Page 237 - Revista da Armada
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Em Março de 1885 Wenceslau de Mo raes é  périplo do continente africano escalando São  meios para acudir aos acontecimentos na Gui-
         nomeado imediato da canhoneira Rio Lima  Vicente, Santa Helena, Cidade do Cabo, Lou-  né e em São Tomé (1890), Timor (1889, 1893 e
         que pertence à Divisão Naval da África  renço Marques, Ilha de Moçambique, Colom-  1895) e Macau (1880, 1884). Em períodos de cri-
         Oriental e Mar das Índias, o pomposo nome  bo e Singapura.            se, como foi, por exemplo, o que seguiu ao Ulti-
         agora dado à Divisão Naval da África Orien-  Chegado a Macau em 7 de Julho, é destaca-  mato e durante a chamada Guerra dos Boers. As
         tal. Parte para Moçambique, onde toma posse  do para a canhoneira Rio Lima onde assume  próprias Estações Navais de Angola e Moçam-
         do cargo; em 15 de Julho o navio larga para a  as funções de imediato; no final deste ano co-  bique têm de ser reforçadas com mais meios.
         Estação Naval de Macau. Fazendo escala em  nhece a chinesa Atchan, que será a sua com-  Também ocorrências internacionais obrigavam
         Dili, Timor, em Setembro, logo no mês seguin-  panheira e de quem teria dois filhos.  ao desvio dos parcos meios; em 1893 desloca-
         te a Junta Médica manda-o regressar a Portu-  Em 23 de Janeiro de 1889 larga para Timor  ram-se navios para proteger no, Rio de Janeiro,
         gal para tratamento.                                                             os nossos compatriotas quando
           No ano de 1886 é promovi-                                                      da revolta da esquadra brasilei-
         do a 1º tenente (30ABR) e, de-                                                   ra; para Tânger foram enviados
         pois de recuperado, é colocado                                                   navios em 1881 e 1897 e até para
         na corveta-couraçada Vasco da                                                    o Sião, onde em 1890 foi neces-
         Gama. Em 2 de Agosto, o rei                                                      sário socorrer o nosso cônsul e
         D. Luís parte, em visita de Es-                                                  os comerciantes nacionais que
         tado a várias Cortes europeias,                                                  ali se encontravam.
         a bordo da corveta Afonso de                                                       Em Março de 1890 Wences-
         Albuquerque escoltada pela                                                       lau de Moraes assume o co-
         corveta Estefânia.                                                               mando interino da canhoneira
           Em Agosto, o nosso biogra-                                                     Tejo e parte para Banguecoque,
         fado destaca para a canhoneira                                                   com a missão de prestar apoio
         Douro e no mês seguinte parte                                                    ao cônsul e à colónia portugue-
         para a Divisão Naval da África   Vapor Sena.                                     sa ali residente. É recebido pelo
         Oriental e Mar das Índias; segue                                                 irmão do Rei e regressa a Ma-
         a bordo o médico naval Sebastião Peres Rodri-  levando a bordo 19 presos implicados no as-  cau em Junho. Nesse ano fora nomeado mi-
         gues, que se tornará um dos seus grandes ami-  sassinio do Governador, comandante Lacerda  nistro da Marinha João Marcelino Arroio que
         gos. Em Janeiro de 1887, perante o aparecimen-  Maia, e que tinham sido levados para Macau  apresentou no Parlamento, mais um programa
         to de problemas fronteiriços, o navio parte para  a aguardar julgamento, por razões de segu-  de renovação da esquadra que também não
         Zanzibar e no mês seguinte a força portugue-  rança. Em Junho parte para o Norte da Chi-  passou de projecto.
         sa bombardeia e ocupa o Tungué. Em Março,  na e o Japão, ficando deslumbrado com este   Os navios da Armada eram ainda utilizados
         Wenceslau de Moraes comanda o desembarque  primeiro contacto com os nipónicos. Visita  no transporte da Família Real para cerimónias
         das tropas portuguesas em Palma, completan-  Kobe e Yokohama regressando a Macau, em  internacionais como as de 1886, em Inglaterra.
