A CLM tem por objetivo compilar a legislação que se considera poder dar um contributo útil à missão desempenhada pelos meios navais de fiscalização, pelo que tenta abarcar as principais áreas de atuação dos mesmos.

Devido à sua vertente essencialmente prática, a CLM contém, tanto quanto possível, textos consolidados (textos nos quais foram introduzidas todas as alterações e retificações posteriores), não sendo a consolidação de todos oficial, recomenda-se a consulta dos textos oficiais para garantir a conformidade com os mesmos.

De forma a facilitar a consulta da mesma faz-se em seguida referência a alguns conceitos essenciais de direito.

 

 

Noções fundamentais de Direito

 

1.               Fontes de Direito[1]

a.               Fontes internas

São fontes diretas do Direito Interno: a lei e as normas corporativas, art. 1.º do Código Civil (CC).

São também fonte de Direito as decisões do Tribunal Constitucional, art. 281.º e 282.º da Constituição da República Portuguesa.

(1)             Fontes de Direito segundo a sua hierarquia:

(a)             Constituição da República Portuguesa (CRP)

(b)             Normas e princípios de Direito Internacional geral ou comum, convenções e tratados internacionais (art. 8.º CRP)

(c)             Leis, decretos-lei e decretos legislativos regionais (art. 112.º CRP)

(d)             Decretos regulamentares

(e)             Decretos regulamentares regionais

(f)              Resoluções conselho de ministros

(g)             Portarias

(h)             Despachos

(i)               Posturas

(2)             Regras relativas à hierarquia:

(a)             Normas especiais[2] prevalecem sobre normas gerais

(b)             Normas de grau inferior não podem contrariar outras de grau superior

(c)             Os decretos legislativos regionais não podem contrariar as leis e os decretos-leis

(d)             A hierarquia das leis respeita a hierarquia dos órgãos de onde são emanadas

(e)             Norma posterior revoga norma anterior da mesma hierarquia

(f)              Atos legislativos dos órgãos de administração central prevalecem sobre os atos legislativos dos órgãos de administração local e ambos sobre as leis dos órgãos corporativos

(g)             Lei tem o mesmo valor que decreto-lei, há, no entanto, matérias que são da competência absoluta do Governo (art. 198.º n.º 2 da CRP, pelo que terão a forma de decreto-lei), ou da Assembleia da República (art. 164.º da CRP, pelo que terão a forma de lei), nas demais matérias há competência relativa da Assembleia da República ou competência concorrencial entre ambos

b.               Fontes comunitárias

(1)             Direito Comunitário Originário: Conjunto de normas que estão na origem ou integram os tratados constitutivos das comunidades europeias (Tratado de Paris e Tratado de Roma) e todas as outras que alteraram ou completaram os primeiros (nomeadamente Tratado de Lisboa).

(2)             Direito Comunitário Derivado: Normas diretamente criadas pelas instituições comunitárias com competência para tal, tendo em vista a execução dos tratados comunitários: regulamentos, diretivas, decisões, recomendações e pareceres:

(a)             Regulamentos – têm carácter geral, são obrigatórios e diretamente aplicáveis em todos os Estados-membros.

Integram-se automaticamente na ordem jurídica interna dos Estados-membros, onde entram diretamente em vigor, ao 20.º dia após a sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia caso não haja prazo diverso estipulado no próprio regulamento.

(b)             Diretivas – vinculam os Estados-membros a que se dirigem apenas quanto ao resultado a alcançar. As instâncias nacionais têm autonomia para escolher as formas e os meios para o atingir.

Para que vigorem num Estado-membro é necessário que sejam transpostas para o Direito nacional.

(c)             Decisões – Impõem o resultado a atingir e a modalidade de execução, são vinculativas, na sua totalidade, para os destinatários que designaram.

(d)             Recomendações – Não têm carácter vinculativo, são uma forma de ação indireta da autoridade comunitária tendo em vista nomeadamente a adequação do direito interno dos Estados-membros ao direito comunitário.

(e)             Pareceres – abarcam diversas formas de atos e não têm carácter vinculativo.

c.               Regras relativas à aplicação do Direito comunitário:

(1)             Princípio do primado do direito comunitário sobre o direito interno, no entanto direito derivado que contrarie a CRP pode ser declarado inválido por tribunais nacionais.

(2)             Princípio da aplicabilidade direta – suscetibilidade que uma norma comunitária tem de se aplicar aos Estados-membros sem necessidade de qualquer ato de transposição para a legislação nacional.

(3)             Princípio do efeito direto – os particulares têm a possibilidade de invocar no tribunal competente, uma norma de direito comunitário (que seja clara, precisa e incondicional) para afastar uma norma de direito nacional que lhes é desfavorável.

d.               Direito Internacional Público

O Direito Internacional Público é o conjunto de princípios e regras jurídicas, que regula a comunidade internacional.

Fontes de Direito Internacional Público

Convenções internacionais, costume internacional, princípios gerais de Direito e atos unilaterais.

São modos auxiliares de determinação das regras jurídicas a doutrina[3] e a jurisprudência[4].

(1)             Convenção internacional (tratados, acordos, convenções, pactos, etc.) – É uma manifestação de vontades concordantes, entre dois ou mais sujeitos de Direito Internacional (Estados e organizações internacionais), destinada a vincular juridicamente a conduta desses sujeitos.

Um Estado pode aceitar fazer parte de um tratado multilateral com reservas, para tal declara ou que exclui certas cláusulas ou que pretende modificá-las, atribuindo-lhes um significado diverso.

