Page 357 - Revista da Armada
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Em suma, neste restaurante come-se bem e bebe-se   Indicou-me  um  individuo  ainda jovem,  mas com  ar  de
        do melhor.                                          quem era dono. E era mesmo. Contei-lhe a ocorrência.
           A segunda inovação de que tive  conhecimento  na-  Disse-lhe do prazer que sentia em ver pela primeira ,;ez
        quela terra, alegrou-me e entristeceu-me. Soube que daí   na minha vida uma pessoa com o meu nome.
        a dias se celebrava o "dia dos Josés». Uma grande al-  Surpreendido,  o  bom  homem,  ergueu  os  braços,
        moçarada reunia os " Josés» da terra e o mesmo aconte-  apertou-me e exclamou:
        ceria, noutra altura, com os "Antônios» e outros que, em   - Oh, patrício, você já está ganhando.
        pia baptismal, receberam outros nomes. Alegrei-me ao   Ofereceu-me umas porcelanas com o nome da chur-
        saber de tão bela e inusitada confraternização.     rascaria, fez-me companhia ao almoço e, no final, estava
           Entristeci-me, no entanto, por pensar que se um dia   tudo pago!
        alguém se lembra de reunir as pessoas minhas onomás-   Quem dera que os "Josés», os "Antônios», todos os
        ticas,  sentar-me-ei sozinho à  mesa,  restando-me fazer   outros, de Cantanhede ou de todo esse mundo de Cristo
        isolado a festa, deitar os foguetes e apanhar as canas ..   fossem  como  esse  homem  que  encontrei  com  o  meu
           E dai, talvez não,  pois alguém me diz que não  sou   nome.
        exemplar único.                                        E  comoveu-me  o  seu  desabafo  final:  "Ó  patrício,
           Pelo menos no Brasil, e isto é das coisas que a gente   você  chamar-se  Delmar,  e ser português,  e ainda pr'a
        não esquece,  aquando da minha viagem na "Sagres»,   mais da Marinha  ... Dê cá mais um abraço.»
        em 1980, aconteceu oepisôdio que vou contar.           Já era ele que chorava e não eu.
           Aguardavam-me  no Rio  algumas  pessoas  amigas,    O feitiço do mar, o feitiço da Marinha!
        previamente  avisadas  da  viagem,  e  aguardavam-me   Si no é vera é bene trovato.  Se isto não é verdadeiro,
        também  familiares  do  comandante  Matos,  homem  da   é  bem  inventado, como diriam os italianos.  Mas a foto
        Estação Radionaval "Nunes Ribeiro", a quem ele teve   que conservo comigo reza como gente. E esta é uma das
        a amabilidade de me recomendar.                     coisas Que a gente não esquece.
           Num domingo, dia de folga para esses simpáticos fa-
        miliares, convidaram-me a visitar a zona de Cabo Frio,
        a largas centenas de quilômetros, onde eles possuíam
        uma pitoresca casa de campo. Sai mos manhã cedo.
           Andámos,  caminhámos,  não  a  pé,  mas  num  carro
        confortável, durante horas e horas por uma magníficaes-
        trada,  sempre fustigados por uma lufada de ar tropical.
        Por volta do meio-dia, o senhor Matos sugere uma para-
        gem para o almoço. Entrámos num restaurante, mas es-
        tava  repleto.  Galgaram-se  mais  uns  quilômetros  e  a
        atenção do nosso olhar prendia-se aos anúncios de uma
        e outra margens da estrada no intuito de descobrir o lu-
        gar para a tão desejada "paparoca». De novo nos detive-
        mos junto de outro restaurante, cujo ambiente não foi do
        nosso agrado e que estava praticamente vazio. Mãos no
        volante, pé no acelerador, e eis o meu amigo Matos um
        pouco desesperado. Para cúmulo, o seu filho, já espiga-
        dote,  ia  de  há  muito  tempo  lembrando:  "Ó  pai,  tenho
        fome.»
           - Cale-se, espere mais um pouco - dizia o pai.
           Mas,  isto de crianças, quando a «barriga está a dar
        horas», nada háque as cale.
           Pensei então que era a minha vez de intervir. E fi-lo.
        Toquei no ombro do senhor Matos e supliquei:
           -  Bem, agora, haja o que houver, seja bom ou mau,
        no prôximo restaurante temos de almoçar.
           a filho abafou um último soluço, e fez jeito de esfre-
        gar as mãos de contente. Até que, quase de súbito, por
        entre  ramagens  de gigantescas árvores começámos a
        descortinar um grande letreiro. Mas, foi a primeira sílaba
         que  saltou  aos  olhos.  Churrascari  Mar  ... ,  não ...  não,
         Churrascaria Delmar. Lemos todos quase em uníssono,
        parámos estupefactos, quase sem querer acreditar, mas
         a realidade estava bem à vista. Era a primeira vez na mi-
        nha vida que lia o meu nome, sem ser eu o alvejado. E
        mais espantoso é,  que tinha  sido eu,  minutos antes,  a
         afirmar: no prôximo restaurante, seja como for, temos de
         almoçar.                                                                             De/mar Barreiros,
            Entrámos  pressurosos.  Dirigi-me  a  um  dos  muitos                      capelâo graduado em cap. -frag
         funcionários e perguntei-lhe quem era o senhor Delmar.   • •••••••••••••••••••••••••••••

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