Page 368 - Revista da Armada
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- Bem , então é melhor dizer isso ao co mandante blemas. Até eu próprio lhe pertencia, naquele mo-
e reduzir o número de rotações. Talvez melhore mento era «os seus olhos e o seu cérebro».
o balanço. Olhe, mande dar-lhes um «refresco »! O tempo deixou de ter significado para mim. Sobre
O moço do paiol que encha uma cafeteira com uns as ondas que importa a noção de tempo?
três litros de vinho e junte-lhe açúcar e gelo. Interessa-nos bem mais esse que nós sentimos no
- Melhor, senhor imed iato! Vou para baixo e aviso corpo e que o navio também sente.
o comandante . Só para uma co isa vale a pena pensar no tempo e
Bom homem, este Silva. Eu tinha embarcado na é esperar o render do quarto. Então, o tempo parece
véspera, mas já vira como era desenrascado e leal. ter pregu iça e vinga-se do desprezo com que o tra-
Apareceu-me o c'abo de quarto a dar-me as rotações . támos. E fo i, assim, numa ânsia terrível, que passei
Das 18.00 às 19.00 não tínhamos ultrapassado a a última hora do quarto. Sentia-me cansado e com-
média de 90 rotações por minuto. pletamente gelado. Com o enjoo tin!la desaparecido
- Ai, senhor imediato, esta gente há muito que não a fome e a única coisa que eu naquele momento
navegava! Vem tudo de «molho», os fogueiros, então , desejava ardentemente era o meu beliche.
é uma lástima! Faltavam uns minutos para as 20.00, o comandante
E lá se foi . Ficou tudo quedo e em silêncio. apareceu para me render. Vinha um bocado enjoado,
Em silêncio? ! Que força de expressão ! Quando se mas mesmo assim bem disposto e amável.
tem vento de força 5 e vaga pelo través, pode-se Entreguei-lhe o quarto. E que quarto ! Desped i-me e
ainda falar em silênc io num navio destes?!. .. precipitei-me para o meu camarote.
Mas, enfim, no silêncio psico lógico que me rodeava, Havia um granel de co isas de ixadas ali à partida,
já não me considerava só. Sentia pu Isar o coração mas isso pouco me importou , estend i-me no beliche
do meu pequeno navio, ad ivinhava-lhe as suas e ràp id amente adormeci. Cruz Júnior
angústias, procurava soluções para os seus pro- Cap.-frag.
a avassalar o Mundo,
a recalcar as almas,
não perdoando ao pária que passou!
<:: E já na extrema curva da lonjura,
::::
o triste caminhante
em desagravo à ânsia
~
~ ,. à alígera amargura
:..:
" ao feroz desatino
<: ao cruel desamor
"-
.~ alucinadamente grita e clama:
'-'
'-'o Que o céu seja um infinito mar de dor ...
Que a terra seja feita em mar de chama!
" E da janela do infinito
minha alma debruçada,
.;.. vê que pra lá da sombra não há nada!
Sombras que passam Não há mais do que a sombra ainda maior. ..
altivas
A sombra! A sombra do Destino!
enfunadas
galardoadas de ouro e à semelhança E interrogando a viração do Mundo,
de um rei feudal que tudo pode e quer ... o rodopio da vida
e o enigma do céu tudo em redor ,
Umas cor-de-rosa,
minha alma inconformada,
outras de esperança
tristonha,
e outras ainda cor de malmequer ...
emudecida,
E desvairadas,
à sombra que passou, pérfida e fria,
passam, correm, giram loucas,
procura em vão ...
como as almas danadas e perdidas, CRIST ALlZAR EM FLOR.
a semear o fel das nossas bocas.
Maria Teresa
a assinalar de trevas as estradas,
a dar tédio e negrume às noites calmas, Escrit. dactilógrafa
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