Page 104 - Revista da Armada
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A ((Sagres)), o público
e os Descobrimentos Portugueses
ara além das suas tradicionais missões como
escola de mar dos futuros oficiais da nossa Mari-
Pnha e de presença naval portuguesa no estran-
geiro, a .. Sagres» foi também, durante 1988, escola para
uma amostra significativa da juventude portuguesa. Dos
cerca de 50 000 visitantes que o navio recebeu ao longo
do ano, 2500 eram jovens integrados em visitas de
estudo solicitadas pelos respectivos estabelecimentos
de ensino secutldário e primário. grande parte delas
incentivadas e coordenadas por uma organização juve-
nil - o Grupo Media.
Inseridas quase sempre em planos de actividades
relacionados com as comemorações dos Descobrimen-
tos portugueses, estas visitas, exclusivamente de porto,
bem demonstram as potencialidades do navio para tal
efeito. Para a maioria dos jovens elas corresponderam o público, em biche, espeftl a sua ocasiSo df1 visitar a «Sagres» (foto
pelo menos à satisfação da justificada curiosidade que «RA_ - Rui Salta).
os grandes veleiros despertam sobre quem nunca teve
um avanço de pelo menos 50 anos relativamente às
uma oportunidade de lhes pisar o convés. Curiosidade
outras nações europeias que nos seguiram e levando
a que certamente não é alheio o misticismo que envolve
a sua imagem de herança simbólica do poder rlaval assim a cabo, em cerca de um século, a extraordinária
epopeia que foram os nossos Descobrimentos.
durante os cinco séculos que antecederam o nosso.
Cabe-nos o mérito inquestionável de, como pioneiros
As longas viagens, o contacto com o desconhecido,
nesta matéria, termos sido um povo que efectivamente
o exotismo do deslumbramento dos lugares distantes,
os usos e costumes das suas gentes, as violentas tem- deu novos mundos ao Mundo e ao qual a civilização
hodierna deve muito do desenvolvimento e prosperidade
pestades, os combates navais, a pirataria, enfim toda
de que disfruta.
a sorte de aventuras, glórias e tragédias que o mar
trouxe aos que navegando tiveram de o enfrentar, des- No âmbito exclusivo do interesse nacional portu-
guês, o mar continua, hoje como ontem, a ser de
bravar e dominar, exercem um inegável fascínio sobre-
importância vital. Para ilustrar a nossa actual dependên-
tudo nas mentes imaginativas e sonhadoras. Alimentar
cia dele, basta referir três exemplos bem conhecidos:
este fascrnio, com a realidade hist6rica e mesmo com
o pouco que a realidade actual pode proporcionar, não a) Cerca de 90% das nossas importações
me parece em nada descabido num pars de tradições chegam-nos por via maritima.
marítimas como o nosso, em que a História se apresenta b) A área da nossa Zona Económica Exclusiva
de uma riqueza quase inesgotável neste campo. Trata- é cerca de 19 vezes superior à nossa área ter-
-se, pois, de recorrer a um excelente factor de motiva- ritorial.
ção, utilizando um meio excepcionalmente propfcio para c) A necessidade imperiosa de utilizar a via
esse efeito, como é, de facto, a "Sagres ... E é nesta pers- marftima no transporte de cargas entre o Con-
pectiva que, procurando ampliar os motivos de interesse tinente e as regiões autónomas dos Açores
que só por si o navio apresenta, se poderá aproveitar e da Madeira.
a oportunidade para dotá-lo de meios que possibilitem
a realização de exposições permanentes durante as Atribuir ao mar a devida importância e relevo no
estadias em portos nacionais ou estrangeiros, nomea- planeamento e nos projectos das comemorações dos
damente em Lisboa, onde as visitas ao navio (públicas Descobrimentos portugueses, julgo ser, portanto, uma
ou de estudo) se vão tornando uma prática comum, preocupação de sentido patriótico a que interessa dar
exposições que seriam obviamente orientadas para a a necessária difusão. E para se evitar a sua relegação
temática do mar e sua importância no contexto nacio- para um plano secundário no conjunto das comemora-
nal e internacional do passado e do presente. Nunca me ções, há que avançar desde já com projectos realistas
parece demais relembrar que o mar constituiu o meio e articuláveis com outros eventos programados, por
físico cujos segredos e mistérios os Portugueses tive- forma a optimizar os respectivos beneffcios. Falar-se, por
ram de desvendar, à custa de muitos sacriffcios, estudo, exemplo, de grandes paradas navais, de festivais náu-
coragem, determinação e persistência, fazendo-o com ticos ou de regatas oceânicas envolvendo centenas de
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