Page 321 - Revista da Armada
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va de fogo estava prestes a chegar… Logo na  sucção de um pontão fundeado a meio do rio,  construção do território, ou ainda durante as
         etapa entre Alvega e Abrantes, uma valente  foi a pique num riscar de fósforo. Felizmente o  centenas de salvamentos que aqueles efectua-
         descarga da barragem de Belver proporcio-  nosso bote de apoio estava por perto para re-  ram em mar tempestuoso. Cá por mim, tenho
         nou-nos o primeiro troço com rápidos e aí  colher os náufragos. Mal de nós se tivéssemos  um grande orgulho nas missões que cumpri a
         é que foi ver os “olímpicos” a bailar sobre a  de contar com os “especiais de corrida”!  bordo dos nossos “tatankas”, missões onde os
         água como baratas tontas! Foram tantos os   A partir dali, porém, tudo decorreu sem  nossos navios “de linha” não sujam as mãos
         que viraram ou que se enfaixaram nos juncos  incidentes de maior. O convívio com as  mas nem por isso menos nobres ou menos
         das margens que os poucos botes de apoio já  outras equipas em prova tornou-se bastan-  prestigiantes. No entanto, tal como o joga-
         não sabiam para onde se voltar. Pois sabem  te caloroso e, no final, acabámos, até, por  dor cansado que, após uma boa prestação em
         os meus intrigados leitores quem é que, na-  não fazer má figura entre as centenas de  campo, é mandado substituir e recebe uma
         quela hora, valeu às frágeis andorinhas flutu-  participantes. Afinal, todos sabem que em  estrondosa ovação do público antes de regres-
         antes? Os tatankas, pois claro!, aqueles “ta-  terreno acidentado e pedregoso não vale  sar, definitivamente, ao balneário, talvez seja
         mancos” mal jeitosos que navegavam como  de nada conduzir um “fórmula um”. Mas o  a altura das nossas velhas glórias saírem de
         uma poita de cimento mas que, agora, sem  mais importante de tudo é que, desde aque-  cena, com as devidas honras pelos elevados
         pensar na sua classificação na prova, acu-  la famigerada etapa, nunca mais ouvimos  serviços prestados, e de deixar a “Marinha do
         diam, aqui e acolá, aos mais aflitos ou, sim-  pronunciar a palavra “tatanka”!  ar condicionado” instalar-se de uma vez por
         plesmente, aos mais enrascados.      Estou certo de que a expressão também  todas. Mas isso já é outra história…
           Devo dizer que essa etapa também não foi  não ocorreu a quem quer que fosse quando                  Z
         feliz para a equipa da Naval, pois perdemos  os nossos velhos “chaços” foram à Guiné re-    J. Moreira Silva
         uma canoa, que, apanhada na corrente de  colher refugiados ou a Timor auxiliar na re-               1TEN



          225 Anos de Relações Portugal - Rússia
          225 Anos de Relações Portugal - Rússia


                                    Navios Russos em Lisboa


               o passado dia 9                                                                uma convenção que já
               de Setembro o                                                                  envolvera outros países
         NTejo estremeceu                                                                    Foto CAB T Carvalho  da Europa e que visava
         com o troar das salvas de                                                            a segurança da navega-
         artilharia com que, em si-                                                           ção mercante num espa-
         nal de amizade, dois na-                                                             ço em que a França, a Grã
         vios russos (Neustrashimy                                                            Bretanha, a Espanha e os
         e Kaliningrad) saudavam                                                              Estados Unidos da Amé-
         a cidade de Lisboa e Por-                                                            rica estavam em guerra:
         tugal. Um costume muito                                                              tratava-se da Convenção
         antigo em todas as mari-                                                             Marítima de Neutralida-
         nhas do mundo e que                                                                  de Armada, que viria a
         não se repetiu muitas ve-                                                            ser celebrada em 1882.
         zes com a armada russa.                                                              O ambiente era franca-
         Vieram agora a Portugal                                                              mente favorável a esta
         assinalando a comemora-                                                              amizade e, já antes, Lis-
         ção de 225 anos do estabe-                                                           boa tinha sido visitada
         lecimento de uma relação                                                             por uma esquadra rus-
         diplomática entre os dois                                                            sa, a primeira que algu-
         países. No longínquo ano de 1779, Francisco  sa muito à vontade para estabelecer laços de  ma vez demandara o Tejo. Um facto que
         José de Horta Machado apresentava as suas  amizade com potências tão fora do quadro  ocorreu pela primeira vez no ano de 1780,
         credencias à imperatriz Catarina II, ao mes-  tradicional português como era a Rússia. Mas  repetindo-se em 1781. Outras vezes vieram
         mo tempo que chegava a Portugal e era aceite  – como não poderia deixar de ser – a iniciativa  navios russos a Lisboa, mas não com uma fre-
         como embaixador, o Conde de Nesselrod.  dos comerciantes passou à frente dos murmú-  quência que mereça alguma alusão especial. É
           Deve dizer-se que durante todo o sécu-  rios das chancelarias e por meados do século  de notar que em Dezembro de 1807, quando
         lo XVIII houve vontade mútua de que esta  já se vendiam vinhos portugueses na Rússia,  o general Junot entrou em Lisboa, estava cá
         troca de diplomatas se efectuasse, apesar de  transportados em navios nacionais que de-  uma esquadra russa que, por sinal, era aliada
         que circunstancialismos diversos sempre o  mandavam S. Petersburgo, através do Báltico.  da França e acabou por ser aprisionada pelos
         foram protelando de década para década. A  Talvez tenha sido esta iniciativa mercantil –  ingleses, após a assinatura da Convenção de
         Rússia despertara recentemente de um sono  que teve por detrás a Companhia Geral da Agri-  Sintra e a expulsão dos franceses.
         medieval em que vivera isolada da Europa  cultura da Vinhas do Alto Douro – a responsável   O circunstancialismo da política dos dois
         até ao reinado de Pedro o Grande, e Portugal  pelo apressar das conversações que estavam  países ao longo do século XX colocou-os de
         vivia alheio (ou desconfiado) da nova Rús-  congeladas há anos. O que é certo é que no  costas viradas, mas eis que comemoram ago-
         sia que aparecia nos salões de Viena, Paris e  final da década de setenta a troca de embai-  ra 225 anos de um frutuoso relacionamento,
         Londres, com uma nova imagem – sem dú-  xadores estava feita, e crescia um apoio signi-  assinalando o facto com uma visita de porto
         vida – mas dando-nos sempre a sensação de  ficativo ao comércio português em S. Peters-  e dois exercícios PASSEX com o NRP Saca-
         algo tão distante como estranho. É certo que  burgo, sendo criado um núcleo de negócios e  dura Cabral.
         as obrigações da aliança inglesa – que foram  um hospital nos anos que se seguiram.                   Z
         muito úteis na afirmação anti-castelhana após   No princípio da década de oitenta, Cata-   J. Semedo de Matos
         1640 – não deixavam a diplomacia portugue-  rina II propôs ao nosso país a assinatura de           CFR FZ
                                                                              REVISTA DA ARMADA U SETEMBRO/OUTUBRO 2004  31
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