Page 153 - Revista da Armada
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nau:. pediu ou. melhor dizendo. ordenou   cento e cinquenta por bordo.  No entan-  eram aqueles que o levavam para Mala-
        aos reis das cinco pequenas ilhas de .. Ma·   to. mesmo dispondo de grande superio-  ca e.  a  partir dali,  faziam  a sua  distri-
        luco,. que dei~3ssem de vender cravo aos   ridade numérica. as coracoras rarameme   buição  pelos  mercados  consumidores.
        bandaneses e o  passassem  a vender ex·   se atreviam a atacar os navios portugue-  No entanto, por mais paradoxal que isso
        clusivamente  aos  portugueses.  A  ideia   ses  com  medo da  sua  artilharia.   possa  parecer.  o  monopólio do comér-
        era  que daí para  futuro.  quem quisesse   .Por  isso,  o  rei  de  Tidore  resolveu   cio  do  cravo  acabou  por  redundar  cm
        cravo o fosse comprar a Malaca!  Deste   usar de um estratagema.  Mandou meter   prejufzo para os portugueses! A ganân-
        modo se abandonava a  política de con·   numa  calheta.  que  tinha  um  banco  de   cia dos capitães,  fidalgos e soldados que
        vivência.  preconizada  por  Afonso  de   areia à entrada, as suas corocoras camu-  iam a Temalc era tal que compravam o
        Albuquerque. e se enveredava por uma   fladas  com  ramos de árvores  e deu or-  cravo por preço  muito superior ao que
        política de hegemonia  apoiada  na  força   dem a uma delas para, durante a  noite,   estava estipulado.  Durante mais de cinco
        militar.                           se  fazer  ao  mar e  regressar,  na  manhã   anos. o feitor da fortaleza não conseguiu
           é claro que os reis das ilhas de -Ma-  seguinte, como se trouxesse mantimen-  comprar um  único  fardo de cravo!  Em
        luco,.  não tiveram outro  remédio senão   tos de Geilolo. Assim fez a corocora. E,   resultado disso, o cravo que se comprava
        dizer que sim a  António de Brito  mas,   tal  como  previra  o  rei  de  Tidore,  logo   em Malaca, para ser levado para a fndia
        à  socapa.  iam  continuando  a  vender  o   que Jorge Pinto a avistou, meleu-se pes-  e  depois  para  Lisboa.  passou  a  custar
        cravo aos juncos bandaneses que apare-  soalmente no calaluz e foi atrás dela. le-  cerca de quatro vezes mais do que quan-
        ciam  nos seus  portos.            vando consigo apenas  seis  portugueses   do era para ali  levado pelos mercadores
           Provavelmente cm fins de  1522. sa-  e cerca de cinquenta  lemates.   javos!
        bendo  António de  Brilo que cm Tidore   Dirigiu-se  a  corocora  rapidamente   A respeito da incapacidade dos nos·
        estavam  alguns  juncos  de  Banda  car-  para a calheta e. como ia descarregada   sos  fidalgos  e soldados para comerciar
        regando  cravo.  mandou  lá  António  e calava  pouco,  passou sem dificuldade   nos  mercados  sofisticados  do  Oriente.
        Tavares  numa  fUSla  para  os  expulsar.   por cima do banco de areia.  Mas o mes-  faz João de Barros este saboroso comen-
        Chegado  e.Sle  a  Tidore,  sem  qualquer   mo não aconteceu com o ealaluz. Calan-  tário no livro V das suas .. Décadas,.:  «E
        manifestação de  respeito pela autorida·   do mais e  indo pesado com artilharia e   como  os  Gentios  e  Mouros  daquele
        de do  rei.  intimou os juncos a abando-  a gente que levava, encalhou no banco.   Oriente,  em  comprar  e  vender  são  os
        narem o  porto. embora ainda não fosse   Nesse mesmo instante. as eorocoras que   mais delgados e subtis homens do mun-
        a época própria para a viagem de regres·   estavam emboscadas acorreram, cerca-  do e sobre isso paciemes e frios em des-
        so a  Banda.  E.  como aqueles  não obe-  ram  o  calaluz  e  começaram  a  lançar   cobrir seus apetites e necessidades. que
        decessem  prontamente,  começou  às   sobre ele grande quantidade de flechas   ninguém lhes sente: sempre neste acto do
        bombardadas  a  eles.  obrigando--os  a   e de pedras. Defenderam-se os portugue-  comércio nos levam debaixo, como nós
        fazerem·se  ao  mar.  Não contente com   ses e os seus aliados temutes com  toda   com os da  guerra os sopeamos ...
