Page 370 - Revista da Armada
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porto de Suez, entre eles o Fayollm, onde iam embarcados o conde lidade de oficiosamente nos representar e não estivesse ali como
de Resende e um sr.Qlleiroz - o sublinhado é nosso -; confonne membro do conselho de administração, nem essa talou qual ~
referido por Al,:ares de Andrade, em artigo publicado no Jornal presentação oficiosa teria existido. Porém, consolemo-nos que
do Comércio. As cinco horas da tarde, os primeiros navios fomos representados pelo próprio kediva, o qual, sendo-lhe apre-
estavam à vista da cidade de Ismaflia, nome dado em honra do sentado o nosso oficioso representante, se dignou di7.er-lhe: "Que
Kediva, que iria oferecer no dia seguinte uma festa sumptuosa que muito sentia não ver entre os augustos soberanos protecton.'S do
custou 37 milhões de francos. Estava encomendada uma ópera a Canal de Suez que tinham vindo assistir à inauguração suas
Giuseppe Verdi, mas esta bela peça sinfónica não fica pronta a magestades el-rei de Portugal e seu augusto pai". Oficialmente, o
tempo, e assim, a primeira audição da Aida só terá lugar, no Cairo, governo português desrulpou-se quatro me;es depois, em carta de
a 24 de Dezembro de 1871. No dia 19 os navios continuaram 14 de Março de 1870, assinada por José da Silva Mendes, e dirigida
viagem e a 20 chegaram a Suez, onde terminaram os festejos. ao consuJ de Portugal no Egipto, na qual diz que "muito recomen-
Assim, uma das obras mais extraordinárias da História da do a V.Exa que faça chegar ao conhecimento de Sua Alteza o viçe..
Humanidade estava pronta para receber os seus utilizadores, rei do Egipto o vivo sentimento que o governo de sua magestade
diminuindo consideravelmente as longas vi.1gens para o Oriente. teve de que a bandeira portuguesa não flutuasse entre as dos
O facto do nosso país não ter estado presente nas cerimónias da navios de guerra que das diversas nações concorreram à festa de
inaugu ração deu aso a inúmeras críticas. O visconde de inauguração do Canal, facto este que, como V.lixa sabe, foi devido
Juromenha publicou um violento panfleto onde diz: "se como unicamente à avaria que a colVeta Estephania, quando se dirigia a
nação marítima fizemos a mais miserável figura, diplomática- esse porto, sofreu, em consequência de um fortíssimo temporal
mente não foi menos triste. Diz-nos o sr. Andrada que o governo que a colheu no Mediterrânio".
havia encarregado o sr. Popolani de nos representar, que pelo final Alguns dias após a inauguração, uma galera, a Viajante, levando
do nome parece italiano e ainda este senhor teve a fatalidade de carga e passageiros para Macau, foi o primeiro navio português a
adoecer, de sorte que o sr. Andrada não tomasse a si a responsabi- atravessar o Canal.
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\omaz Maria Bessone (1815-18n), que o rei D. Luis faria A ViajaI/te embarcou de facto passageiros e carga e, no
visconde em 1870. foi um homem de grande dinamismo dia 17 de Outubro, iniciou a sua viagem para Macau, sob o
T e que teve um papel importante na vida portuguesa. Ao comando de José Sabino Gonçalves.
deixar o exército libertador do duque da Terceira, onde se Sabemos que este veleiro foi construído em boa teca nos
tinha alistado como voluntário, começou a praticar na casa estaleiros de Damão, no ano de 1850 e que o seu primeiro
comercial de seu tio. Aos 23 anos ~í tinha efectuado quatro via- proprietário foi o visconde de Bessone, que utilizou o
gens à China. Em 1840 presta bons serviços ao governo, na navio no comércio com o oriente donde importou, em
qualidade de membro activo da Associação Mercante especial, chá . Em 1896, pertencendo a António Costa,
Lisbonense e da Sociedade Marítima, instituições destinadas a mudou a sua armação para barca. Durante muitos anos a
dar um vigoroso impulso ao comércio nacional. Em 1852 pres- Viajmlte foi o mais antigo navio mercante português, pois
ta socorros às famílias dos náufragos do navio Porto; em 1858 alcançou os 67 anos de idade quando desapareceu tragica-
ofereceu uma escuna ao governo de Moçambique; em 1863 mente, em 2 de Outubro de 1917, afundado pela guarnição
funda uma empresa de planos inclinados em Porto Brandão. de um navio alemão, a 180 milhas a nordeste da ilha de
Sendo proprietário de uma empresa de navegação e Porto Santo. Os seus doze tripulantes salvaram-se. A mais
apercebendo-se da importância que a breve abertura do Canal antiga referência à passagem da galera pelo Suez, encon-
de Suez tinha para o encurtamento das viagens para o Oriente, trámo-la na obra apócrifa "Visconde de Bessone, Esboço
faz publicar, nas ee!jçõcs do Diário de Notícias e do Jornal de Biographico lO que literalmente nos diz: "porque tendo o
Comércio, de 4 a 12 de Outubro de 1869, o seguinte anúncio: governo enviado a corveta Estephania para assistir à magna
solenidade da abertura do Canal de Suez, e tendo a Casa
MACAU Bessone enviado com o mesmo propósito um dos seus me-
(Com escalo por Port Saicl e Canal de Suez) lhores navios, a galera Viajallte, aconteceu que a corveta,
sai no dia 15 de Outubro a Galera Porlvguesa V"lOjanle desarvorando, teve que regressar a Lisboa, e a galera
Pora carga ou pas.soge;ros Irata-se com seguiu avante, o que foi para Portugal um grande serviço,
Sessone Júnior & Barbosa, em liquidação, aliás a bandeira portuguesa deixaria de figurar em tão
expléndida festa marítima
H
• Depois deste escrito de 1875,
ou com o cotreefof A l. Gomes Neto
aparece- nos a notícia necrológica de José Sabino
Gonçalves, publicada em "O Occidente " de 30 de Julho de
1909, e, quase nos mesmos termos no "Boletim Marítimo" da
Liga Portuguesa, dizendo que a Viajallte, com uma das
gáveas partidas, entrou triunfalmente em Port Said, no dia
da inauguração do Canal. O Comandante Antóni o
Ma rques Esparteiro, nos "Três Séculos 110 Mar", segue a
notícia dada em primeira mão na referida biografia do vis-
conde de Bessone.
Em 1951, Armando de Aguiar na sua bem conhecida
obra "O MI/lido ql/e os Portugueses criaram" põe a Estepl/allia
a recolher-se a um dos portos do Chipre (de fac to foi
Gibraltar) e, quanto à ViajaI/te, diz ter saído três dias
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