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Património Cultural da Marinha
             Património Cultural da Marinha


                                          Faróis de Portugal





                  8. FAROL DO CABO DE SÃO VICENTE


                  A Fortaleza do Cabo de S. Vicente é uma construção do séc.   relho hyperradiante do ultimo systema adoptado de 2,66m de
                 XVI, com reedificações nos séculos XVII e XVIII.   diametro interior com clarões rapidos muito poderosos, armação
                  Consta que em 1520 existia já uma luz, “um pequeno Pharol,   e  pivot e  fluctuador  de  mercurio que dará satisfação à nave-
                 naturalmente muito rudimentar,  em uma torre especial do con-  gação tão importante n´aquele ponto e obstará ás observações
                 vento da primeira capucha de S. Francisco, que o bispo do Algar-  pouco lisonjeiras que se notam nos livros de navegação”.
                 ve D. Fernando Coutinho, fundara no Cabo de S. Vicente”.   Em 1897, dadas as precárias condições de conservação do fa-
                  Segundo Frei de Monfort, na sua Crónica da Província da Piedade   rol e o consequente fraco rendimento da luz que suportava, ini-
                 “a torre serviria aliás ao refugio dos frades que habitavam o conven-  ciaram-se trabalhos de desmontagem da lanterna existente e de
                 to, quando um dia foram atacados por soldados e marujos luteranos,   obras profundas de beneficiação e restruturação, que incluíram
                 conseguindo salvar a relíquia de S. Vicente. O mesmo cronista refere   alterações na torre, acabando esta por ser alteada em 5,70m.
                 ainda que por isso mandou D. João III fazer                   Em 25 de Março de 1908, concluídas
                 uma torre mais avantajada e mais forte para                 as obras, o farol começou a funcionar
                 resguardo do convento(...)”.                                com o aparelho hiper-radiante. Com
                  Não foram, no entanto, estas obras su-                     efeito, foi instalado um aparelho lenti-
                 ficientes, pois em 1587, o corsário Fran-                    cular de Fresnel de 1330mm de distân-
                 cis Drake, tomou de assalto o convento,                     cia focal – o que lhe confere a categoria
                 com tal violência que acabou por destruir                   de hiper-radiante, actualmente a maior
                 a torre. Em consequência, o farol mante-                    óptica que existe nos faróis portugueses
                 ve-se apagado até 1606, altura em que                       e um dos dez maiores do mundo, con-
                 Filipe II de Portugal  terá ordenado a res-                 sistindo em três painéis ópticos de 8 me-
                 tauração da torre.                                          tros quadrados com 3,58m de altura, flu-
                  O farol do Cabo de São Vicente, tal e                      tuando em 313 kg de mercúrio. A fonte
                 qual como hoje existe, tem o nome de                        luminosa instalada, era um candeeiro de
                 D. Fernando e foi mandado construir por                     nível constante de 5 torcidas, passando,
                 D. Maria II, tendo a comprová-lo uma lápi-                  anos mais tarde, a funcionar com a in-
                 de que lavra: “Este farol foi mandado cons-                 candescência pelo vapor de petróleo. A
                 truir por ordem da Snra.  D. Maria II sendo                 rotação da óptica era conseguida através
                 Dir. dos faróis do Reino o Brigadeiro Gen.                  de um mecanismo de relojoaria.
                 A.C.C.P. Furtado em Out. de 1846”.                            A característica luminosa, conforme
                  O farol entrou em funcionamento em Outubro de 1846. Inicial-  reza o Aviso aos Navegantes da época, era constituída por cla-
                 mente foi equipado com um aparelho catóptrico e de acordo com   rões brancos sucessivos de 5 em 5 segundos, rotação em 15
                 registos mantidos, a primeira característica luminosa da luz era   segundos e o alcance luminoso rondava as 33 milhas.
                 “branca de rotação completa apresentando eclipses de 2 minutos   Em 1914 foi instalado um sinal sonoro.
                 e clarões de 2 segundos nos intervalos, fornecidos por 16 candieiros   O farol foi electrificado em 1926 com a montagem de mo-
                 do Dr. Argand com reflectores parabólicos de cobre galvanizado   tores geradores, passando a utilizar como fonte luminosa, a
                 a prata (...). A iluminação é de azeite em geral de má qualidade o   incandescência eléctrica.
                 que obriga os pharoleiros a espevitar os candieiros 4 vezes durante   Em 1947, através da aplicação de painéis destinados a de-
                 a noite.». A rotação deste equipamento era produzida por um me-  flectir a emissão luminosa, tornou-se um farol aeromarítimo
                 canismo de relojoaria e o alcance luminoso rondava as 6 milhas”.  – uma exigência da navegação aérea durante o período da
                  O farol permaneceu votado ao abandono durante largos anos,   2ª guerra mundial. Um ano mais tarde, foi electrificado com
                 tendo mesmo atingido um estado deplorável, conforme consta   energia da rede pública.
                 de registos de 1865:                          Em 1949, foi montado um radiofarol que se manteve em
                  “... no edifício entra a água da chuva por toda a parte (...) a va-  funcionamento até 2001, sendo então desactivado por deixar
                 randa de ferro em roda da lanterna e os gatos que prendem a can-  de ter interesse para a navegação – cumprindo com a política
                 taria, acha-se tudo oxydado e carcomido (...). Na lanterna contei   de radionavegação do nosso país e também, a exemplo do que
                 setenta vidros partidos (...) os reflectores dos candieiros acham-se   sucedeu com a maior parte dos países de todo o mundo, que
                 mal limpos (...). (...) as espias e varanda estão em tal estado que   extinguiram os seus radiofaróis.
                 é necessário segurá-las por meio de bocados de arame e cordas   O farol foi automatizado em 1982 e dotado de diversos au-
                 tornando por esse efeito a limpesa exterior dos vidros da lanter-  tomatismos, possibilitando-lhe a partir de então, controlar à
                 na perigosa e quase impossível (...). Enfim, tudo ali se conspira   distância o farol de Sagres. Já em 2001, foi instalado um autó-
                 contra o efeito que devia produzir a iluminação d’este pharol, a   mato programável para a rotação da óptica.
                 que na primitiva se dava 30 milhas de alcance, quando hoje não   A dimensão e beleza do farol e a importância estratégica
                 offerece mais do que 16 milhas e bem pouco esplendor no inter-  do local, que atrai milhares de visitantes por ano, ditaram que
                                               valo dos eclipses.   a Marinha aproveitasse para nele instalar um pólo museoló-
                  Local:   Cabo S. Vicente     (...) à vista do que   gico e criar condições de acolhimento do público, que assim
                  Altura:  28 m                acabo de expor   poderá conhecer a sua história, modo de funcionamento, e
                  Altitude: 86 m               torna-se da maior   obser var de perto toda a imponência de uma óptica que, não
                  Luz:     Fl W 5s             urgencia a trans-  só continua a prestar um bom serviço aos navegantes, mas
                  Alcance: 32 M                formação dos   também se constitui como uma peça digna de realce do Patri-
                  Óptica:   Hiper-radiante 1330 mm  apparelhos actu-  mónio da Marinha.
                  Ano:     1846                almente colloca-
                                               dos por um appa-                            Direcção de Faróis
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