Page 15 - Revista da Armada
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                                                                                       No Monte Santo,
                                                                                       junto ao convento
                                                                                       das Mónicas,
                                                                                       vendo-se a  empena
                                                                                       de uma torre
                                                                                       das ruínas do convento
                                                                                       de Sto. Agostinho
                                                                                       e a pequena igreja
                                                                                        de Sto. António.
       damente  o  edifício.  É  por  isso  que  as  ruínas  duram   Mas  nem  só  quando  se  ergue  em  pedestal  magnífico
        pouco  na  Índia;  ou  se  acautelam  e  mantêm,  ou  ficarão   tem  a  cruz  maior  beleza.  Vemo-la  igualmente  bela  em
        reduzidas a escombros escondidos entre mata densa.   pedestais  singelos,  sublime  na  sua  humildade,  à  beira
        Na  Índia,  a  cruz  é  o  emblema  necessário  ao  cristão  e   de uma estrada como a de Bambolim, ou de um rio como
        vemo-la  no  muro  do  pátio  de  cada  casa  como  afirma-  em  Tiracol  ou  Alorna.  Abençoando  na  sua  rusticidade
        ção  de  crença  e  penhor  de  protecção.  Ela  distingue-o,   a  solidão  dos  campos,  ergue-se,  no  alto de Chicalim,  um
        da  mesma  forma  que  o  vaso  com  o  {ulôsse,  à  porta  de   pequeno  cruzeiro,  tocante  na  sua  simplicidade,  de  de-
        casa, distingue  o  hindu.                          senho  ingénuo  mas  belo.  Outras  vezes,  a  cruz  penetra
        I
        Pelo  Natal,  a  maioria  dos  cruzeiros,  onde  quer  que  se   na  água,  como  em  Ribandar,  frente  ao  hospital,  onde
        ergam,  branqueja na  noite,  à  luz  vaga das  velas com  que   a  benção  desce  sobre  o  Mandovi.  E .por  toda  a  terra  de
        a devoção popular os  alumia.  Na noite de Natal, em geral   Goa,  desde  a  fronteira  até  ao  mar,  a  cruz  estende  os
        calma  e  fresca,  quem  passe  pelas  estradas  encontra   seus braços.
        a  cada  passo  esses  tocheiros,  tremeluzindo,  que  deixam   Em  Damão  já  assim  não  é.  Lá,  a  tradição  do  cruzeiro
        na  alma  o  conforto  de  uma  espécie  de  presença  amiga.   não  ganhou  raízes.  As  suas  igrejas,  conventos  e  ruínas
        À  luz  vaga  das  velas,  os  cruzeiros  de  Goa  adquirem   sacras  não  têm  esse  adorno.
        uma  beleza  especial.  De  dia,  quando  o  sol  lhes  bate em   Em  Diu,  ainda  que  pouco  arreigada,  a  tradição  do  cru-
       cheio,  cada  recorte,  cada  pormenor  da  arquitectura,  é   zeiro  existe.  Podemos  ver  um  dos  mais  belos  exemplares
        valorizado  pela  sombra,  sobressaindo  com  toda  a  ni-  frente  à  Sé  de  Diu,  todo  rendilhado,  de  soberbas  e  ele-
        tidez  o  seu  rendilhado  soberbo,  éomo  a  imponente  cruz   gantes  colunas,  com  um  misterioso  toque  de  qualquer
        de  Goa,  em  frente  à  Igreja  e  Convento  de  S.  Francisco,   coisa que nos lembra os jardins árabes.
        em  Velha Goa.  Essa cruz  enorme, sem emendas;  talhada   Mais  singelo  e  de  m~nor beleza,  o  que  fica  no  adro  da
        dum  só  bloco,  deve  ser  coisa  rara,  dadas  as  suas  di-  Igreja  de  S.  João  de  Deus - estropiado  por  plantas  da-
        mensões.                                            ninhas  e  sangrando  na  sua  desequilibrada  cruz  de
        A  caminho do  Monte  Santo,  em  Velha  Goa,  cada curva   cimento,  onde  o  ferro  espreita  na  chaga  aberta  pelo
        tem  o  seu  cruzeiro,  que  espreita  entre  ruínas,  dando  à   tempo - é  bem um  símbolo de  luta ... Oxalá possam durar
        paisagem  o  ambiente  dolorido  de  calvário.  É  esse  o  as-  e  permanecer  através  das  vicissitudes  dos  tempos  os
        pecto  que  se  descortina  da cruz  que  se  er.gue  em  frente   cruzeiros do Estado  Português  da  Índia.
       do Convento das  MÓnicas.                                                                      O.  Lemos
                                                                                                            13
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