Page 229 - Revista da Armada
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mSTÓRIAS DE MARINHEIROS
112 - O mar e o vento
ara 05 que não se recordem bem
da tragédia shakespeariana Otelo
P pennita-se que, em breves traços,
se relembrem os passos fundamentais da
peça.
Era Oleio um general mouro, ao
serviço de Veneza. Vitorioso em muitas
batalhas, o seu prestígio subira alto.
Barbâncio, alto dignatário da repú-
blica. tinha uma filha. Era Desdémona,
senhora de rara beleza. Vinuosa. de uma
brancura imaculada, apaixonou-se per-
didamente pelo negro. Tão louca se IOr-
nou que, cena da oposição do pai, cioso
d!l sua raça, fugiu de casa para os bra-
ços de Otelo.
Tinha este, Cássio por ajudante, que
promovera a tenente. Era um carácter
puro de soldado fiel.
Vago. um alferes, que pretendia o
lugar, não gostou. Assim se lhe cresceu
no peito um ódio torpe. Ardiloso, jurou
no íntimo vingar-se de Otelo.
En este, por natureza, de carácter
sereno. Certo do seu valor. seguro do
amor fiel de Desdémona, que tudo lhe
sacrificara. antevia uma vida feliz. E as·
sim teria sido decerto, não fora Yago,
~e cedo começou a entrete<:er a sua teia.
Hábil, pouco a pouco foi semeando, na
credulidade ingénua de Otelo, indicios de
que Desdémona se tomara amante de \\
Cássio. Conseguiu mesmo promover um
connito que contrapôs Cássio a Rodrigo
- este um velho apaixonado de Desdé- d.""~A.-.d
mona. Para isso, teve artes de embria- .. ,
gar O tenente, habirualmente sóbrio, num
dia em que ele estava de serviço. Otelo, herdara da mãe. Dissera-lhe que não o esposo, o comprometimento de Des-
rigoroso quando soube, despromoveu-o. perdesse. Num velho sortilégio, o des- démona.
Vago. rejubilou. Era uma primeira vi- cuido traria desgraça. Mas Desdémona, Otelo, sempre tão calmo, embrave-
tória, mas ainda longe do objectivo final. um dia, menos atenta, deixou·o cair. ceu. A mágoa de urna traição evidente
Logo insinuou a Cássio que só lllT8vés Emma, mulher de Vago, foi quem o en- cresceu-lhe no peitO, em ondas temero-
da influ!ncia de Desdémona conseguiria controu, perdido. Recolheu-o, na inten- sas. E a sua condição de negro mais o
ser perdoado. E ela, bondosa, fazendo ção de o devolver. Mas Vago, não con- exasperava.
bom conceito do tenente, procurou in- sentiu. Arrebatou-lho das mãos e, astu· Umn noite, não se dominou: asfixiou
fluir o marido. Mas este, já envenenado tamente, pô-lo no quarto de Cássio. Uma Desdémonn, no leito comum, com uma
por Vago. via em cada diligencia dela a prova concludente, nfinal, do encontro almofada.
prova repetida da sua ligação 3 Cássio. íntimo de Desdémona com Cássio. Porém, a verdadeira inocência de
O último elemento condenatório veio Vago, maldoso, informou Otelo. Desdémonn veio ao de cima. E Otelo
de um lenço perdido. Desdémona interrogada pelo mouro, não certo, por fim, da fidelidade da esposa.
Otelo oferecera a Desdémona, numa conseguiu, naturalmente, npresentar o num arrependimento tardio e sem rem~
primeira prenda. um lenço bordado, que lenço. Radicou-se, nssim, no espírito do dio, apunhalou-se e morreu.
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