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REVISTA DA ARMADA | 502 17

Stratεgia

(IN)SEGURANÇA MARÍTIMA:
CANAL DE MOÇAMBIQUE, O PRÓXIMO FOCO
DE PIRATARIA?

INTRODUÇÃO Mapa com a densidade de tráfego marítimo mundial (Fonte: Universidade de Hofstra)

Em fevereiro de 2002, ao abordar a falta de provas da existência ● Enquanto se mantiver a pressão vigilante e a abordagem ho-
de armas de destruição maciça no Iraque, Donald Rumsfeld refe- lística da comunidade internacional relativamente à Somália
riu-se a known knowns (coisas que sabemos que sabemos), known (incluindo a presença das marinhas no Corno de África e no
unknowns (coisas que sabemos que não sabemos) e unknown unk- Estreito de Áden), a ameaça da pirataria nessa região estará
nowns (coisas que não sabemos que não sabemos). contida;
● Contudo, as causas (profundas) da pirataria somali permane-
Numa perspetiva do conhecimento das ameaças à segurança ma- cem, fazendo com que a ameaça se mantenha;
rítima, os known knowns são inter alia o Corno de África, o Estreito ● Dessa forma, é expectável que a ameaça se desloque para
de Áden, o Golfo da Guiné, o Estreito de Malaca e o mar do sul da outras paragens onde se perspetivem maiores probabilidades
China, áreas em que se detém um bom conhecimento da ameaça. de sucesso.

Na mesma perspetiva, a Líbia é um known unkown, pois sabe-se Neste quadro de análise, há um conjunto de fatores que sus-
que é a origem de várias ameaças à segurança marítima, as quais tentam a possibilidade da ameaça da pirataria somali se deslocar
ainda não foram integralmente caraterizadas. Nessa linha, é curioso para a entrada norte do Canal de Moçambique, nomeadamente:
verificar que a operação projetada pela UE, para mitigar, no ambien-
te marítimo, os efeitos da crise líbia (operação EUNAVFOR MED), ● Existência crescente de alvos potenciais
tenha começado por uma primeira fase de recolha de informações, O Canal de Moçambique possui das maiores reservas de gás
exatamente para ultrapassar o desconhecimento existente. natural do Mundo, aí se localizando já bastantes plataformas
de exploração off-shore, que implicam um contínuo tráfego
Já os unknown unknowns correspondem a ameaças desconheci- marítimo de apoio e abastecimento.
das, relativamente às quais nem sequer nos apercebemos da nossa ● Valor crescente destes alvos
ignorância. São ameaças que já se formaram, mas das quais ainda O pessoal envolvido nesta indústria possui um elevado valor
não temos conhecimento. Até se manifestar de forma visível, em para os piratas, resultante da sua afiliação comercial com gran-
2013, o autodenominado Estado Islâmico cabia nesta categoriza- des empresas multinacionais de hidrocarbonetos, permitindo
ção, pois ninguém teria uma verdadeira noção da ameaça que esse a reclamação de elevados resgates, em caso de sequestro.
grupo constituía para a segurança e a estabilidade mundiais. ● Multiplicidade de possíveis bases de refúgio e retaguarda
O Canal de Moçambique possui inúmeras possíveis bases, em
Unknown knowns zonas escassamente povoadas e relativamente remotas, que
poderão servir de refúgio e retaguarda aos piratas, como, ali-
Além dos três conceitos referidos por Rumsfeld, podemos ás, já aconteceu ao longo da história.
extrapolar um quarto: o dos unknown knowns (coisas que não
sabemos que sabemos). Serão os conhecimentos de que não te-
mos plena consciência, mas que (se devidamente processados)
podem permitir uma prospetiva informada.

Ainda numa perspetiva do conhecimento das ameaças à segu-
rança marítima, o Canal de Moçambique parece ser um unknown
known, pois já existe informação suficiente que permite extrapo-
lar a possibilidade dessa região se poder vir a tornar num foco de
pirataria, mas poucos estarão conscientes desse risco.

CANAL DE MOÇAMBIQUE

Com efeito, considerando que as causas do amanhã existem
já hoje, cumpre recordar alguma informação relevante sobre a
pirataria somali:

4 DEZEMBRO 2015