a ligação da defesa europeia estar presente o então Secretário-Geral da NATO, Anders Fogh
à NATO, a qual foi formalizada em 2002, através de uma declara- Rasmussen. As conclusões desse conselho reafirmam que “a PCSD
ção comum, intitulada “NATO-EU Declaration on a European Se- continuará a desenvolver-se em total complementaridade com a
curity and Defence Policy”, que viria a ter continuação nos “Berlin NATO, dentro do enquadramento acordado para a parceria estra-
Plus Arrangements” (ou acordos de Berlim), de 2003, que permi- tégica entre a UE e a NATO e respeitando a autonomia de decisão
tem à UE o acesso às capacidades militares da NATO, em caso de e os procedimentos de cada organização”. Esse Conselho Europeu
necessidade – requerendo, contudo, a aprovação dos 28 Aliados. também instou à aprovação da EUESM, até junho de 2014.
Entretanto, também em 2003, a UE aprovou a sua Estratégia
Europeia de Segurança, um documento inédito, que visou esta-
belecer uma doutrina para a política externa e de segurança eu-
ropeia. Provavelmente por ser um documento fundador daquilo
que se pretendia que fosse a identidade de defesa europeia, o
texto faz poucas referências à NATO. Não obstante, a Estratégia
4 FEVEREIRO 2015