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REVISTA DA ARMADA | 522


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           Na al. b) do n.º 1 do art.º 297.º estipula-se um paralelismo com o   sua ZEE. Aliás, o fundamento para o art.º 71.º pode ser encontrado
          n.º 3 do art.º 58.º ao se estabelecer o recurso a procedimentos com-  no n.º 3 do art.º 62.º, que estabelece que o EC permita o acesso a
          pulsórios conducentes a decisões obrigatórias “quando se alegue que   outros Estados, tendo em consideração, “todos os factores pertinen-
          um Estado, ao exercer as liberdades” previstas no art.º 58.º “atuou   tes, incluindo, inter alia, a importância dos recursos vivos da zona para
          em violação das disposições da presente Convenção ou das leis ou   a economia do Estado costeiro”.
          regulamentos adotados pelo Estado costeiro, de conformidade com a   Como conclusão, na CNUDM, o EC pode – fazendo uso da termino-
          presente Convenção e com outras normas de direito internacional que   logia internacional – “in the exercise of its sovereign rights to explore,
          não sejam com ela incompatíveis”.                   exploit, conserve, and manage” os recursos vivos da ZEE, podendo
           No que concerne ao regime instituído pelo art.º 62.º, tendo pre-  adoptar tais medidas, inclusive acesso a bordo, inspeção, detenção e
          sente que já foi objecto de reflexão no artigo precedente, merece   procedimentos de natureza judicial tidos por adequados para assegu-
          destaque a al. h) que prevê a imposição de condições para o paga-  rar o cumprimento da sua Lei.
          mento pela entrada nos seus Portos; de facto, o EC pode impor a   As determinações ínsitas no art.º 73.º conferem ao EC um quadro de
          descarga “(…) of all or any part” nos seus portos, sendo tal impo-  poderes bastante extenso, que resultam em restrições à liberdade de
          sição justificada pela finalidade de responder às necessidades da   navegação dos navios de pesca na ZEE.
          população e indústrias locais.                       A regulamentação da ZEE está, à primeira vista, organizada com base
           O objecto do art.º 69.º é referente aos “Direitos dos Estados sem lito-  num equilíbrio entre os poderes dos EC e os poderes dos terceiros
          ral” a participar, na base da equidade, na exploração “de uma parte   Estados. Nestes termos, em moldes aproximados aos definidos para o
          apropriada dos excedentes dos recursos vivos das zonas económicos   AM, o n.º 1 do art.º 58.º prevê que os terceiros Estados gozam nesse
          exclusivas dos Estados costeiros da mesma sub-região ou região”.   espaço “das liberdades de navegação e sobrevoo e de colocação de
           Este artigo foi construído de modo a acomodar os interesses e preo-  cabos e ductos submarinos (…) bem como de outros usos do mar inter-
          cupações dos Estados sem litoral – conforme definidos na al. a) do   nacionalmente lícitos relacionados com as referidas liberdades”. Além
          n.º 1 do art.º 124.º, como “Estado que não tenha costa marítima” –   disso, como foi já referido, nos termos do art.º 59.º, os conflitos entre
          tendo em atenção o inovador conceito de ZEE, à imagem do art.º 70.º   o EC e os outros Estados, relativamente à atribuição de direitos e juris-
          que pretende salvaguardar os “direitos dos Estados geograficamente   dição, deverão ser solucionados “numa base de equidade e à luz de
          desfavorecidos”, embora ambos os artigos apenas digam respeito aos   todas as circunstâncias pertinentes”.
          recursos vivos existentes na Zona em apreço. De notar que o direito   No entanto, aquilo a que conduz o regime jurídico específico da
          de acesso destes Estados ao Mar e a partir deste são distintos do   ZEE é à atribuição aos EC do direito à captura do núcleo essencial dos
          acesso aos recursos vivos, encontrando-se estabelecidos na Parte X   recursos naturais vivos. Com esse objetivo, são reconhecidos direitos
          (arts 124.º a 132.º).                               ao EC, na al. a) do n.º 1 do art.º 56.º, dispondo estes de “direitos de
           De referir que no n.º 2 deste artigo são estabelecidos os “termos   soberania para fins de exploração e aproveitamento, conservação e
          e condições” que tal participação, através de acordos, deve respeitar,   gestão dos recursos naturais”.
          mais concretamente, e de forma não exaustiva “  como dá a entender   Numa terceira parte deste artigo, aduzir-se-á uma reflexão sobre o
          o emprego do termo “inter alia”, os factores determinados nas als. a)   enquadramento geopolítico que os regimes específicos da ZEE induzi-
          a d), que impõem um balanço entre a exploração de recursos vivos   ram no relacionamento e no equilíbrio internacional entre os Estados.
          e os direitos soberanos estabelecidos no art.º 56.º, bem como a “( )                                
          consequente necessidade de evitar uma carga excessiva para qual-                   Dr. Tiago da Silva Benavente
          quer Estado costeiro ou para uma parte deste”.                                Doutorando em Direito e Segurança
           O art.º 71.º assume especial relevo, para além de outras razões        ASSESSOR DO GABINETE JURÍDICO DA DGAM
          que poderiam ser, nesta sede aventadas, por estabelecer um regime   N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfico
          de exceção ao definido nos arts. 69.º e 70.º. Neste contexto, tal não
          aplicabilidade dos mencionados artigos tem por fundamento crité-  Nota
          rios de natureza económica, designadamente um EC cuja economia   A Parte 1 foi publicada na RA nº 518 de maio 2017.
          “dependa preponderantemente” da exploração de recursos vivos da


                                                                                           SETEMBRO/OUTUBRO 2017  27
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