Page 241 - Revista da Armada
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a realizar. Chegados a Aveiro em 22 de Janeiro  cidade ficando com uma embocadura de 120   A nova Barra de Aveiro é a melhor de Portu-
         deram logo início aos estudos necessários ao  braças de largo e 35 palmos de profundidade,  gal depois de Lisboa; ela fará duplicar o valor-
         trabalho que lhes foi cometido.    capaz de toda a navegação; podendo dizer-se  de toda a Província da Beira, e com o tempo a
           Reinaldo Oudinot foi forçado a deixar o car-  com verdade que esta barra ficou a melhor que  sua população. Por efeito dela já estão enxutos
         go de responsável pelas obras logo em 1803  temos na costa do Norte...”  e restituidos à lavoura, campos que estavam
         para acorrer a outra situação difícil: as inunda-  Também Luís Gomes de Carvalho endossa  submergidos, e outros, que iam perder-se para
         ções que as ribeiras do Funchal provocavam  ao Príncipe Regente, em 30 de Setembro uma  sempre, que podem produzir anualmente dois
         na cidade e onde veio a falecer em  17 de Fe-  missiva em que dá conta dos resultados do seu  milhões de alqueires de milho e feijão. As vastas
         vereiro de 1807.                   trabalho:                          Marinhas de Aveiro que estavam condenadas
           A figura do engenheiro militar                                                 a uma perpétua submersão, são
         Luís Gomes de Carvalho ficou                                                     hoje das mais ricas do Reino.
         ligada à extraordinária obra de                                                   Este país onde há pouco a fe-
         engenharia que foi a abertura da                                                bre e a morte faziam o seu as-
         Barra da Ria de Aveiro em 3 de                                                  sento é hoje saudável, e nele se
         Abril de 1808.                                                                  respira um ar puro e sadio. Estes
           A preparação das obras obri-                                                  povos desgraçados que noutro
         gou a paralisar os trabalhos das                                                tempo tocavam de compaixão
         marinhas de sal em 1803, pela                                                   o Paternal Coração de V. A. R.
         retenção das água lagunares e,                                                  Quando mandou em socorro
         em 1806 os prejuízos causados                                                   deles intentar a grande obra da
         nas zonas baixas da cidade –                                                    sua regeneração, são hoje vassa-
         cujos habitantes tinham de entrar                                               los venturosos, e bem depressa
         em casa pelas janelas – levou a                                                 serão opulentos. Enfim Senhor,
         uma revolta popular que qua-                                                    este vasto país que os elementos
         se comprometeu os trabalhos já                                                  tinham já usurpado à coroa de
         realizados.                                                                     V.A.R. fica por esta feliz operação
           Estávamos no tempo das Inva-                                                  reconquistado para sempre.
         sões Francesas; em Novembro   Planta relativa ao projecto da abertura da Barra de Aveiro, 1807.  Mas a Grande Obra que
         de 1807 o Exército Franco-Es-                                                   abriu a Barra e que é a mesma
         panhol comandado por Junot invade e ocupa   Tenho a honra de participar “a V.A.R. o feliz  que deve segurare perpetuar os seus grandes
         Portugal enquento a Corte e o governo retiram  êxito  da Comissão da Abertura da Barra de Avei-  resultados, precisa ainda por angum tempo a
         para o Brasil.                     ro, que V.A.R. foi servido confiar-me, honrando-  Particular Protecção de V.A.R. assim como de
           A 3 de Abril de 1808, com o auxílio das fortes  -me tanto nesta escolha, quanto a questão era  todos os meus cuidados, para consolidar e ul-
         chuvadas que se fizeram sentir, e com o desnível  difícil, e até na opinião geral, impossível.  timar como convém a fim de segurar para as
         de mais de 2 metros entre as águas lagunares e   O dia três de Abril deste presente ano foi o  futuras gerações o resultado já obtido, e no
         o oceano, retirou-se o último obstáculo – uma  venturoso dia da abertura da nova Barra de  maior grau.
         pequena barragem de estacaria – e as águas ras-  Aveiro; ele foi, em certo modo,  um segundo   Não tendo interrompido os meus trabalho-
         gam o que resta do cordão dunar que, ao fim  dia de criação em que se operou, como por  se cuidados relativos a esta obra senão pelas
         de 3 dias está estabilizado com 4 a 6 metros de  um prodígio, uma conveniente e necessária  ocupações e obrigações do honroso posto que
         profundidade e 264 de largura.     separação das águas e dos terrenos, que es-  me foi confiado no Exército que marchou a
           A decisão de trazer a Barra para Norte, onde  tavam na mais fatal confusão; É este Grande  restaurar a capital e o governo, hoje felizmen-
         estivera nos Séculos XV e XVI, próximo da cida-  Benefício, que V.A.R. preparava a estes po-  te restaurado, conservei contudo quanto pude
         de e das marinhas de sal, mos-                                                   com a mesma obra correspon-
         trou-se a solução providencial                                                   dênciapara a dirigir quanto era
         que resistiu ao longo de dois                                                    possível de longe. Agora que
         séculos e devolveu à Ria de                                                      pelas ordens de V.A.R. os mi-
         Aveiro, e às suas gentes, as suas                                                litares que compunham este
         capacidades económicas e bem                                                     Exército marcham a seus anti-
         estar social.                                                                    gos destinos, conto voltar bem
           Em 30 de Agosto de 1808, e                                                     depressa ao meu posto e comis-
         na sequência das Batalhas da                                                     são, o que farei com tanto mais
         Roliça e do Vimeiro, é assina-                                                   gosto quanto estou persuadido
         da a Convenção de Sintra que                                                     de que é ali onde eu talvez por
         punha fim à presença do exér-                                                     ora, possa fazer a V.A.R. o maior
         cito francês em Portugal. Em 16                                                  serviço”.
         de Setembro o Superintenden-                                                       Convém lembrar que quando
         te Verney escreve a D. Rodri-                                                    em Maio de 1808 as Tropas Es-
         go Sousa Coutinho uma carta                                                      panholas abandonaram o Porto
         em que informa do sucesso da                                                     e é nomeado o Governo Provi-
         abertura da barra.                                                               sional do Porto, são mandadas
           “Agora que felizmente chega   Foto actual da Barra de Aveiro.                  suspender, por razões financei-
         a esta cidade a fausta notícia de se ter já levantado  vos desde muito tempo, fez despertar, como  ras, todas as obras públicas mas a obra da Barra
         sobre as Torres de Lisboa o Estandarte das Venerá-  eu fui testemunha, a saudade constante que  de Aveiro é expressamente excluida desta sus-
         veis Quinas Lusitanas, quebrando-se os ferros da  os povos mais interessados nesta obra con-  pensão, tendo continuado os trabalhos.
         pesada escravidãoem que temos gemido...  sagravam ao Seu Legítimo ausente Soberano   Concluiam-se assim os longos seis anos de
           Com esta agradável notícia tenho igualmen-  quando gemia debaixo da escravidão e tira-  trabalhos preparatórios.
         te a honra de participar a  V. Exa que no dia 3  nia de que o Céu, auxiliando os nossos pró-          Z
         de Abril do corrente ano se ultimou a desejada  prios esforços, e os dos nossos amigos, acaba   J. Rodrigues Pereira
         abertura da Barra de Aveiro, com a maior feli-  de resgatar-nos.                                    CMG
                                                                                       REVISTA DA ARMADA U JULHO 2008  23
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