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REVISTA DA ARMADA | 562
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ERIC GROVE (1948-2021)
IN MEMORIAM
aleceu, no passado dia 15 de abril, um dos mais conceituados
Fhistoriadores e estrategistas marítimos da atualidade, o Profes-
sor Eric Grove, que por diversas vezes visitou a Marinha Portuguesa
e nos brindou com as suas brilhantes palestras, em locais como a
Academia de Marinha, a Escola Naval e o Estado-Maior da Armada.
Dessa forma, justifica-se, inteiramente, uma singela homenagem,
recordando alguns aspetos pontuais do seu pensamento.
Neste contexto, gostaria de começar por referir que a produção
literária do Professor Eric Grove incidiu maioritariamente na histó-
ria marítima e naval. Não obstante, também ofereceu importantes
contributos para o campo da estratégia, em diversas obras, de que
se salienta uma edição, comentada por si próprio, da obra-prima
de Julian Stafford Corbet: Some Principles of Maritime Strategy,
além do conhecido livro The Future of Sea Power (1990). Este li-
vro foi escrito durante a Guerra Fria e tem, portanto, um grande
enfoque no enfrentamento (naval) entre os dois grandes blocos
da altura, liderados pelos EUA e pela União Soviética. A dissolução
da União Soviética e o fim do Pacto de Varsóvia (em 1991) vieram
alterar muitas das premissas que serviram de base ao livro, mas
isso não lhe retira o enorme interesse e valor, sobretudo nas partes
mais conceptuais, nomeadamente as relativas aos fundamentos
do poder no mar, às funções das marinhas e à tipologia das ma-
rinhas. Esta última temática foi tratada nesta secção da Revista da
Armada, em fevereiro deste ano, num artigo intitulado “Hierarquia
das Marinhas Mundiais”, pelo que abordarei de seguida as outras
duas matérias, recordando o que sobre elas escreveu Eric Grove.
FUNDAMENTOS DO PODER NO MAR
A identificação dos fatores do poder no mar é um aspeto que tem
ocupado muitos dos mais prestigiados estrategistas marítimos da
história, sobretudo desde que Mahan apresentou o seu postulado
de seis elementos que determinam porque é que as nações apos-
tam num forte poder naval e marítimo, designadamente:
• Posição geográfica;
• Configuração física, incluindo, no que com ela se relaciona, a naval, mesmo quando tenham um interesse reduzido na utilização
produção natural e o clima; do mar. Por outro lado, o poder económico dos Estados mais peque-
• Extensão do território; nos vai condicionar o nível de sea power que eles podem edificar.
• Tamanho da população; Em segundo lugar, estaria a capacidade tecnológica, pois um
• Carácter do povo; país economicamente poderoso poderá não conseguir edificar
• Carácter do governo, incluindo as instituições nacionais. uma armada tecnologicamente avançada, se não dominar as
Eric Grove começou, precisamente, o seu estudo sobre os fun- tecnologias mais inovadoras. Grove ilustrou a importância deste
damentos do poder no mar com uma análise crítica à validade e elemento com os exemplos dos EUA e da União Soviética, em que
atualidade do elenco proposto por Mahan. Na sua avaliação, Grove o desenvolvimento tecnológico americano, sendo comparativa-
considerou que, no primeiro lugar de qualquer lista de fatores de- mente superior ao soviético, influenciava, de forma determinan-
terminantes do poder no mar, deveria vir sempre o poder econó- te, a sua maior capacidade naval.
mico, pois é o alicerce que suporta tudo o resto. Países economica- Em terceiro lugar, Grove colocou a cultura sócio-política, que in-
mente poderosos podem devotar recursos significativos ao poder cluía: (i) a maior / menor tendência que as sociedades têm para
4 MAIO 2021