Page 145 - Revista da Armada
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Setting Sail
                                   Setting Sail








              12. PATACHO


              O patacho é um veleiro de dois mastros considerado como sendo de   cularmente às ourelas, ou seja, aos limites ou arestas da peça do tecido
            arte redonda, apesar de somente num deles deitar pano daquele feitio.   conforme enrolado em fábrica.
            No de vante regra geral espigam mastaréus de gávea e joanete, onde   Cozinheira – Contando de baixo, este termo classifica a primeira
            podem cruzar até cinco vergas redondas. Por seu turno, no mastro de   vela de entremastro, regra geral triangular, que por norma trabalha en-
            ré, arma grande latino quadrangular, aparelhado com retranca e caran-  vergada no estai real do mastro grande. Recebe esta curiosa designa-
            gueja, largando no mastaréu de gavetope uma vela latina que recebe   ção pelo facto de habitualmente ser içada por ante a ré da cozinha, ou
            idêntica designação. Esta armação dispõe ainda de outras velas latinas,   da chaminé do respectivo fogão, inibindo, desta forma, que o fumo e
            nomeadamente à proa e de entremastro. Relativamente ao armamento,   odores se escapem na direcção da popa. Carvoeira, vela de fumo e vela
            o Comandante Humberto Leitão diz que o patacho, ou pataxo, podia   de estai de convés são designações igualmente aplicáveis a esta mes-
            contar com 18 a 26 peças de artilharia.           ma vela, que, frequentemente, recebe nome mais técnico e elegante,
              Quanto à sua origem, o termo patacho oferece muitas dúvidas, pa-
            recendo, no entanto, ter sido adoptado do castelhano antigo, pataxe ou   como estai de gávea.
            patache, ao que tudo indica por alturas do dealbar do primeiro quartel   Formosa – Designação geralmente atribuída à segunda ou terceira
            do século XVI.                                    vela de entremastro, que pode ter forma triangular ou quadrangular,
              Sendo a génese deste tipo de armação consensualmente atribuída aos   nomeadamente nos veleiros que armam em patacho, escuna ou pa-
            holandeses, o testemunho do francês François Pyrard (1570-1621) pa-  lhabote, sendo considerada vela de bom tempo. O facto deste termo
            rece corroborar nesse sentido. Na extraordinária descrição da sua via-  ser utilizado para designar tanto a segunda como a terceira vela, pren-
            gem ao Oriente (1601-1611), embarcado no Le Corbin, refere: «Neste   de-se com a existência de uma ou duas velas abaixo, respectivamente,
            dia avistámos dois navios holandeses e um patacho, que saíam de uma   estai de gávea ou cozinheira e estai de gávea. O mesmo que vela de
            baía que há no cabo das Agulhas, e se chama Baía das Sardinhas […]   estai da formosa.
            Eram navios de Camfer em Zelândia, todos de muito pequeno porte».
            No entanto, uma das mais antigas referências ao termo patacho na lín-  Gavetope – Nome dado ao mastaréu que não cruza vergas de pano
            gua portuguesa terá sido registada por António Galvão, no seu Tratado   redondo e em cujo mastro real arma pano latino de carangueja, po-
            dos Descobrimentos (1563), quando descreve a viagem de Fernão Maga-  dendo este contar também com retranca. A vela latina que nele en-
            lhães: «[…] alem do estreyto do Magalhães se apartou delles hum nauio   verga adquire idêntica designação, assumindo forma triangular ou
            de remo que leuauam que chamauam patax». Mais adiante, «Neste anno   quadrangular. Este anglicismo pode surgir com diferente grafia – ga-
            de [15]27 sabⓁdo Fernam Cortez polo petaxo [Santiago…]».  fetope –, sendo também este tipo de pano conhecido como vela lati-
              Na edição de 1831 do Diccionario Marítimo Español, encontramos   na de carangueja.
            uma descrição que melhor pode ajudar-nos a compreender, à época, o   Mastros – Gurupés (A), traquete (B), grande (C).
