Page 207 - Revista da Armada
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117-Olha a bóia
á expressões de gíria naval Nas embarcações a remos era o baleeira, na vinda, não intervinha por
curiosas. Nasceram de um oficial mais antigo que, como norma, respeito ao oficial. E o médico,
H incidente que, por circunstân· tomava conta do leme. embaraçado, talvez crente que era
das fortuitas. se repercutiu no meio Ora uma vez, aconteceu que o aos remadores que cumpria safar a
naval, demorando na memória de único oficial que embarcou, numa rascada, por algum instinto providen-
muitos. O seu emprego, com segun- baleeira, foi o médico de bordo. E, ciai - iam naturalmente de costas
do sentido, acabou por surgir. como era devido, lá tomou conta do para o obstáculo - , começou a
A velha expressão . Olha a bóia. governo. prevenir:
é um exemplo. Empregava-se, de or- Tudo correu bem, nas primeiras - Olh'á bóial... Olh'á bóia!...
dinário, num sentido preventivo.. Al- remadas. A salda da pequena doca, A ameaça de colisão crescia, a
guém que anunciava uma intenção, Junto ao Ministério, de águas calmas, cada momento. O pobre do leme,
de resultados incertos na prática, p0- foi encontrada sem dificuldades. coitado, só por si, nada podia fazer.
dia ser advertido por .. Olha a bóia., Mas, naturalmente, com um timonei- E a bóia a crescer, medonha! E o ofi-
Como quem previne .. Tem cuidado-, ro sem grande prática, viria a suce- ciai, agora, num desespero. a clamar
.. Não arrisques» ... Pode dar bronca .. , der o pior . mais alio:
A ocorrência, que está na origem Corria uma forte corrente de va- - Olh'á bóia! ... Olh'á bóia ...
da expressão, sucedeu' há muitos zante. O médico, embora sem noção Deu-se o inevitável. A baleeira
anos. Era no tempo em que os na- segura do que era abatimento, lá ia embateu fortemente, com o anda-
vios de guerra amarravam à bÓia, no seguindo Tejo fora. mento próprio e a força da maré.
Tejo. Presos, apenas, pela amarra O navio encontrava-se numa Partiram-se dois remos.
da proa, a sua posição obedecia ao amarração afastada. E obstáculos, Abriu-se um rombo na amura de
estado das marés. Ora aproados à até lá, apenas bóias livres e cacilhei- estibordo. E o cabo, à ordem do
enchente, ora à vazante, passando ros ocasionais. Com estes, não ha- médico, tomou conta do leme.
pela posição indecisa da estofa, os via dificuldades. Com propulsão Chegaram safos a bordo. E a
navios eram um cartaz vivo da Mari- mecânica, que se afaslassem - era expressão preventiva teve larga res-
nha, sempre presentes na visão do a sua obrigação. Com as bóias é que sonância no ambiente critico das
lisboeta. havia que ter cuidado. câmaras dos navios. E ficou ...
Junto ao Ministério, próxima da Num dado momenlo, o médico
ainda existente Casa da Balança, sentiu a baleeira começar a descair, Se de facto se tivesse bem olha-
desdobrava-se uma escada de pe- com a corrente, sobre uma bóia do a bóia, como devia. nada de mal
dra, já muito roída das marés, que enorme, que estava devoluta. Inex- teria sucedido no Tejo, nem. afinal,
levava às embarcações dos navios periente, não sabia pôr o leme como tantas vezes, na própria vida ...
que, em baixo. aguardavam os devia. O cabo, que a
oficiais. Silva Braga,
Umas vezes eram gasolinas, ou- VALM
tras baleeiras, quando aqueles enfer-
mavam de motores doentes.
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