        isso.  deixou-se  ficar  diante  da  cidade   a coragem, matando e ferindo muitos dos
        para  impedir  que  os  juncos  pudessem   atacantes mas acabaram por sucumbir ao
        voltar.                            elevado  número  destcs,  sendo  todos
           Como é natural. o rei de Tidorc ficou   mortos.
        muito escandalizado com o procedimento   Ainda acorreu.  em  auxnio do cala-
        dos Portugueses e. passados alguns dias.   luz, o batel artilhado mas fê-lo com pou-
        tendo  a  fusta  dado  à  costa  com  um   ca convicção,  por recear encalhar, e da
        temporal.  mandou matar lodos os seus   sua  intervenção  nada  resultou.
        tripulantes  que  conseguiram  salvar-se.   No  entanto, apesar deste desaire.  o
           A panir deste incidente, reacendeu-  domínio do  mar continuou  a  pertencer
        -se a guerra entre temates e tidores.  os   indiscutivelmente aos portugueses. o que
        primeiros auxiliados pelos portugueses.   lhes permitia desembarcarem de surpresa
        os segundos auxiliados pelos geilolos. De  jumo das povoações mais imponanlCS de
        começo,  sofreram  os  nossos  alguns   Tidore e dCSlrUf-las uma após outra, ao
        desaires mas, com o andar do tempo, o   mesmo  tempo  que continuavam  a  blo-
        domínio  do  mar  de  que  dispunham   quear  estreitamente  a  ilha,  impedindo
        começou  a jogar  a  seu  favor e  conse-  que entrassem nela os mantimentos vin-
        guiram  alcançar grandes  vitórias.   dos de Geilolo.
           No ano de  1524, em data que não é   Nestas circunstâncias. o rei de Tidore
        possfvel  precisar  com  maior  rigor.   acabou por se ver forçado a pedir a paz
        encontrava-se  bloqueando  o  porto  de   a António de BrilO. Mas este, para fazer
        Tidore uma esquadra portuguesa capita-  a vontade a Cachil Daroés, que era o ho-
        neada  por Jorge Pinto.  constitufda  por   mem forte de Temate. não lha concedeu   Sarumino MOnl~jro,
        duas  naus  pequenas.  um  calaluz e  um   e a guerra  prosseguiu embora, durante                CMG
        batel artilhado.  Dispunha o rei de Tidore   uns tempos, sem operações militares de
        de  numerosas  corocoras  que  eram  as   vulto.
        embarcações de  guerra daquela  região.   Será oportuno dizer que,  em  resul-  8ib/iogrofia:  .lIisI(jn·o  do  Dncobrim"llIO  t
        espécie de grandes pirogas que podiam   tado  da  presença  dos  portugueses  em   ClmquiJlII do/mlio fUlos POl1ugul!s"s~ dr F .. mao
        armar velas de esteira mas que, normal-  Temate. reduziu-se consideravelmente o   Úlpt'S dt Ca.sI/UlIt~da: .Dkodas. dI! JoIIo dI' Sor-
                                                                             ros;  -l.Lndns da  /mlio,. dI!  Gos/Mr Cornju.
        mente. eram propulsionadas com remos   fluxo de cravo das ilhas de _Maluco_ pa-
        de pangaio. cujo número podia atingir os   ra as ilhas de Banda e Amboíno. Agora,   ••••••••••••••••••

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