Um tratado só pode criar obrigações ou direitos para Estados terceiros se estes aceitarem: expressamente por escrito no caso de obrigações (acordo colateral), ou tacitamente no caso de direitos.

As disposições constantes de convenções internacionais podem indiciar a formação de um costume geral e, em resultado, tornarem-se obrigatórias para Estados não partes.

Ex. Carta das Nações Unidas, Convenção de Montego Bay sobre Direito do mar, Convenção sobre genocídio, etc.

Existem determinadas convenções internacionais que, destinando-se a instituir certos estatutos políticos ou territoriais, apresentam o carácter de verdadeiro direito objetivo, e, nessa medida, os seus efeitos jurídicos fazem-se sentir para além do círculo mais ou menos restrito de contratantes (ex. as convenções que consagram a liberdade de navegação nos canais do Suez, Panamá e Reno).

De acordo com a CRP as normas constantes dos tratados internacionais, depois de aprovadas pela Assembleia da República, ou pelo Governo, ratificadas[5] pelo Presidente da República e publicadas em Diário da República, fazem automaticamente parte do Direito português (art. 8.º n.º 2 da CRP).

As normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais a que Portugal pertence, vigoram diretamente na ordem interna se tal se encontrar expressamente previsto nos respetivos tratados; é o caso, nomeadamente, dos regulamentos e diretivas da UE (art. 8.º n.º 3 da CRP) e das resoluções do Conselho de Segurança da ONU (art. 25.º Carta das Nações Unidas).

(2)             Costume internacional (direito consuetudinário internacional) - forma de proceder constante e uniforme adoptada pelos membros da comunidade internacional acompanhada da convicção da obrigatoriedade da norma que lhe corresponde.

(3)             Princípios gerais de Direito – as grandes orientações da ordem jurídica que exprimem, diretrizes, critérios ou valores que traduzem exigências fundamentais feitas a todo o ordenamento jurídico (ex. princípio da proibição do recurso à força nas relações internacionais).

(4)             Atos unilaterais – ato imputável a um só sujeito de Direito Internacional, destinado a produzir determinados efeitos jurídicos (ex.: notificação, promessa, renúncia).

 

2.               Vigência da lei

A lei entra em vigor cinco dias após a sua publicação no Diário da República (este prazo conta-se a partir do dia seguinte ao da sua disponibilização na Internet em www.dre.pt), exceto quando determinado prazo diverso no próprio diploma.

Cessação da vigência (art. 7.º CC):

a.               Caducidade – quando o diploma determina a data em que deixa de vigorar e é chegada essa data, ou quando a realidade que a lei regula deixa de existir.

b.               Revogação (total ou parcial) – ou por declaração expressa da nova lei ou por incompatibilidade entre as novas disposições e as regras precedentes.

A lei geral não revoga lei especial exceto se for essa a intenção inequívoca do legislador.

A revogação de uma lei revogatória não faz renascer a lei anteriormente revogada.

 

3.               Aplicação da lei no tempo (art. 12.º CC):

a.               Princípio da não retroatividade - a lei só dispõe para o futuro, aplica-se, por isso, só aos acontecimentos que tenham lugar depois de entrar em vigor. Ainda que lhe seja atribuída eficácia retroativa, ficam, no entanto, ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.

b.               Repristinação – quando uma lei revogada renasce em consequência da revogação ou da caducidade da lei que a revogara. Este efeito só se verifica se for expressamente previsto por uma disposição repristinatória (art. 7.º n.º 4 CC).

 

4.               Aplicação da lei no espaço

a.               Princípio da territorialidade das leis – a lei de um Estado só é aplicável dentro do território desse Estado (a nacionais, estrangeiros e apátridas).

Este princípio tem algumas exceções, pois, por vezes, as leis de certo Estado poderão ser aplicadas fora do seu próprio território, ou deixarem de poder ser aplicadas no seu próprio território. Exemplos: bases militares de um Estado em território estrangeiro, navios e aeronaves militares que se consideram como parte do território do Estado a que pertencem (art. 24.º CC).

Existem relações jurídicas em contacto com mais de um Direito Estadual, a questão que se coloca então é a de saber qual o Direito que regula o caso.

b.               Princípio da não transatividade: só se aplicam as leis que tenham um qualquer contacto com os factos, o julgador determina a regra aplicável de acordo com as regras de conflitos (arts.º 25.º a 65.º do CC).

 

Glossário:

Contraordenação – facto ilícito e censurável que preenche um tipo legal passível de uma coima.

Ilícito – ato exterior do Homem, que pode consistir numa ação ou omissão, que resulta de uma formação da vontade do agente e que gera um resultado lesivo de um interesse juridicamente protegido.



[1] Modos de formação e revelação das normas jurídicas.

[2] Lei cuja previsão se insere na de outra lei (lei geral) como caso particular, para estabelecimento de um regime diferente.

[3] São as opiniões ou pareceres dos jurisconsultos acerca duma questão de Direito, expostas em tratados, manuais, monografias, recensões, pareceres, etc.

[4] É o conjunto das decisões dos tribunais, a doutrina jurídica estabelecida pelos tribunais nas suas sentenças. Estas, esgotadas as possibilidades de recurso, formam caso julgado (ficando assim definitivamente decidida a questão sobre a qual se tenha pronunciado o tribunal).

[5] Ato jurídico individual e solene pelo qual o órgão competente do Estado afirma a vontade de estar vinculado ao tratado cujo texto foi por ele assinado.