Page 298 - Revista da Armada
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Batalhas e combates
da Marinha portuguesa (L)
Malaca da terra fingindo que queria evitar o mortos e muitos mais haviam sido feri-
(Março? de 1525) combate. Percebendo-lhe as intenções, dos. Uma das suas lancharas ficara
alguns soldados «velhos" começaram a gravemente danificada! Começavam a
esejoso de tirar a desforra do aconselhar Martim Afonso a que vollas- cair as sombras da noite e o combate
apertado bloqueio a que fora se para trás. Mas este não lhes deu ou- prosseguia com igual encamiçamento de
Dsujeito no ano anterior pela vidos e continuou a seguir a annada parte a parte. Os portugueses não desis-
armada de Martim Afonso de Sousa e inimiga. tiam, porque considerando-se perdidos
das destruições que este causara nos por- Quando Laqueximena considerou queriam vender caras as vidas; os de Bin-
tos dos seus aliados de Pão e de Patanc, que os navios portugueses já eSlavam su- tão não desistiam porque sabiam que as
o rei de Bimão aproveitou a oportunida- ficientemente afaslados de Malaca fez re- forças dos portugueses deviam ter atin-
de de Malaca se encontrar muito des- pentinamente meia-volta com toda a sua gido o limite.
guarnecida nos princfpios de 1525 para armada e arremeteu contra eles à voga Foi então que a sorte bafejou os nos-
enviar contra ela, mais uma vez, Laque- arrancada, ao mesmo tempo que os mas- sos. Um pelouro perdido fez cair uma
ximena, com uma armada de vinle gran- sacrava com um dilúvio de pelouros e de verga da lanchara onde se encontrava La-
des lancharas, guarnecidas, cada uma flechas. E, em poucos minutos, viram- queximena, a qual, apanhando-o por um
delas, por setenta homens de a.rmas. -se as duas fustas completamente rodea- ombro, deu com ele em terra como mor-
Como sempre, Laqueximena chegou das pelas lancharas de Bintão e, logo a to. Deixando de ouvir os incitamentos do
a Malaca de noite, conseguindo apro- seguir, aferradas por elas. A cada uma seu chefe, os capitães das lancharas de
ximar-se de terra sem ser pressentido. E, das nossas fustas atracaram quatro lan- Bintão, já cansados do combate, come-
de madrugada, desembarcou de surpre- charas, o que quer dizer que os trinta e çaram a retrair-se, acabando por retirar.
sa parte da sua gente, que começou a ata- cinco homens que guarneciam cada uma Cobertos de feridas e completamen-
car e a saquear a zona da cidade que delas tiveram que combater de imediato te exaustos, os sobreviventes das duas
ficava do lado norte do rio, conhecida com duzentos e quarenta inimigos. Mas fustas portuguesas içaram a muito custo
pela povoação dos Quelins. é claro que em breve todas as lancharas as velas e tentaram alcançar Malaca. Mas
Dado o alarme, imediatamente Jor- se tinham encostado umas às outras, o não o conseguiram por a maré e o vento
ge de Albuquerque organizou um desla- que lhes pennitia reforçar continuamente serem em sentido contrário. Fazer o tra-
camento de cerca de oitenta portugueses com gente fresca as que estavam di rec- jecto a remos também não era possível
que enviou por terra para a zona ataca- tamente empenhadas no combate com as porque, tal como acontecera com a gen-
da, ao mesmo tempo que Martim Afon- fustas. Era tal a quantidade de flechas, te de guerra, a quase totalidade dos re-
so de Sousa aprontava as duas únicas zargunchos e lanças que chovia sobre os madores tinha sido mona ou gravemente
fuslas que havia em Malaca, fazendo em- portugueses que, passado pouco tempo. ferida. Não tiveram, por isso, outro
barcar trinta e cinco homens em cada qualquer das fuslas mais parecia um remédio senão fundear. Nessa situação
uma, para ir combater a armada de La- porco-espinho do que um navio! angustiante passaram toda a noite e a ma-
queximena. É certo que nessa altura es- Neste combate terrível, que durou nhã do dia seguinte, esperando a cada
tavam fundeadas junto à ilha das Naus, desde as duas da larde até ao pôr-do-sol, momento ser de novo acometidos pela
duas naus pequenas, mas não puderam morreram quarenta e dois portugueses e annada de Laqueximena, o que seria o
ser utilizadas por não haver gente sufi- praticamente todos os outros ficaram fe- seu fim. Mas este, que já se recompuse-
ciente para as guarnecer. ridos. Martim Afonso de Sousa foi um ra do abalo sofrido e passara toda a noi-
Sentindo que o contra-ataque dos dos feridos graves, vindo a morrer algum te a enterrar os mortos numa ilha a sul
portugueses estava iminente, Laquexi- tempo depois em Malaca dos ferimentos de Malaca, não se atreveu a reatar o
mena recolheu as forças que tinha em recebidos neste combate. combate com receio de sofrer novas per-
terra e afastou-se para o mar com os seus Apesar de ludo, os portugueses, dan- das. Por seu turno, Jorge de Albuquer-
navios. Vendo isso, Martim Afonso co- do provas de um valor militar inultrapas- que, admirado de que as fustas não
meteu o erro de ir atrás dele, dispondo sável, não consentiram que os homens regressassem a remos. também não se
apenas de duas fustas. Aliás, de come- de Bimão pusessem pé nos seus navios. aventurou a mandar em seu auxJ1io as
ço, as coisas correram-lhe bem porque repelindo alaque após ataque com des- duas naus que estavam no porto para não
conseguiu capturar uma lanchara que se cargas cerradas da sua artilharia e das ficar com a fortaleza desguarnecida. E
atrasara muito em relação às restantes e suas espingardas e com golpes mortais com estas hesitações se foi passando o
cujos tripulantes se lançaram à água lo- das suas lanças e das suas espadas. Os tempo até que veio a viração e as duas
go que começaram a ser atingidos pelo próprios inimigos estavam espantados fustas puderam dirigir-se à vela para Ma-
fogo da nossa artilharia. Manhosamen- com a fonna como os nossos se batiam. laca, onde fundearam um pouco afasta-
te, Laqueximena continuava a afastar-se Duzentos e vinte dos seus já tinham sido das da terra, disparando toda a sua
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