Page 48 - Revista da Armada
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sobre, isto é, recebe o vento pelo
lado da proa, mas o navio ainda
segue demasiadamente; os mario
nheiros das talhas esperam ansiosos
a voz de arriar. Cada segundo Que
passa é uma probabilidade a menos
de salvamento.
Finalmente, o oficial de Quarto
ordena:
- Arria o escaler!
O guarda-marinha Macedo,
apressado, chega ainda a tempo de
se arriar por uma talha, como ginasta
consumado.
- Larga! Larga!
Com a orçada do navio, a bóia de
salvação ficou agora para a proa.
No escaler, guarda-marinha, contra-
mestre e patrão, todos de pé sobre
a bancada, amparando-se uns aos
outros no balanço desencontrado,
procuram descortiná-Ia por entre a
rebentação. Do tombadilho indicam:
- mais para bombordo!
Já a viram.
- Lá está elal Rema, rapazes!
Puxa!
E o escaler salta por cima da
crista das vagas que o encharcam,
acompanhado pelos olhares e pelos
votos ardentes de Quantos ficaram a
bordo. Mas nenhum binóculo conse-
gue descobrir o náufrago.
Passado um momento, prosse-
guindo a manobra do pano, conti-
nuam as vozes do oficial de Quarto
e os apitos do mestre:
- Carrega os punhos aos papa-
-figos!
- Braços de proa a sotavento!
Braços de ré a barlaventol
Alai
Só depois do navio bem atraves-
sado, colhidos todos os cabos de
manobra e passada a excitação da enxergado com a rebentação. E car o escaler na agulha, assim reco-
surpresa, nas conversas em voz bai- depois, com o fato de lona que trazia nhecendo que ele prosseguia na
xa entre grupos, se ia contando Que no serviço do costado, como poderia busca, remando em diferentes direc-
o náufrago era o 72 Que estava tra- sustentar-se na água esperando çOes. Mas o navio, abatendo sem-
tando do costado, numa prancha a socorro? Assim, com a reflexão, a pre, e o escaler aguentando-se
ré. Certamente, ouvindo tocar à esperança de salvamento ia abando- contra a vaga, afastavam-se cada
revista, tinha imprudentemente des- nando os corações de todos. vez mais. Ninguém dera pelas qua-
feito o nó do cabo Que o amarrava Os minutos iam passando. Não tro badaladas das duas horas que
e, escapando-Ihe a mão Que deitara havia um olhar que não procurasse carram lugubremente do sino de
ao cabo da prancha para se içar, o escaler, que mal se enxergava. bordo, batidas por uma ronda cons-
caiu ao mar. Gritara então, e as pra- Nos cestos de gáveas, nos vaus e cenciosa.
ças que do tombadilho lhe lançaram nas endrcias, oficiais e guardas- Eram duas e um quarto quando
a bóia, vendo-o nadar desesperada- -marinhas iam juntar-se aos gajeiros o comandante, mais uma angústia a
mente, animaram-se. ~ o 72, sabe e aos permanentes dos mastros, de juntar a tantas que deviam ter apo-
nadar! binóculo em punho, na ânsia de quentado a sua agitada carreira de
Mas o navio fugia-lhe duzentos melhor o descobrir na crista das marinheiro, de colonial e de diploma-
e cinquenta metros em cada minuto vagas. ta, se decidiu a mandar içar o sinal
que passava; a bóia calda na água, No tombadilho, a vista perspicaz de chamamento, ao cabo de uma
muito distante dele, não a podia ter do tenente Coutinho conseguia mar- hora de busca.
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