Page 224 - Revista da Armada
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Terrorismo
Terrorismo
em Âmbito Marítimo
em Âmbito Marítimo
CONTRIBUTOS
s tempos mudaram, de facto, pro- te, ao nível da desmotivação económica Eis um exemplo no qual os modernos
fundamente, para os navios de para os agentes e operadores industriais e Estados de Direito têm que exercer uma
Otransporte e circuitos oceânicos comerciais, e ao nível dos elevados pata- opção. A questão de, sem cair num secu-
mundiais, na ressaca dos atentados do mares de investimentos que a gestão por- ritarismo primário, como saber calibrar a
pós-11SET, conforme alertou recentemen- tuária envolve e permanentemente exige. questão superior da Segurança com as ga-
te, Frank J. Gonyor, na segunda reunião Até no quadro do Médio Oriente, região rantias jurídicas das sociedades.
anual do Corporate Council on Africa´s Oil onde as rotinas - conhecidas - de opera- No referente aos Estados Unidos, os na-
and Gas Forum, Hostoun/Texas. Na sua ções não são de tal tipologia, se assiste, já, vios que se recusarem a observar os novos
conferência sublinhou, especialmente, os a intervenções em sede portuária como a normativos-standard terão, ao que se sabe,
acrescidos impactes que a questão de segu- ocorrida em Israel em 14MAR2004, onde 90 dias para cumprirem as exigências, ou
rança dos navios petroleiros e de transpor- foram detectadas três explosões despole- enfrentarão as consequências da sua não
te de gás e químicos têm ao nível daquelas tadas por brigadas palestinianas num por- observância, nomeadamente a não permis-
indústrias e a elevada sensibilidade que to de mar, o que (re)criou, nos imaginários são, definitiva, de entrada em portos ame-
os meios navais, pelas suas características dos estrategas, novas linhas de confronto ricanos. E a questão de tal foro para as au-
específicas, comportam em termos de se- e de defesa. toridades americanas é, notoriamente, de
curity (1). Recordou, circunstanciando, As novas exigências internacionais esti- sensibilidade máxima, mesmo ao nível dos
o caso do petroleiro francês Limburg no puladas pela IMO, designadamente atra- impactes que a geomorfologia comercial
Mar Arábico, a 6OUT2002, o qual sofreu vés do ISPS Code, pretendem diminuir, implica para as novas realidades. Portos
um ataque de uma pequena embarcação entre outros aspectos, a possibilidade da como Houston, por exemplo, cuja exten-
armadilhada com explosivos, tendo cau- ocorrência de intervenções – ataques – são de 85 Km (!), que o coloca como o sexto
sado graves consequências ao navio, de- contra navios e instalações portuárias. A maior porto do mundo, foram especifica-
signadamente explosões, incêndios e um leitura das disposições preambulares da mente desenhados para cativar operações
buraco na estrutura do seu duplo casco. O Comunicação da Comissão ao Conselho, comerciais e permitir um elevado fluxo de
derrame para o Golfo de Aden estimou-se ao Parlamento Europeu e ao Comité Eco- actividades, não tendo criado, como tal,
numa quantidade correspondente a 90.000 nómico e Social Europeu e ao Comité das quaisquer tipos de obstáculos estruturais
barris de crude. regiões, de 2MAI2003 é, a esse título, erudi- de fundo. A edificação de cercas, barreiras
O que vem suscitando maiores receios ta, enunciando, claramente, a panorâmica de retenção, sistemas de pórtico, postos de
nas comunidades da indústria marítima, das ameaças potenciais e o peso do trans- observação e vigilância, e redes de comuni-
em geral, é o diferenciado número de porte marítimo no total das transações cação e troca de informação, são, de entre
operações que uma superestrutura como comerciais da UE (2). Os normativos que alguns outros, formatos de exercer novas
um petroleiro envolve. A entrega, carga, determinam a existência de um sistema vias de controlo portuário. A dados mera-
descarga, os vários tipos de estiva, todo o de identificação automática (localização), mente económicos, ou económico-logísti-
tipo de operações portuárias que a entra- e, para os grandes navios, um registo (sis- cos, o que se poderá reter é que o impa cte
da e saída do navio implica, entre outros tematizado) de todos os movimentos, por- ao nível da operação do shipping será, cer-
graus de apreciação casuística que se po- tos praticados e cargas transportadas e da- tamente, enorme. A co-relação, quase or-
dem ter, remetem-nos para uma análise dos da sua propriedade, contribuirão, de gânica, entre as autoridades portuárias e
que não está, somente, ao nível dos mares sobremaneira, para aqueles objectivos (3). as estruturas de polícia e de polícia crimi-
oceânicos e da segurança em alto mar (ou Especificamente em relação à propriedade nal é, assim, imprescindível, tornando -se
em áreas jurisdicionais mais afastadas da dos navios e das cargas, importa, cada vez igualmente fulcral fechar os circuitos de
costa) mas, sobretudo, dir-se-ia, cada vez mais, conhecer dados mais concretos sobre informação com as autoridades que de-
mais em âmbito portuário, até pelo eleva- as companhias proprietárias, armadores e têm poderes ao nível do acesso e saída do
do impacte que uma acção em tal cenário constituição dos accionistas das socieda- porto, e bem assim, a capacidade de deter,
pode criar. Os Estados costeiros e aqueles des, e respectivos objectos sociais. A difi- juridicamente, um navio e/ou a sua ope-
que, por razões de morfologia marítima culdade de aceder a tais informações po- ração económica.
e/ou comercial, têm uma costa semeada derá, quase determinantemente, esbarrar Adaptado à realidade portuguesa, e
de portos – alguns de grande dimensão nalguns dos interesses da indústria marí- como de algum forma se deixa transpa-
– estarão, assim, na primeira linha dos tima (publicitação de informação empre- recer no anteprojecto de diploma legal
riscos. As enormíssimas repercussões que sarial de carácter sigiloso) e, ainda, em que visa receber a Directiva 2002/59/CE,
um atentado terrorista a um superpetro- questões mais do foro jurídico-filosófico do Parlamento Europeu e do Conselho,
leiro ou a um supergraneleiro teriam na como a privacidade de dados reservados, de 27JUN (e longinquamente da Directi-
economia, aferida em termos regionais e ou mesmo a liberdade de operação priva- va 93/75/CEE, do Conselho de 13SET, e
mundiais, não ocorre, somente, a um nível da. Encontra-se incrustada uma cultura de suas alterações), os inter-relacionamen-
de intervenção dos planos de contingência confidencialidade que terá que ser modifi- tos da triologia que tem competências em
(hiperdepartamentalizados como teriam cada, tal como adianta Gonyor. A seguran- matérias de exercício de autoridade do
que ser, desde a Defesa Nacional, Admi- ça tem que ser profiláctica e não reactiva, Estado, a Administração Marítima, e Auto-
nistração Interna, Negócios Estrangeiros, acrescentamos. É, forçosamente, uma ac- ridade Marítima e as autoridades portuárias,
Obras Públicas, Ambiente, até à Saúde, tividade contínua e mandatória. Exercida decifram, já, alguns mecanismos impres-
entre outros). Ocorre, fundamentalmen- com confidencialidade e serenidade. cindíveis à adopção de soluções que tor-
6 JULHO 2004 U REVISTA DA ARMADA