Page 407 - Revista da Armada
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ile mélicr. o mélier é o mesmo que fi lIes- leauvoyer; diz-se agora naviguer (nave- a alcatrão, E dava-lhe uma palmadazinha
peira. Ninguém I'ira tal ramo, mas todos gar), dizia-se então naviger; diz-se: virer no amplo costado,
acreditavam na existência dele. vent devanl (virar por da~'ante), e dizia· Aquele excelente e velho herói do mar,
O peixe que lhe sobejava não o vendia, -se: donner vcnt devant: diz-se: allcr de trouxera um pecúlio de contos, cada qual
dava-o. l'avant (seguir avante), dizia-se: tail1er de mais estupendo, das suas longas viagens.
Os pobres aceitavam-no: mas, não I'avant; diz-se: tirer d'accord, (ala à Vira em Madagascar as penas decerto pás-
obstante isto, queriam-lhe mal, por causa uma), dizia-se: halez d'accord; diz-se: dé· saro, que bastava") três para cobrir o tecto
do tal ramo. Isto não se faz. Não se deve rapez (arranca), dizia·se déplantez,; diz· dum palácio. Na lndia, tinha visto pés de
enganara mar. -se: embraquez (a/a dentro), dizia-se abra- azedas com nove pés d'a/lura, Vira na
Era pescador, mas só pescador. Tinha quez; diz-se: taqucts (cunhas), dizia-se: Nova-Holanda rebanhos de perus e patos,
aprendido três ou quatro oficias, por ins- bittons; diz-se: burins (passadores), dizia- guardados por um cão de gado, que é um
tinto e para se distrair: merceneiro, carpin. -se: tappes; diz-se hoje: balancines (altUln- pássaro chamado flgami, Vira cemitérios
teiro de carros, serralheiro e calafate. Nin- lilhos), dizia-se naquele tempo: valanci· de elefantes. Na Africa, tinha visto gori-
guém consertava uma roda como ele, fa- nes; diz-se: tribord (estibordo), dizia-se: liras, espécie de homens-tigres, com sele
bricava, de um modo propriamente seu, stribord; e os homens de quarto de bom- pés de altura. Conhecia os costumes de
todos os aparelhos de pesca. Tinha num bordo eram chamados les basbourdis, toda a casta de macacos, desde o monose{-
vagem, a que chamava macaco bravo, até
quarto da casa do fim da rua, uma forja Tmfrri//t, C'.Rrt"';(I {/ Hoelf/lillco/lrt: nou~
pequena e uma bigorna, e, como a chalu- avons single (nós singrámos). Em vez de: ao saguim, a que chamava macaco barba-
pa não tivesse senão uma âncora, fabri. la rafaJe (a rajada de vento), le raftal; em do. No Chile, tinha visto uma grande
cou-lhe ele OUlra, perfeila em tudo, o arga- vez de: bossoir (a bochecha de proa), mona enternecer os caçadores, mos/ran-
néu linha força precisa, e Gil/iatt, sem que boussoir; em vez de: drosse (o cabo do do·lhes o filhinho. Vira na Califórnia 11m
ninguém lhe ensinasse, achara a dimensão leme), drousse; em vez de: lofter (orçar), tronco d'tJrvore oco, caído por terra, den-
exacta que deve ter o cepo para impedir faire une olofée (dar uma orçada); em vez tro do qual podia andar um homem a ca-
quea âncora dê de si. de: elonger (estender), alonger; em vez valo mais de cinquenta passos. Vira em
Tinha, além disso, substÍluido os pre- dt': forte brisc (vt'llla [resmlhiio), sUlVant: MarrOCOS os mozabitas e os biskris, bate-
gos da amurada da chalupa por cavilhas em vez de: jouail (cepo de âncora), jas;em rem-se a golpes de matralcr, e de barras de
de madeira, o que fazia com que os bura- vez de: soute (paiol), fosse; tal era, no ferro, os biskris, por lhe chamarem kelb, .
