Page 6 - Revista da Armada
P. 6

PONTO AO MEIO DIA

A Manutenção da Esquadra

Portugal tem hoje em desenvolvimen-              templadas desde o início. Nesse sentido,       dores de gestão e prioridades, e integrando
        to na sua Componente Naval do            numa perspectiva de eficiência, deve ser       as necessidades e perspectivas das diversas
        Sistema de Forças, um conjunto de        seguido o planeamento por capacidades.         entidades. A definição dos processos inter-
capacidades que concorrem para o produto         Destaco também a necessidade de prever         nos e o estabelecimento do mapa estratégi-
operacional da Marinha. A edificação e ma-       uma matriz de responsabilidades, tendo         co, aliados à gestão por projectos, são me-
nutenção dessas capacidades, consubstan-         sempre presente os custos ao longo do ci-      didas essenciais para planear e assegurar a
cia um expressivo investimento do Estado,        clo de vida. Cada uma das capacidades          sustentabilidade dos meios de acção naval
representado pela generalidade dos cida-         compreende um conjunto de elementos            no futuro, com os recursos disponíveis.
dãos, a que importa responder com eficácia,      funcionais, correspondendo a uma valência
reforçando, desde o início, o nosso compro-      específica, podendo e devendo contemplar          Com a decisão de reequipar a Marinha
misso na definição dos respectivos meios.        as interligações entre as estratégias de de-   com as fragatas da classe Bartolomeu Dias,
No caso da Marinha, o vector principal será      senvolvimento industrial e I&D de Defesa,      com os submarinos da classe Tridente, com
a sua esquadra.                                  no sentido de alargar a base de participação   os patrulhas da classe Viana do Castelo e
                                                 e divulgar o potencial e as oportunidades.     LFC, com as Viaturas Blindadas Anfíbias
    No contexto actual, pensar na manu-                                                         e outros projectos igualmente importantes,
tenção da esquadra leva-nos a uma dupla             Trazendo este conceito para a área da       está implícito que o país assumiu também
interpretação: manutenção como razão de          manutenção, surgem os elementos funcio-        o compromisso de assegurar o respectivo
existência e manutenção como acção de ga-        nais Material, Infra-estruturas e Pessoal. Na  ciclo de vida. Sendo um investimento, im-
rantir as melhores condições de operação. A      “capacidade” de reparação, a Direcção de       porta que seja rentabilizado e útil. De outra
primeira não pode estar em causa. A segun-       Navios, como direcção técnica e a sociedade    forma ficará em causa a manutenção da es-
da é consequência da primeira.                   Arsenal do Alfeite, SA, como executante, as-   quadra, no sentido de existência.
                                                 seguram uma parte substancial deste esfor-
    O Mar voltou a ter uma dimensão e um         ço. Esta parceria é um elemento novo, que         A definição, projecto, construção e inte-
potencial de riqueza que temos que apro-         não pode deixar de ser analisado e acompa-     gração dos meios navais é um processo pro-
veitar sem reservas. No entanto, a manu-         nhado.                                         longado, a que se segue uma vida útil de 35
tenção da esquadra, em ambos os sentidos                                                        anos. Assim, a edificação de uma Marinha
que referi, é motivo de grande preocupação.         Se pensarmos nas características dos        equilibrada e com capacidade de sustenta-
Assim, independentemente de estarmos             navios da esquadra em edificação e respec-     ção tem que adoptar um modelo linear de
em ciclo ou em contra-ciclo com um maior         tivos ciclos de manutenção previsíveis, o es-  gestão integrada de ciclo de vida. Depois
desenvolvimento do País, é certo que mui-        taleiro deve conseguir responder em simul-     de contratados, os programas não podem
tos dos navios estão no final da sua vida útil.  tâneo a um conjunto de acções de manu-         ser postos em causa. Só assim se conseguirá
Mas não é por isso que devem ser substituí-      tenção planeada (fragata, submarino, navio     uma redução substantiva nos custos glo-
dos. A lógica é a do equilíbrio e da interope-   patrulha oceânico, lancha de fiscalização,     bais.
rabilidade no planeamento e na materializa-      navio-hidrográfico e uma ou duas lanchas),
ção das capacidades, seguindo um modelo          além de uma margem de disponibilidade             Abordei agora o tema manutenção da
de gestão integrada do ciclo de vida.            para responder aos trabalhos eventuais e       esquadra, sem referir técnicas, sem questio-
                                                 urgentes. É certo que no presente não tem      nar as políticas de manutenção ou a nossa
    Em traços gerais, o ciclo de vida con-       existido capacidade financeira para assegu-    organização e o respectivo sistema de ges-
templa a integração de todas as actividades      rar as necessidades de manutenção da es-       tão. Falar de manutenção sem abordar estes
relativas à definição dos meios adequados        quadra e assim garantir a aquisição de ser-    temas, não é falar de manutenção, como não
ao cumprimento das missões. Começa na            viços ao estaleiro, mas torna-se vital manter  é manter a esquadra aquilo que cada vez
identificação da necessidade, que decorre        as capacidades e as valências identificadas,   mais nos é imposto através das constantes
das orientações estratégicas, das ameaças e      ou perder-se-á num minuto o que demorou        interrupções nos fluxos financeiros e cortes
dos conceitos de emprego e de operações,         décadas a construir. Exercendo a Arsenal a     orçamentais. Com certeza que só será pos-
respondendo a uma vulnerabilidade no             exclusividade que lhe foi atribuída por con-   sível controlar os efeitos provocados pela
Sistema de Forças. Chegando aqui, inicia-        cessão, tem forçosamente que adaptar a sua     insuficiência de verbas durante um período
-se o processo de formulação dos requisitos      organização de trabalho à Marinha, bem         de tempo limitado. De imediato teremos
operacionais, cuja interpretação permite es-     como manter práticas e custos regulados        mais períodos de indisponibilidade. A mé-
tabelecer os correspondentes requisitos téc-     pelo mercado e por uma entidade externa.       dio prazo haverá menor fiabilidade global,
nicos ou mesmo apontar soluções adequa-                                                         bem como uma redução das capacidades
das e sustentáveis, conduzindo à definição          A abordagem de ciclo de vida, aliada à      das unidades combatentes caso não sejam
da plataforma a desenvolver ou a adquirir.       redução dos recursos disponíveis e a alte-     modernizadas. A longo prazo, todo o esfor-
Depois da recepção e integração, segue-se a      rações organizacionais, obriga também a        ço colocado na sua edificação será posto em
fase de exploração operacional e … o abate.      uma redefinição e adaptação dos processos      causa, anulando os ganhos de produtivida-
Em poucas palavras, a abordagem de ciclo         e ao alinhamento de objectivos entre todos     de que temos vindo a conseguir.
de vida inclui as actividades desde a con-       os grupos de interesse. Nesse sentido a
cepção ao abate.                                 Direcção de Navios tem assumido o pro-            Sabemos e queremos fazer melhor.
                                                 tagonismo na adopção de ferramentas de
    Mas para que haja articulação no pro-        planeamento, de gestão estratégica e de uni-                                   J. Garcia Belo
cesso, todas as vertentes relacionadas com a     formização de requisitos, definindo indica-                                     CALM EMQ
sustentação têm que estar pensadas e con-

6 ABRIL 2011 • REVISTA DA ARMADA
   1   2   3   4   5   6   7   8   9   10   11