Page 221 - Revista da Armada
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& Nota de Abertura








            Largo do Rossio - encantos e desencantos




                  ons tempos  em que  eu  andava  por esses   tradas para as portas de Santo Antão e rua Barros
                  mares além. respirando o ar puro, apanhando   Queirós; e  o  de noroeste, com o  largo de D.  João
            Bchapadas de água salgada na cara, contem·       da Câmara e  a  estação da linha de Sintra.
            plando o céu repleto de estrelas brilhantes, pesqui-  E por fim ve)3.ID tam.bem a rua Augusta, na sua
            sando o horizonte deserto na mira de avistar qual-  nova e feliz versão, com o arco lá ao fundo enqua-
            quer coisa que quebrasse a monotonia dos longos   drando perfeitamente a  estátua do Rei D.  José e
            quartos (1) na ponte, rogando pragas ao leão (2) en·   o seu cavalo, vistos de costas. Tudo um encanto,
            furecido em dias  de balanço e enjôo ...         tudo história ...
               Agora, reformado que estou, tudo isto passou      Mas, como não há bela sem senão, vejam tam·
            à história - o bom e o mau.. Tenho aquilo que tanto   bém os desencantos:
            desejava no meio dos temporais - a terra firme -     Antes do mais, o  imponente Teatro D.  Maria,
            e. por incrível que pareça, sinto muitas saudades.   que ocupa todo o topo norte, sempre fechado a se-
               Os meus IDaI9S agora são outros. Navego no    te chaves, sem vida, a  desafiar a  imaginação dos
            oceano de Lisboa, ambiente poluido, barafunda e   responsaveis para a maneira de o animar, de atar·
            confusão. onde em lugar de estrelas brilham luzes   nar mais funcional e  popular. E não há nada que
            de «néon!! em candeeiros de iluminação e reclames   não tenha solução!
            multicores.                                          Depois, o pavimento do terreiro, todo escaquei·
                                   •                         rado, ainda com carris para carros eléctricos que
               Invoco então a  minha qualidade de lisboeta de   já não circulam; árvores de porte florestal que ta·
            coração. porque de gema serei sempre beirão dos   pam a vista aos que têm a sorte de ter janelas aber·
            sete costados.  para, como de outras vezes tenho   tas àquele local privilegiado, algumas com raízes
            feito, abordar certos assuntos relativos à nossa ma·   enormes que deformam os passeios, dificultando
            ravilhosa capital. Não chamo a  isto meter a  foice   o trânsito de pessoas; agências bancárias onde de-
            em seara alheia, mas antes manifestar opiniões que   viam estar pastelarias, cafés e esplanadas; qui6.s;.
            possam  contribuir  para  levar os  responsáveis  a   ques de venda de jomais em locais impróprios (o
            debruçar·se  sobre  pequenos  problemas  que,  na   que se situa em frente da Suissa é um exemplo fla-
            avalanche dos muitos que têm, podem passar des·   grante);  o  passeio desnivelado naquele pequeno
            percebidos.  Não me levem pois estes a  maL.     largo sem nome, à  entrada das ruas do Carmo e
               Hoje, venho à  liça com o largo do Rossio que,   1. o de  Dezembro,  onde  muita  gente  tropeça  e
            sendo a sala de estar dos alfacinhas e ponto de pas.   alguns caiem ... e, finalmente, e pior de tudo, aque-
            sagem obrigatória de nacionais e estrangeiros, bem   les gigantescos reclames de ferro velho em cima
            merecia melhor sortel                            dos  telhados  tão portugueses, verdadeira mons·
               Já o disse nesta Revista e  volto a  repeti·lo: há   truosidade estética que é  urgente, direi mesmo ina-
            coisas em Lisboa que têm de estar sempre impe-   diável, fazer desaparecer de uma vez para sempre!
            cáveis e uma delas é precisamente o Rossio. Urge                        •
            dar a  este recanto da baixa pombalina um ar dig-   Resumindo os prós e qs contras, o largo do Ros·
            no e civilizado mas, atenção, sem lhe tirar nada do   sio, remediados os desencantos citados, empedra·
            originall                                        do  o  terreiro  à  portuguesa, com  bancos para as
               E vamos agora ver os encantos que ali há e nos   pessoas se sentarem a gozar o panorama, plantas
            quais, me parece, pouca gente repara. Procurem   e  flores aqui e acolá, fontes de água a  jorrar, sem
            as melhores posições para ver:                   táxis nem autocarros ... seria o verdadeiro paraíso
               O canto sudoeste, com o casario por ali acima,   para os muitos que amam esf:a bela cidade, tanto
            até ás ruínas do Carmo; o de leste, com Alfama e   como eu! E seria também o sítio ideal para exibi·
            a Mouraria a servir de pedestal ao majestoso Cas-  ções de bandas de música, ranchos folclóricos, etc ..
            telo de S.  Jorge; o  de nordeste, com o Palácio da
            Independência, a  Igreja de S.  Domingos e  as en·
                                                              Vercontnlcapa

            (J) • Serviço de 4  horas.
            (2)  • Nome que os marujos dlo ao mu.



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