Page 273 - Revista da Armada
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Conversa entre Marinheiros ...
I
Conduzida pelo contra-almirante Ma-
Iheiro do VaJe
, Intervenientes: .Revista da Armada ..
(RA) e capitão-Ienente Manuel Ma-
ria Baltazar, ex-chefe da Banda da
Armada (à esquerda na foto) (MMS).
RA - Julgo que, mesmo dentro da Armada, pou- minhas: concorrer a sargento-ajudante músico e fazer
cos se aperceberam do importante papel que a Banda o curso de oficial músico no Exército ou concorrer a
da Armada vem desempenhando na propaganda da Ma- sargento-ajudante músico na Banda da Armada, e as-
rinha e das suas tradições. não só no Pais, como até cender a oficial músico na Marinha. E foi então que a
no estrangeiro. Por isso, promovemos esta -Conversa voz do sangue decidiu por esta! Tinha cerca de 40 anos
entre marinheiros". desta vez mais propriamente entre de idade. Despi a farda cinzenta e enverguei a azul e
um marinheiro de verdade, embora já retirado das lides branca, com botões de âncora.
do mar, e um oficial músico, marinheiro pelo coração. Era chefe da Banda da Armada o comandante Mar-
Pessoalmente, tenho a impressão que qualquer por- ques Romão e sub-chefe o primeiro-tenente António For-
tuguês que vê a nossa Banda sente um Iravo a água tunato. Eu, entrei como sargento-ajudante e em 1970,
salgada. um cheiro a maresia. a sensação de ventos do na vaga deste último que passou à reserva, fui promo-
largo. de vagas alterosas, de temporais, de caravelas vido a oficial (1975). Em 1976, o comandante Marques
e naus, de naufrágios o •• enfim a Armada desde sempre Romão passou também à reserva e eu fui nomeado che-
amada pelo Povo porque está nele irmanada. Ê a histO- fe da Banda da Armada.
ria que os liga com amarras tão fortes que não há for- Simultaneamente desenvolvi com regularidade gran-
ças que as quebrem I de actividade a nlvel civil, como executante de saxofo-
Embora avesso a exibicionismos, sejam eles de ne em várias orquestras ligeiras, colaborei na Orquestra
qualquer natureza, entendo que no caso da nossa Ban- Sinfónica da ex- Emissora Nacional, fiz parte do Quar-
da devo fazer uma excepção e que, quanto mais brilho teto de Saxofones na Ópera francesa . Paris à naus
e imponência lhe dermos melhor desempenhará o seu deux .. , integrado na Companhia de Ópera de Câmara
papel de representante privilegiado desta secular Mari- da Fundação Calouste Gulbenkian.
nha portuguesa. Uniformes impecáveis, disciplina, Frequentei o Consevatório Nacional onde terminei
.. Tambor-Mar .. e fanfarra, são pormenores a ter em conta os cursos de Saxofone, Instrumentação, Acústica, His-
tória da Música e Composição, e dois cursos de direc-
E agora, comandante Baltazar, conte para os nos- ção de Banda na Fundação Gulbenkian.
• sos leitores a sua história. como director de bandas de música civis, que tive de
Com 28 anos de idade comecei a minha actividade
MMB - Nasci na Lourinhã, ali junto ao mar, e sou
filho de pais trabalhadores operários, sendo meu pai mú- interromper com a promoção a oficial músico da
sico da banda local. Armada.
Por vocação e seguindo os seus passos, comecei RA - Agora fale·nos da sua experiência nesse tra-
a aprender música aos 11 anos, em simultâneo com o balhoso e difícil cargo de chefe da Banda da Armada.
curso comercial; aos 13, ingressei na banda a locar cla- MMB - Foi precisamente nesse ano de 76 que a
rinete, Aos 18, concorri à Banda da Guarda Nacional Re- Banda deu um grande salto nas suas actividades em
publicana, fui admitido e fiz a minha carreira desde apoio das populações civis, a pedido, ao Estado-Maior
soldado a primeiro-sargento, então já como executante da Armada, de autarquias, governos civis e associações
de saxofone, o que não foi fácil pois nesses tempos não várias, sempre, como é óbvio, sem prejuJzo dos inúme-
havia promoções por diuturnidade. ros serviços de carácter militar que lhe eram deter-
Nesta altura da minha vida abriam-se-me dois ca- minados.
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