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REVISTA DA ARMADA | 511




          Stratεgia                                                                                     25








          Cimeira de Varsóvia: Em busca dos 360º




            m 8 e 9 de julho, realizou-se em Varsóvia mais uma cimeira
         E da NATO, reunindo os Chefes de Estado e de Governo dos 28
          Aliados e do Montenegro, em breve o 29º membro da Aliança
          Atlântica. Em 2015, no seu discurso de despedida do Conselho
          do Atlântico Norte, o Embaixador João Mira Gomes caracterizou
          a degradação do ambiente de segurança ao longo das últimas
          cimeiras da NATO de uma forma original: “Se podemos dizer que
          Lisboa [2010] foi a cimeira da esperança, então Chicago [2012]
          já foi a cimeira da meia-esperança e Gales [2014] foi claramen-
          te a cimeira da plena crise”. Nesta mesma linha de pensamento,
          como poderemos agora definir a cimeira de Varsóvia?                                                    Foto NATO
           O desenrolar da crise na Ucrânia levou a pensar que Varsóvia se
          encaminhava para ser a cimeira anti-Rússia, mas isso acabou por
          não se confirmar. Com efeito, a intensificação dos conflitos no Mé-  • Reforçar a presença avançada da NATO na Polónia, Estónia, Letó-
          dio Oriente e Norte de África, que deram lugar à maior crise de re-  nia e Lituânia, a partir de 2017, com quatro batalhões multinacionais
          fugiados e migrantes para a Europa desde a Segunda Guerra Mun-  liderados pelos Estados-Unidos, Reino-Unido, Alemanha e Canadá,
          dial, bem como os brutais ataques do autodenominado Estado Islâ-  numa clara demonstração de que um ataque contra um daqueles
          mico em vários países Aliados, acabaram por sustentar a designada   Aliados de leste enfrentará uma resposta coletiva da Aliança.
          “abordagem de 360°”. Esta expressão – introduzida por Portugal no   •  Reconhecer  o  ciberespaço  como  um  domínio  operacional  e
          jargão da NATO – reflete o imperativo da Aliança não se focar numa   aumentar o investimento nas capacidades de ciberdefesa nacio-
          só área geográfica ou numa única ameaça, sob pena de se tornar   nais, conforme antecipado no artigo da edição de julho (“Portu-
          menos relevante como ator global e de perder flexibilidade para   gal na Ciberdefesa da NATO”).
          responder aos desafios multifacetados do mundo atual.   • Implementar o “quadro de adaptação da NATO aos desafios e
           Assim, não obstante o resultado mais visível ter sido a decisão   ameaças provenientes do sul”, melhorando o conhecimento situa-
          de reforçar a presença avançada da NATO nos territórios Aliados   cional, as capacidades expedicionárias e o planeamento avançado.
          orientais, julgamos que Varsóvia poderá ser lembrada como  a   Cientes de que mais segurança e defesa implica mais investi-
          cimeira em busca dos 360°, com as principais decisões a centra-  mento, os Chefes de Estado e de Governo reiteraram a importân-
          rem-se em torno de dois grandes pilares: Dissuasão e Defesa e   cia dos Aliados cumprirem o compromisso de atingir orçamentos
          Projeção de Estabilidade, que abordaremos de seguida.   de defesa da ordem dos 2% do PIB, situação que melhorou nos úl-
                                                              timos dois anos, embora ainda haja um longo caminho a percorrer.
          DISSUASÃO E DEFESA (E DIÁLOGO)                        Finalmente, uma das decisões mais importantes que saiu de
                                                              Varsóvia foi a de retomar o diálogo político e diplomático com
           No âmbito deste primeiro pilar, essencialmente orientado para   Moscovo, tendo em vista promover a transparência e a redução
          leste, a cimeira de Varsóvia foi aproveitada para demonstrar o   de  riscos,  evitando  mal-entendidos  e  possíveis  incidentes  em
          cumprimento dos compromissos assumidos em Gales e para to-  manobras militares que poderiam resultar numa desnecessária
          mar decisões ao mais alto nível quanto à adaptação a prosseguir   escalada de tensão. Pese embora a Rússia tenha deixado de ser
          nos próximos anos.                                  considerada como um parceiro da NATO, não podendo o relacio-
           Nos últimos dois  anos, a Aliança implementou com sucesso   namento voltar ao “business as usual”, seria um erro descurar o
          o Plano de Ação de Prontidão (Readiness Action Plan) decidido   diálogo pois, tal como foi afirmado em Varsóvia: “A Rússia é parte
          em Gales, triplicando o total de tropas da NATO Response Force   do problema, mas é também parte da solução”.
          (NRF) para 40 mil militares e criando uma Very-High Readiness
          Joint Task Force (VJTF) capaz de ser projetada em 2 a 3 dias, com   PROJEÇÃO DE ESTABILIDADE
          uma componente marítima constituída pelas Forças Navais Per-
          manentes e outros meios operacionais, como submarinos, navio   O segundo pilar da cimeira de Varsóvia, mais vocacionado para
          de comando e controlo, aeronaves de patrulhamento marítimo e   lidar com os desafios oriundos do arco de instabilidade a sul, con-
          forças de operações especiais.                      grega um conjunto de iniciativas no âmbito das tarefas essenciais
           Em Varsóvia avançou-se para uma nova postura de dissuasão e   de gestão de crises e segurança cooperativa. Seguindo a lógica
          defesa, tendo sido decidido:                        de que uma vizinhança mais estável se reflete em maior seguran-



         4    SETEMBRO/OUTUBRO 2016
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