            aparelho e função deste tipo de veleiro: «Embarcacion de dos palos, y
            antiguamente de guerra, que se destinaba en las escuadras para llevar   Mastaréus – Pau da bujarrona (D), velacho (E), joanete (F) e ga-
            avisos, reconocer las costas y guardar las entradas de los puertos. Hoy se   vetope (G).
            da este nombre a cierta embarcacion de la costa de Cantábria parecida   Velacho – Este termo tanto qualifica o primeiro mastaréu que espiga
            a un bergantin chico […] navío pequeño que va en servicio de otro. Por   a partir do mastro real do traquete, como designa a verga que o cruza e
            desprecio se dice de un buque pesado y de malas propiedades».  a respectiva vela redonda, sendo que esta, contando de baixo, corres-
              Pelo que antecede, somos levados a concluir que, na terminologia   ponde à segunda vela. O mesmo que vela de gávea de proa.
            náutica castelhana, o termo patache terá sido assaz empregue como
            sinónimo de veleiro de pequeno deslocamento, recorrentemente as-  Vela acutelada – Diz-se de um pano cortado em nesga, ou em forma
            sociado à navegação de cabotagem pelos portos da Biscaia espanhola,   de cutelo, sendo que este último termo tem ligação íntima com a forma
            sendo utilizado ainda, de forma depreciativa, para qualificar um navio   da lâmina outrora utilizada nas execuções por decapitação.
            mau de vela.                                       Vela de estai – Expressão com que habitualmente se designa a pri-
              Decididamente derivada do nome em análise, a denominação pata-
            chete foi outrora utilizada entre nós para caracterizar um veleiro com   meira vela latina de proa, ou situada mais a ré. Em sentido lato qualifica
                                                              igualmente toda e qualquer vela latina envergada em estai, englobando
            as supracitadas características, mas cujas dimensões seriam bem mais   esta designação todas as velas de proa e de entremastro.
            modestas que as do patacho.
              De aspecto análogo ao patacho, surgiu em tempos uma outra arma-  Velas de proa – Vela de estai (4), bujarrona de dentro (5), bujarrona
            ção chamada sumaca. Esta difere do patacho pelo facto de no mastro   de fora (6) e giba (7).
            do traquete deitar um único mastaréu e não dispor de vaus nem cesto
            de gávea. Pelo cotejo de diferentes fontes, acreditamos ter sido muito   Velas do traquete – Traquete redondo (8), velacho baixo (9), velacho
            utilizada no aparelhar de veleiros que praticaram navegação de cabo-  alto (10), joanete de proa (11) e sobre-joanete de proa (12).
            tagem pelos meandros da região do rio da Prata, bem como ao longo   Velas do grande – Vela grande, latino grande ou mezena (13) e ga-
            de toda a extensa costa brasileira.               vetope (14).
              Acutelado – Nome dado ao conjunto de panos com forma triangu-  Velas de entremastro – Cozinheira (15), vela de estai de gávea (16),
            lar e trapezoidal que fazem parte de uma vela. Normalmente, nas ve-  formosa (17) e vela de estai do galope do gavetope (18). De notar que é
            las redondas (1), e mesmo nalgumas velas latinas quadrangulares (2),   também comum apelidar as velas de entremastro como «velas do meio»,
            o acutelado fica para o lado das respectivas testas, sendo que no caso   em particular nos veleiros cujo aparelho conta com dois mastros apenas,
            dos papafigos e varredouras, dada a sua forma rectangular, por norma,   como são os casos do brigue, patacho, escuna e palhabote.
            não dispõe de acutelado. Na circunstância do pano latino triangular,
            geralmente deita para o lado do punho da amura (3). Este termo pode
            também ser ouvido como sinónimo da forma enesgada das testas de              António Manuel Gonçalves
            algumas velas. Já o verbo acutelar, traduz a maneira de cortar o pano                        CTEN
            nalgumas velas com vista a conferir-lhes aluamento, por oposição ao                am.sailing@hotmail.com
            apelidado «cortar a fio direito», que significa talhar o pano perpendi-               Desenho: Aida Colaço
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