Page 369 - Revista da Armada
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Ouanto aos batéis. passou a ir com abriram fogo com efeitos devastado- fazer mais do que aquilo que tinham
eles para o vau durante a maré baixa res. Mas nem por isso os atacantes de· fei to durante toda a manh<i; carreg<lr
e a trazê-los para junto das caravelas sistiram. Vinham sempre mais e mais e disparar o mais depressa possível.
durante o resto do tempo em que paraus procurando obstinadamente pois disso dependia exclusivamente a
aquele nào dava passagem. E neste abordar as caravelas e os batéis. No salvaçiio das suas vidas e de Cochim.
vaivém se manteve. sem desfalecer. interior deles os portugueses. ensur- Com o descer da maré. os batéis aca-
durante um mês e vinte e três dias. ou decidos pelo ribombar contínuo dos bamm por ficar em seco o que ani-
seja. desde que deixou o passo de cilnhões. cegos pelo fumo da pólvora. mou ainda mais os soldados do Samo-
Cumbalão até ao fim da gucrrn! ensopados cm suor. de dentes cerra- rim nas suas tentativas para os toma-
No dia I de Maio. logo pela ma- dos. repetiam mecanicamente os rem. Mas em vão. Todos os que se
nh,i, o Samorim lançou o seu primei- mesmos gestos: c<lrregar. disparar. aproximavam eram invariavelmente
ro ataque. por terra c por mHr. contra carregar. disparar. carregar, dispa- despedaçados pelos pelouros dos ber-
Cochim. Ao mesmo tempo que as rar. .. Apontar. quase que 11<10 era ços ou mortalmente feridos pelas ba-
suas tropas tomavmll posição diante preciso porque os inimigos eram tilo las das espingardas. O que é facto é
do vau. prontas para o atrHvessar numerosos. vinham tão juntos e esta- que o combate com os batéis distraiu
logo que a água descesse o suficiente. vam tão perto que n,"io se perdia um as tropas que estavam no vau da sua
a armada de Calicute. na força de du- tiro! missão principal que era o assalto ii
zentos e cinquenta navios. prepara- E eram já tantos os mortos e os fe- paliçada.
va-se para investir contra as carave- ridos e tantos os pamus arrombados Durou esta batalha desesperada
las. apoiada pelo tiro duma bateria e incapazes de manobrar. que os que cerca de uma homo Logo que li maré
que. entretanto, tinha sido montada vinham mais atrás se amedrontaram c começou a subir e os batéis principia-
na margem. suspenderam o ataque. Mas O Samo- ram a nutuar. puderam afastar-se um
Duarte Pacheco. apercebendo-se rim. que estavll observando a batalhél pouco e disparar mais;, vontade. Por
das intenções do inimigo. começou da margem. deu ordem para prosse- seu lado, os soldados de Calicute. já
por se dirigir ao vau com dois batéis. guir e os infelizes paraus l1<io tiveram com li água a dar-lhe pelo peito. vi-
Aí, sHltando inesperudamente em outro remédio senão voltar à carga ram-se obrigados a bater em retirada.
terra. com pouco mais de vinte ho- para terem o mesmo destino dos que Mas mesmo na ilha donde tinham
mens. lançou a confusüo na vanguar- os haviam precedido. partido. continuavam a ser vítimas do
da do exército de Calicute que espe- No mais aceso da luta chegou um bombardeamento dos dois diabólicos
rava tudo menos ser atacada! Segui- mensageiro do rei de Cochim pedin- batéis. o que levou o Samorim li orde-
damente. dado que fa ltava Hinda um do a Duarte Pacheco que fosse ime- nar que o exército retirasse para o in-
certo tempo para o b"i:<a-mar, voltou diatamente para o vau. porque o terior!
para o passo dI! Palurte. onde se en- exército de Calicme estava prestes a Ao mesmo tempo. desvairado por
contravam as caravelas. Como visse lançar-se ao assalto da cidade. Res- mais esta derrota. responsabilizava
que a armada de Calicute se conser- pondeu-lhe aquele que estivesse tran- os seus capitães. acusando-os de co-
v~va à dist,íncia, esperando pelo bai- quilo porque a altura de água ainda bardes.
xa-mar para atacar ao mesmo tempo niio permitia a travessia. NH realida- E para demonstrar que só por cul-
que o exército. resolveu provocá-la de. n<io queria abandonar as carave- pa deles é que os portugueses não ti-
indo com os batéis HO seu encontro. las antes da armada inimiga ter sido nham sido vencidos, resolveu repetir
Atacando resolutmnente o primeiro derrotada. Por fim. vendo que esta já o asslllto seis dias depois, a 7 de Maio.
grupo de doze paraus avariou grave- se encontrava praticamente desbara- assumindo directamente o comando
mente dois deles. o que levou o resto tada e que a maré já estava muito blli- das tropas.
dll armada inimiga a abandonar a ati- xa, acorreu com os dois batéis ao VHU Desta vez. Duarte Pacheco não se
tude de expectativa cm que se tinha de Cochim que. nesse instante, as tro- aproximou tanto do vau com os batéis
conservado até ali e a lançar-se ime- pas do Samorim tinham começado a para não dar com eles em seco. Mas
diatamente <10 <ltaque. vadear. isso permitiu que os soldados do Sa-
Duarte Pacheco foi juntar-se às Disparando incesSHntemente os morim atingissem. em grande núme-
caravelas. slllisfeito por ter consegui- seus canhões e as suas espingardas, os ro. a ilha de Cochim onde começaram
do desfasar os ataques da armada e batéis fustigaram o nanco da coluna a desfazer a paliçada à machadada.
do exército de CHlicute o que lhe per- aUlcante que, aliás, progredia com Vendo-se confrontados com uma
mitiria combater separadamente com muita dificuldade por causa dHs esta- multidão de inimigos. os naires en-
cada um deles. cas aguçadas enterradas no leito do carregados da sua defesa debanda-
Como no passo de Palurte havia vau. Foi uma verdadeira chacina. Os ram, deixando sozinhos os portugue-
mais espaço do que no passo de Cam~ mortos c os feridos eram tantos que a ses que nela se encontravam e que se-
balâo. H vanguarda da armada de Ca- água ficou tinta de sangue! Apesar riam pouco mais de trinta.
licute era agora constituída por qua- disso, os mala bares n<lo se atemoriza- Apercebendo-se do que se estava
renta paT<IUS, amarrados de braço ram e investiram corajosamente con- a pHssar. Duarte P<lcheco viu-se for-
dado uns aos outros. que vinham dis- tra os batéis em massas compactas. çado a ir com os batéis em auxílio dos
parando furiosamente as suas bom- As nechas e as balas batendo nos pa- defensores da paliçada. acabHndo por
bardas e espingardas e lançando nu- veses que os protegiam pareciam gra- ficar novamente em seco. Subitamen-
vens de nechas. De novo os portu- nizo. Os homens que estavam dentro te. a situaç,io tornou-se crítica! Ani-
gueses usaram a táctica de deixar o deles, Hpertados uns contra os outros mados pela presença do Samorim , os
inimigo chegar muito perto e só entâo como sardinha em latH. l1<io podiam soldados de Calicute aVHnçavam co-
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