Page 187 - Revista da Armada
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da Marinha, para além daquela que - Autor desconhecido, Estudo das alguns deles coloridos, o preseme ma-
citámos: agulhas magniticas. 149 páginas dacti- nual era um trabalho imensamente útil
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- Autor desconhecido, Apolllamen- lograFadas, 2. quartel do século XX. para aqueles que desejavam aperceber-
tos de des\'io da agulha, manuscrito po- Rccentemente, e é esta a razão do -se dos segredos do magnetismo aplica-
licopiado, encadernado, com o título presente artigo, o cOntandante José Luís do às agulhas de bordo. Dizemos era
Noç&s gerau de magnetismo, escrito Ferreira Lamas, oFereceu à Biblioteca porque a agulha de marear, depois de ler
depois de 1891 e antes de 1910, 235 Centra] da Marinha, um precioso manus- feito uma brilhante carreira de séculos,
pág,. crito intitulado PrompllJl1rio das Agulhas foi destronada pela girobússola, cujo pri-
- Augusto Ramos e Costa, Insu1J.- de Bordo da autoria de Carlos Viegas meiro prot6tipo com sucesso Foi Fabri-
çiJes para o uso da agullla magnética, Gago Coutinho e João de Freitas Ribei- cado em 1908 e se deve ao engenheiro
Lisboa, 1898, 80 págs. ro. Esta obra, datada de 30 de Junho de alemão Anschutz. É por isso que hoje,
- Fonloura da Costa, Cron6metros, 1898, tem 210 páginas e divide-se em uma agulha de marear a bordo é, pouco
Navegaçi10 e Agulhas, manuscrito poli- três partes: Parte 1.', Introdução e prá- mais do que uma peça de Museu.
copiado, encademodo, usado na 5.' tica das agulhas de bordo; Parte 2.',
cadeira da Escola Noval a partir do ano Theoria do desvio: Parte 3.', Compen-
lectivo 1918-19. A 3 .• parte, respeitan- sação: Parte 4.', Perturbações das agu- A. ESldcio dos Reis,
te às agulhas, tem 28 págs. lhas. Com grande número de desenhos, eMG
Uma carta
nvariavelmente. como quase toda a gente, quando entro o intelectual prepara o chão da lareira para a noite Fria que
na porta de casa, vou directo à caixa do correio; é um se vai seguir; o navegante, sonha com o que queria dizer uma
I hábito de anos e. curiosamente, embora toda a Família carta.
tenha a chave da caixinha, ninguém está para a abrir. S6 eu, _Cartas de amor, quem as não tem- cantava o trovador
escravo de anos e recordações, cumpro lal ritual sempre na. enquanto n6s, lá no mar alto ou no rio longe, no crepúsculo
secreta esperança de encontrar algo que revolucione o jantar. violento e rápido apagando a realidade e convidando ao sonho.
Mas não, quotidianamente entro com as mãos abarrotan- esperávamos que novo dia surgisse, mais perto de um portO,
do, é certo, mas de cartas de bancos e companhias de segu- mais possível de uma largada em pára-quedas de correio de
ros, contas do gás. água e luz, reclames das Selecções, Círculo fonna a que as canas chegassem.
de Leitores. colecçõcs disto e daquilo, promoção de electro- Só o Facto de ser anunciado pública e em alta voz, no con-
domésticos e, valha-me Deus. mensalmente, o aviso do vés ou na parada, que EU tinha UMA carta já era uma acele-
depósito da minha pensão. ração cardíaca. já justificava um olhar diferente. E depois o
Scmo-mc no meu canto, onde recordo por vezes a velha saber que era mais do que uma? Duas, três, por vezes cinco
cadeira do comandante na ponte (que qualquer dia com a tec- era o máximo. era O encolher de ombros triunfantes do tími-
nologia também acabará) deito metade dos envelopes por abrir do olhando a mão vazia do vizinho ou o mordaz e terrível
no caixote do lixo, arquivo as informações bancárias com en- sorriso do eterno hipócrita, fingindo não ver a lágrima do que
joo, preparo cheques para pagar as facturas e distribuo pelos fica nll fila vazill.
filhos os convites sociais a que posso não ir. E a seguir o abrir, o cheirar, o ler de arrevesado, para
É, resumindo, uma chatice, que enche o pequeno cesto, depois reler os princípios e os fins, sempre os mais tanos,
e em que passo despercebido, pois ninguém quer saber de coisa com atenção de cabra bebendo, não fôsse alguém, bisbilho-
alguma, chegando-se ao cúmulo, já, de nem sequer pegarem tando, ap.1nh:11' um _petit_nom_, descobrir um segredo, des-
em correspondência que lhes é dirigida, se nfio obviamente vendar uma intimidade.
a de cunho pessoal. Parecendo displicência, passava-se a tarde com o bouquet
Brincando um dia com a administradora do prédio tentei de envelopes discretamente visíveis no bolso. Era um dia me-
fazer-lhe ver que as caixinhas do correio já são pequenas pa- lhor, que se comia com mais apetite, que se respirava com
ra receberem de cada vez lanta coisa e certamente não aguen- menor esforço, que se linha um olhar mais brilhante e talvez
tam ausências de abertura superiores a dois dias úteis de mais lúcido. É que, era um dia onde a guerra se esquecia,
trabalho dos simpáticos distribuidores de correio com os onde o silêncio enCantava, onde a solidiio parecia que aquecia
tradicionais sacos de cabedal. ombro descaído e um perma- um pouco.
nente sorriso de conluio quando podem entregar algo em mão. A noite, mesmo antes da hora a que agora chego a casa
O correio é pois hoje outra coisa. Não é mais o portador e abro a caixa do correio. sozinho no beliche ou num canto
da notícia que queremos ter. boa ou má, pois esta vem por qualquer. recordava tooas as palavras de todas as cartas co-
telecomunicações cada vez mais sofisticadas. mas antes um mo se fôssem vida. como se fôssem sangue e niio tinha ver-
meio de propnganda que nos entra casa dentro. A epístola sa- gonha, nenhuma, de adomlecercom olhos cheios de lágrimas,
grnda de Eça morreu, virou telegrama ou fax, e o que se tira pensando num beijo de Mãe, num abraço de noiva, numa pa-
da caixinha chama-se .. mailing ... e serve para uma data de coi- IBvra de alguém. Só mesmo um navegante, seja do que fôr,
sas. O Frustrado arrepooha-se de gozo ao ver que tanta gente aindll hoje sonha com uma carta.
se lembra de seu nome; O analfabeto massacra cada dia uma
das filhas para lhe ler linha a linha, carta a carta; o executivo Manuel Pinto MachadQ,
mete tudo na pasta para dar à secretária 00 dia seguinte; C7EN
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