Page 146 - Revista da Armada
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Património Cultural da Marinha
Património Cultural da Marinha
Peças para Recordar
4. ESTÁTUA DO PRÍNCIPE REGENTE D. JOÃO
Obra-prima da escultura neo-clássica portuguesa, a estátua em mármore do futuro Rei D.
João VI, deverá considerar-se um trabalho de grande qualidade e é sem dúvida a melhor escul-
tura portuguesa deste período artístico.
O seu autor João José Aguiar, foi bolseiro em Roma, onde permaneceu entre 1775 e 1798,
tendo trabalhado com vários mestres entre os quais Canova.
Com “soberba expressão e cheia de nobreza”, no dizer de Fernando Pamplona, a estátua
tem 230 cm de altura sobre uma base de 104X90 cm, e se bem que assinada, não está datada.
A época da sua execução tem sido até hoje motivo de controvérsia, admitindo-se que possa
ter ocorrido depois de 1801, ano em que J. J. Aguiar substitui Machado de Castro na Régia
Oficina da Ajuda, e antes da partida da Corte para o Brasil.
Sua Alteza Real é retratado de corpo inteiro, fardado de Almirante, apoiando a mão direita
sobre a porta dum leme, repuxando com a mão esquerda, que apoia na cintura, o manto real.
Trabalhada com grande minúcia distinguem-se perfeitamente os pormenores do uniforme,
botões, punho da espada e condecorações, dos quais se reconhecem a Banda de Três Ordens
com o seu medalhão, a Ordem de Nª. Senhora da Conceição e o Colar do Tosão de Ouro.
A utilização das meias calças da época, com que D. João VI aparece em vários retratos de
estado foi aproveitada pelo artista para tratar os membros inferiores do Príncipe de jeito apolí-
neo, de tal forma que parecem nuas. Lá está discretamente marcado o galão-costura que
acompanha a face externa do membro inferior esquerdo para evitar o equívoco.
Igualmente os botins marcam nitidamente o relevo do pé. Completa o classicismo do con-
junto a coroa de louros que cinge a cabeça de D. João.
Deve ser realçado o tratamento delicado que J. J. Aguiar dá ao rosto do Príncipe, muito des-
gracioso segundo o relato testemunhal de muitos dos seus contemporâneos, onde apesar do
cuidado, não disfarça a mordida cruzada e o provável palato em ogiva típicos do fácies do
retratado.
A estátua foi colocada no nicho onde ainda hoje se encontra em 15 de Setembro de 1814
“pelas honze horas do dia”, conforme se lê no ofício nessa data dirigido a D. Miguel Pereira
Forjaz, Ministro de Estado da Marinha e Guerra, e não em 1823 como é referido nas Histórias
de Arte Portuguesa que conheço. Está descentrada para a esquerda, levando a supor que o seu
autor não teve conhecimento prévio do seu destino. Até 1938 esteve sobre um plinto com o
frontal decorado, de que há fotografias, e que está entaipado pelo actual basamento.
Entre 20 de Outubro de 1987 e 3 de Janeiro de 1988, ocupou o lugar de honra na
exposição de Arte Portuguesa do Séc. XIX, que decorreu em Paris no Museu do Petit Palais. De
regresso ao país, esteve integrada no mesmo conjunto de Arte Portuguesa, no Palácio da Ajuda
até Maio de 1988.
Regressou ao Hospital em 1989.
D. João VI só foi coroado Rei em 1816, embora assumisse a governação do Reino em
1792.
Na data da colocação da sua estátua no Hospital da Marinha continuava a ser, no Rio de
Janeiro, o Príncipe Regente.
Decorre deste facto o nome, correctíssimo, com que na Marinha sempre designaram a sua
estátua e a sala do Hospital da Marinha onde se encontra – Sala do Príncipe.
Hospital da Marinha
(Texto de Rui Manuel Rodrigues de Abreu – CMG MN)