Page 320 - Revista da Armada
P. 320
boa 29 pessoas com este apelido. Pertenceu a esta fa- De referir que o irlandês João Milley Doyle fez em
mília um oficial de Marinha que serviu no iate real 1824 uma proposta ao governo de D. João VI para o
iiAmélia!! e pediu a demissão após a proclamação da estabelecimento da primeira linha de navegação, a
Republica(l). Um outro oficial de Marinha membro vapor, entre o Norte da Europa e o Mediterrâneo, ten-
desta família prestava serviço no Comando da Defesa do pedido o privilégio de durante catorze anos os na-
Marítima de Faro quando o dr. John Ireland esteve vios desta carreira não pagarem direitos no porto de
em Portugal. Embora o desejasse, não póde contactar Lisboa. Comenta o dr. John Ireland que a companhia
com ele (2). britânica P. & O. fez uma fortuna com a exploração
Outro irlandês que serviu na nossa Marinha foi desta carreira que estendeu atê à Índia, pelo Canal de
Gabriel Fallon que esteve embarcado durante muitos Suez.
anos nas frotas do Brasil e sofria de moléstias adquiri- Curiosamente, das averiguações por ele feitas no
das a bordo (escorbuto e reumatismo). Arquivo Geral da Marinha, consta que seis indivíduos •
Mac Donogh, oficial de origem irlandesa, estava juraram perante os Evangelhos, em 9 de Dezembro
embarcado na fragata ii Rainha de Portugal!! que to- de 1835, que Marcus O'Dalhunty tinha nascido na Ir-
rnou parte na batalha do Cabo de S. Vicente, em 5 de landaem 17 de Março de 1817. Este tinha o curso ma-
Julho de 1833, contra os miguelistas, tendo morrido temático da Academia Real de Marinha e pretendia
em combate. Foi prometida uma pensão de 90 libras ser nomeado aspirante da nossa Armada, mas tinha
a sua mãe que esta requereu lhe fosse paga. demasiada idade, pelo que pediu dispensa do limite
Um irlandês pediu o comando duma canhoneira de idade à rainha D. Maria n.
durante a Guerra Peninsular, para defender o porto De salientar que num recente artigo publicado no
de Lisboa contra os franceses, mas apenas lhe foi (1lrish Times», em 2 de Janeiro de 1986, mais uma vez
dado o encargo de transportar para Inglaterra um o dr. John Ireland se refere ao nosso país com simpa-
grupo de freiras 1 tia e recorda episódios mais importantes da nossa
O capitào-de-mar-e-guerra Mac Douell, de origem história, a propósito da entrada de Portugal na CEE.
irlandesa, comandou a pOderosa esquadra que o mar- Numa carta que nos escreveu, informa que espera
quês de Pombal mandou concentrar em 1776 no sul voltar ao nosso país no próximo ano para continuar a
do Brasil, para a reconquista do Rio Grande. Numa estudar as relações entre a Irlanda e Portugal.
acção contra os espanhóis, tomou uma nau que Ficamos a aguardar com curiosidade o resultado
levou para o Rio de Janeiro. das suas indagações nos arquivos do nosso país!
(I) Segundo-tenente Hugo O'Nelli. Henrique Alexandre da Fonseca,
e) Ca.pitlio·tenenteJosé Carlos de Moura O'Nelli. cap.-m.-g.
Virar de querena
uando hoje vemos um navio em doca seca ou flutuante provocava um grande esforço no costado. Para evitar danos
ou empoleirado num plano inclinado para limpeza do deste tipo usou-se virar o navio de querena. Nesta manobra,
Q fundo ou fabricos nas suas obras vivas, esquecemos o navio era inclinado sobre um dos bordos, usando para o efeito
que até ao século XIX, nem sempre foram estas soluções utili- uma barcaça que, por meio de aparelhos de força, puxava pe-
zadas. tas mastros do navio até descobrir a quilha. Também se dizia
De facto, o processo mais antigo a que se recorreu para se que o navio deu lados reais ou simplesmente lados, quando
efectuarem os trabalhos atrás referidos, consistia em varar a o casco era virado mais ou menos, sem chegar a descobrir a
embarcação ou o navio numa praia, de preferência em maré de quilha. Nestes casos, mas especialmente quando o navio vira-
águas vivas, o que acontece de quinze em quinze dias. Deste va de querena, era indispensável que a operação se fizesse em
moela, conseguiam-se perioelos em que o navio se encontrava águas calmas, de preferência em doca de abrigo para evitar
total ou parcialmente em seco, podendo-se, nestas condiçôes, que o jogo entre o navio e a barcaça produzisse qualquer ava-
realizar os necessários fabricos. Varar ou darquerena são dois ria. E mais, calafetar bem as escotilhas, para que a água não
termos diferentes usados para significar encalhe intencional. entrasse para o intenordo navio.
Diz Frei Gaspar da Madre de Deus: Se as naus entrassem pela A mais antiga descrição, que conhecemos em língua portu·
Barra Grande (. .. ) ali mesmo as haviam de varar; (...) nem é ve- guesa, dos preparativos e manobra desta operação encontra·
rosrmel que as varassem em lugar tão remoto do ancoradouro -se num manuscrito, possivelmente do século XVIII, intitulado
(. .. )e); afirma João de Barros: deu Querena à caravela e o "Marinheiro Perfeito", proveniente da Biblioteca da Casa de
depois, de espalmada e), começou a fazer seu caminho e). Palmela(4).
Com navios de dimensões apreciáveis, o procedimento que O processo foi usado durante grande parte do século XIX,
acabamos de descrever não era aconselhável, especialmente pois apesar de existir um dique no Arsenal da Marinha este teve
quando tinha de se inclinar o navio sobre um dos bordos para longos períodos de inoperosidade(5). Entretanto foram sendo
permitir o trabalho na quilha ou nas tábuas junto a esta, pois
(.) Biblioteca Central da Marinha. Cota ROd 50 t.
CJ wMemórias da Capitania de São Vicente hoje chamada dtj (5) De facto, o dique do Arsenal da Man·nha. construfdo no fim do
S. Paulo, do Estado do Brasil ... edição de 1797, pág. 127. sécuio XVIII esteve completamenle inoperante de IS07 a 1850, e só
eJ Espalmar: limpar e beneficiara fundo do navio. a partir de 1877 passou a ser uma instalação verdadeiramente. eficien-
el "Asia~, edição de 1945,ldécada. Livro I. cap. VI, pág. 32. te. Esclarecemos o leitor que o dique do Arsenal da Mannha fOI a única
30