Page 109 - Revista da Armada
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Património Cultural da Marinha
Património Cultural da Marinha
Peças para Recordar
47.O LIVRO PRIMEIRO DA MODERNA ARQUEOLOGIA NAVAL PORTUGUESA
Referido principalmente por ter sido o autor da letra de “A Portuguesa”, que com a implan-
tação da República viria a ser adoptada como Hino Nacional, Henrique Lopes de Mendonça
(1856-1931), Aspirante de Marinha em 1871 e Capitão-de-Mar-e-Guerra em 1912, data em que
deixou o serviço activo, foi um notável dramaturgo, poeta, romancista e arqueólogo.
Como dramaturgo, talvez a sua actividade mais saliente, estreou-se em 1884 com o drama em
verso, num acto, “A Noiva”, seguindo-se, entre outras, peças históricas como o “Duque de Aveiro”,
“A Morte”, “Afonso de Albuquerque” e “Cores de Bandeira”, (na qual foi pela primeira vez cantada
em público “A Portuguesa”, marcha musicada por Alfredo Keil em 1891 e criada como protesto
contra o então recente ultimato inglês) que obtiveram retumbantes êxitos nos principais palcos por-
tugueses nos fins do século XIX.
Os inúmeros escritos da sua autoria, editados em livro ou publicados em vários periódicos e as
diversas conferências que proferiu perante as mais ilustres plateias, foram impregnados de um forte
sentido épico, de um acrisolado culto pela grandeza da História de Portugal e de uma muito arrei-
gada fé no destino pátrio, sentimentos estes que aliados a um inquebrantável patriotismo levam a
considerar o Comandante Lopes de Mendonça um dos maiores vultos literários da sua época.
A atracção pelo Mar e a paixão pela História conduziram-no ao estudo dos navios que intervie-
ram no período da Expansão, tendo sido, no entender do insigne historiador Comandante Quirino
da Fonseca e presentemente por numerosos estudiosos, o fundador dos estudos relativos à
Moderna Arqueologia Naval Portuguesa.
Assim, em 1890, nos Anais do Clube Militar Naval, publicou um trabalho sobre a embarcação
mais significativa da epopeia marítima portuguesa – a caravela, que intitulou “Estudos sobre
Caravelas”, mais tarde incorporado nos “Estudos sobre Navios Portugueses nos Séculos XV e XVI”,
cuja 1ª edição, datada de 1882, faz parte do acervo da Biblioteca Central da Marinha.
Apesar de decorrido mais de um século após a sua publicação a obra, que agora se apresenta, é
fundamental para aqueles que se dedicam aos estudos de arqueologia naval, mantendo-se a maio-
ria das conclusões nela assinaladas perfeitamente válidas.
Nestes estudos, que versam as principais embarcações utilizadas pelos portugueses no período
mais esplendoroso da sua gesta, são referidas a nau, a barcha, o barinel, a carraca, a urca, a tafo-
reira, o galeão, os navios de remos e por fim a caravela.
Inúmeras citações são sublinhadas, nomeadamente as dos cronistas Fernão Lopes, João de
Barros, Damião de Gois, Azurara e igualmente destacados os estudos do padre Fernando Oliveira,
no entender do escritor uma autoridade incontestável em assuntos navais.
De salientar que para cada tipo de embarcação, além da explicação da sua etimologia e origens
baseada em fontes documentais e por vezes iconográficas, são igualmente descritas as respectivas
características e a sua participação nas diversas expedições portuguesas no Atlântico e no Indico.
No estudo relativo à caravela, o mais pormenorizado, o autor conclui que este tipo de embar-
cação é indiscutivelmente de origem portuguesa, foi fundamental nas descobertas e conquistas na
costa ocidental africana, sendo o respectivo aparelho no início constituído unicamente por velame
latino e posteriormente passado a envergar, no mastro do traquete, uma vela em redondo.
A finalizar este seu notabilíssimo escrito, o Comandante Lopes de Mendonça afirma: Se algum
dia a língua portuguesa se sumisse no pélago das tradições obscuras a palavra “Caravela” seria
bastante para recordar à humanidade a história de um pequeno povo, empenhando esforços de
gigante para o descobrimento do mundo.
Biblioteca Central da Marinha
(Texto de José Luís Leiria Pinto, CALM –
– Presidente da Comissão Cultural)