         do-se a ocupação do litoral Norte de Moçambi-  Dezembro, depois de o navio ter também fei-  O final deste ano e o início de 1891, é um
         que. Em Maio a Junta Médica manda -o regres-  to escalas em Nagasaky e Xangai. Segue-se o  período pleno de acontecimentos em Portu-
         sar, de novo, a Portugal.          seu destacamento para a canhoneira Tejo e  gal; a Inglaterra apresenta o seu famoso Ulti-
           Neste ano recebem-se os primeiros navios de  a redacção de um conjunto de contos como  mato ao Governo Português; é determinada a
         casco de aço, dando mais um salto tecnológico;  Questão de Beijos, a Outra Mamã, e O Rio Can-  livre navegação dos rios Zambeze e Chire nos
         eram mais leves, mais baratos, mais resistentes  tão que viriam a fazer parte da sua obra Traços  termos propostos pela conferência de Berlim
         e melhor adaptados aos climas tropicais. Segue-  do Extremo Oriente.  (18NOV1890); morre o famoso patrão de sal-
         -se o aumento ao efectivo de pequenas lanchas   A Marinha tem também de acorrer a situa-  va-vidas Joaquim Lopes (21DEZ1890) e em 31
         canhoneiras, para utilização fluvial e que vão  ções de emergência quando surgem aconteci-  de Janeiro de 1891 estala no Porto a Revolu-
         ser o elemento chave das operações da Arma-  mentos inopinados. Além de garantir a presen-  ção Republicana, duramente reprimida pelo
         da e da nossa penetração em África. Estiveram  ça em Angola e Moçambique, teve de enviar  governo. A Armada, deslocada em força para
         em todas as campanhas africanas de ocupação                           o Norte, fornece o local dos julgamentos, efec-
         e pacificação de 1887 a 1908, actuando como                            tuados a bordo dos navios, e transporta para
         apoio de fogo, base de operações de desembar-                         o degredo em África, os revoltosos condena-
         que, transporte de pessoal e material, patrulhas                      dos a esta pena.
         fluviais, centros de comunicações e até servindo                         O brio Nacional ofendido pelo Ultimato
         de hospital. São verdadeiros multiplicadores de                       Inglês, leva a uma alteração nos projectos de
         força económicos e eficazes quando em apoio                            renovação da Armada, que agora passam a
         de colunas terrestres, na maioria constituídas                        dar prioridade aos navios para a defesa do
         por tropas de recrutamento local.                                     Continente e surge uma grande subscrição
           Como afirma o Professor António José Telo                            nacional para a aquisição de navios de guerra.
         no seu volume da História da Marinha Portu-                           Mas, curiosamente, e devido aos problemas
         guesa (1824-1974) e passo a citar “É este o segre-                    com as operações de pacificação em África,
         do do sucesso das campanhas de pacificação portu-                      é neste período (1891-96) que se constroem
         guesas em África, feitas com meios muito menores                      mais lanchas -canhoneiras para utilização nos
         que os usados pelas restantes potências: a exploração                 rios africanos.
         da nova eficácia das pequenas unidades apoiadas pe-                      A Marinha representa, durante grande par-
         los contingentes recrutados localmente”.                              te deste período, maior contingente militar eu-
           Depois de 60 dias de licença da Junta de Saú-                       ropeu em África onde mantém, num esforço
         de Naval, Wenceslau de Moraes embarca no                              notável, mais de dois terços dos seus efecti-
         África, em 30 de Agosto de 1887 para uma via-                         vos em pessoal e a quase totalidade dos na-
         gem a Angola, escalando São Tomé, Santiago e                          vios operacionais.
         São Vicente. Em Janeiro do ano seguinte parte                           Em 1 de Março de 1891 nasce em Macau José
         para a Madeira transportando militares e em                           de Sousa Moraes filho de Wenceslau de Mo-
         Fevereiro é destacado para o Índia, fazendo o   Atchan e seus dois filhos vestidos de marinheiro.  raes e de Atchan; no mês seguinte (11ABR) ao
                                                                                       REVISTA DA ARMADA U JULHO 2004  19
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