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REVISTA DA ARMADA | 548





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                A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE


              EUROPEIA DE SEGURANÇA E DEFESA



                 pós a segunda Guerra Mundial, a Europa assisƟ u à
              Acriação de várias organizações estruturantes que visa-
              vam, genericamente, intensifi car os laços de coesão entre
              os Estados, fortalecer as suas economias enfraquecidas
              pelo esforço de guerra e assegurar uma paz duradoura
              na Europa Ocidental, tendo em conta a ameaça soviéƟ ca.
               Algumas dessas organizações privilegiavam a coo-
              peração numa vertente políƟ ca, outras optavam pela
              vertente económica e outras ainda pela militar. Nesta
              úlƟ ma vertente, realça-se o Tratado de Bruxelas, assi-
              nado em 1948, que veio a dar lugar, em 1954, à União
              da Europa Ocidental (UEO). Importa referir que o dilema
              de segurança na Europa era bastante amenizado pelo
              compromeƟ mento  políƟ co e militar, de longo prazo,
              dos Estados Unidos da América (EUA) na Europa, o que
              terá contribuído para a diluição dos objeƟ vos do Tratado
              de Bruxelas no âmbito mais vasto da Aliança AtlânƟ ca,   Assinatura do Tratado de Lisboa (13 de Dezembro de 2007).
              criada em 1949. Assim, não é surpreendente que os pro-
              jetos de integração mais bem-sucedidos na Europa do pós-guerra   emprego operacional da UEO. Foi a célebre Declaração de Peters-
              tenham incidido na vertente económica. Primeiro, com a Comuni-  berg, que advogava o emprego das unidades militares dos países da
              dade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), em 1951, e, posterior-  organização, nas seguintes missões:
              mente, com a Comunidade Europeia da Energia Atómica (CEEA) e   • Missões humanitárias e de evacuação;
              a Comunidade Económica Europeia (CEE), criadas em 1957, atra-  • Missões de manutenção da paz;
              vés do Tratado de Roma, por Alemanha, Bélgica, França, Holanda,   •  Missões de forças de combate para a gestão das crises, incluindo
              Itália e Luxemburgo, com o objeƟ vo de estabelecer uma união   operações de restabelecimento da paz.
              aduaneira e um mercado comum.                         Cinco anos mais tarde, em 1997, o Tratado de Amesterdão refor-
               Todavia, as discussões sobre o aprofundamento da segurança e   çou a integração da UEO na UE, com a primeira a funcionar cada
              defesa europeia foram uma constante no projeto europeu. Com   vez mais como complemento militar dos mecanismos de integração
              efeito, para além da UEO, cabe destacar um conjunto de iniciaƟ vas,   económica e políƟ ca da segunda.
              nomeadamente, a Cooperação Europeia de Defesa, rejeitada pela   Entretanto, a grave crise nos Balcãs, durante a década de 90, Ɵ nha
              Assembleia Nacional Francesa, em agosto de 1954, ou o Plano Fou-  demonstrado as vulnerabilidades da recém-criada PESC. Foi neste
              chet, proposto pelo Presidente Francês Charles de Gaulle e recusado   contexto que, em 4 de dezembro de 1998, na Cimeira Franco-Britâ-
              pelos governos da Bélgica e da Holanda, em 1962, face à exclusão do   nica de Saint Malo, o então Primeiro-Ministro Britânico Tony Blair e
              Reino Unido deste projeto. Realça-se, ainda, a Cooperação PolíƟ ca   o então Presidente Francês Jacques Chirac acordaram que “a União
              Europeia, um mecanismo de cooperação na área da políƟ ca externa   deve ter capacidade para desenvolver ações autónomas, devendo
              e da defesa, criado a parƟ r do fi nal da década de 60, e a revisão dos   para tal ser apoiada por forças militares credíveis, por meios que
              tratados comunitários, através do Ato Único Europeu, assinado em   permitam decidir o uso dessas forças e a pronƟ dão necessária para
              17 de fevereiro de 1986, que reforçou a integração nestas matérias.  fazê-lo, de modo a responder às crises internacionais”. Esta iniciaƟ va
               Em 1992, a integração europeia aprofundou-se com a assina-  bilateral teve repercussões estratégicas profundas, pois consƟ tuiu a
              tura do Tratado de Maastricht, que rebaƟ zou a CEE, insƟ tuindo a   pedra angular da construção do vetor militar da UE.
              atual União Europeia (UE), e criou a PolíƟ ca Externa e de Segurança   Neste seguimento, em junho de 1999, após a campanha de 78
              Comum (PESC), integrando a UEO no seu processo de desenvolvi-  dias de bombardeamento do Kosovo – que evidenciou, mais uma
              mento. No entanto, a UEO manteve a sua autonomia organizacio-  vez, as enormes diferenças entre as capacidades militares dos EUA
              nal, consƟ tuindo-se como a componente de defesa do processo de   e dos países do Velho ConƟ nente – os líderes europeus, reunidos na
              construção europeia. É neste enquadramento que, numa reunião   cimeira de Colónia, criaram, no seio da PESC, a PolíƟ ca Europeia de
              de Ministros dos Negócios Estrangeiros e de Ministros da Defesa   Segurança e Defesa (PESD), com o objeƟ vo de reforçar a vertente
              dos Estados-Membros (EM) da UEO, em 1992, no Hotel Petersberg,   militar da UE. Com isso, a UEO foi defi niƟ vamente subsumida, muito
              perto de Bona, foi aprovada uma importante declaração sobre o   embora os seus acordos tenham permanecido em vigor até 31 de


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