cos não se alargassem com a ferrugem. principio deste século, a linguagem dos que quer dizer cães, e os mozabitas por lhe
Deste modo tinha aumentado conside- marftimos das ilhas da Mancha. Ango co- chamarem khamasi, que quer dizer gente
ravelmente as boas qualidades mar(timas mover-se-ia se ouvisse falar um piloto de da quinta raça. Vira, na China, cortarem
da chalupa. Aproveitara.se disso para, de Jersey. Quando já em toda a parte as velas bocadinhos o pirata Chang-thong-quan-
tempos a tempos, ir passar, um ou dois faseyaienl (batiam), nas ilhas da Mancha, -Iarh-Quoi, por ter assassinado o âp duma
meses nalguma ilha deserta, como Chou- ainda se dizia: barbeyaienl; um salto de aldeia. Em Thu-dan-mot, vira um leão ar-
sayou os Casqueis. O povo dizia então: vento, saule·de-vent, era chamado folie- rebatar uma velha, no meio do mercado
- Olhem, Gilliatt não está cá! -vcnte. Jei,l'{; afi .fe tUitW/, cla.f dois si.l'temas público da cidade, Tinha assistido à che-
Mas ninguém se incomodava com isso. góticos d'arrotar, o peito de morre e a por- gada da grande serpente, vinda da Cantão
tuguesa. Só ali se ouviam as anrigas vozes para Saigão, para celebrar no pagode de
de comando: Tour-et-choque! Bosse-et- Cho-Ien a festa de Quan-nam, deusa dos
* -bitte! Um marinheiro de Granville já di- navegantes. Tinha contemplado, entre os
zia: le elan (o gorne), quando ainda o de Moi, o grande Quan-Sa. No Rio de Janei·
A Antiga Linguagrm Mar/lima Saint-Aubin ou de Saint-Sampson dizia,' ro, tinha visto as senhoras brasileiras po-
le canal de pouliot, O que em Saint-Maio rem, à noite, na cabeça, coisinhas de gaze,
Estes marinheiros das ilhas do canal, era chamado boul d'alonge (escorva), era contendo cada uma um pirilampo, para
são antigos gauleses puros. Estas ilhas, em Saint·Hélier: orcille d'âne. Mess Le· parecerem toucadas d'estrelas. Combatera
que vão hoje tomando rapidamente a fei- thierry, exactamente como o duque de Vi- no Uruguai os formigueiros, e no Para-
ção inglesa, conservaram-se muito tempo vonne, chamava d curvatura c6ncava das guai as aranhas-aves, 'aveludadas e do la-
fiéis à sua primitiva origem. O campónio cobertas la tonture (tosamento), e ao esco- manho de cabeças de crianças, cobrindo
de Serkfala a língua de Luis XIV. pro do calafate la patarasse. Foi com este com as pernas um diâmetro dum terço de
Há quarenta anos, os marinherios de extravagante idioma qlle Duquesne bateu vara, e atacando a gente, à qual atiram os
Jersey e d'Aurigny falavam o clássico idio- Ruyter, que Duguay Trouin bateu Wasna- pêlos, que se enterram na carne como fle.
ma mar(timo. Pareceria conservar-se com er, e que Tourville, em /681, d luz do dia, chas agudas, levantando pu.stulas. Do rio
a marinha do século dezassete. Um ar- amarrou o primeiro galeão que bombar- Arinos, afluente do Tocantins, nas flores-
queólogo da especialidade podia ir ali es- deou Argel. Hoje é Ifngua morta; o dialec- tas virgens ao norte'de Diamantina, obser-
tudar o velho dialecto das manobras e to marltimo é totalmente outro. Duperré vou o medonho povo morcego, os murci-
combates sanguinolentos de João Bart, flão entenderia Suffren. A linguagem dos lagos, homens que nascem com o cabelo
naquele porta-voz que fazio tremer o almi- sinais não está menos transtornada; vai branco e os olhos vermelhos, habitam o
rante Hidde. O vocabulário marltimo de muito dos quatro galhardetes: encarnado, mais sombrio dos bosques, dormindo de
nossos pais, quase inteiramente renovado branco, azul, e amarelo, de Labourdon- dia e velando de noite, que pescam e ca-
hoje, usava-se ainda em Guernesey em flaye, tis dezoito bandeiras d'hoje que, iça- r llm IUU Irc','{/S, e "h'/11 me/llar (/1111//1/0 mio
1820. Um navio que navega bem chegado das duas a duas, três a três, e quatro a qua- há luar. Perto de BeyroU/h, no acampa-
ao vento, era boulinier (bolineiro) - um tro, oferecem tis necessidades da comuni- mento duma expediçãO de que ele fazia
navio que se chega ao vento, quase por si cação /ongfnqua setenta mil combinações, parte, tendo-se rOllbado um pluviómetro
só, sem auxílio do leme, e sem sentir as nada deixam em claro, e quase se pode di- dllma tenda, viu que um feiticeiro, vestido
suas velas de proa, era um navio ardente zer, QCorrem om/e menos se espera. de meia dúzia de tiras de coiro, o que dava
(que se aguça) - começar em movimento, ares dum homem vestido de suspensórios,
era prendre aire (tomar seguimento) - agitando fortemente uma campainha pre·
pôr de capa era capeyer (capear) - amar- * sa na ponta dum chifre, obrigou uma hie-
rar a extremidade dum cabo de laborar, na a vir reslituir o pluviómetro roubado.
era faiTe dormant (dar volta) - receber o Contos de Longo Curso A hiena era a ladra. Estas verfdicas histó-
vento da proa, era faire chapelle (ficar so- rias pareciam-se tanto com patranhas, que
bre) -aguentar-se sobre a amarra, era fai· Mess Lerhierry, incomodado com ou- divertiam Deruchelle.
re teste (estar filado ao vento) - ter qual. tro traje, não largava o fato de bordo, (n· A boneca da Durande era o laço inter-
quer coisa em confusão a bordo, era être vergando mais a miúdo a japona de mari- médio do barco e da rapariga. Chamava-
en panlenne (estar desmantilhado) - re- nheiro, que a de piloto, o que fazia torcer -se boneca (Poupée), nas ilhas norman-
ceber o vento directamente nas velas, era o formoso narizinho de Deruchelle. das, d carranca entalhada na proa, estátua
porter plain (levar o pano cheio). Nada Nada há mais bonito, do que as caretas de II/lIl!c',ri/ tOJ('(/IIIC'lIlt' {'sc/lIlI/rm/lI. 01/'
disto se diz presentemente. Ao que hoje se da beleza enfadada, Ralhando e rindo, ex- qui, esta locução local para designar um
chama louvoyer (bordejar) chamava-se clamava ela: - P'fu! meu pai, que cheiro naveganle: estar entre a popa e a boneca.
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