Page 243 - Revista da Armada
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NAVIO ALMIRANTE AO FUNDO!
NAVIO ALMIRANTE AO FUNDO!
O ção de modelos com que ensaiava esse tipo
jornal Le Temps, de Genebra, no dia profundidade. Todavia, considerando que os navios. Na sua camarinha, havia uma colec-
21 de Maio do ano passado, publicou 140 metros ultrapassam largamente a sua ca-
pacidade de mergulho e sabendo que Mark de exercícios. Neste contexto, foi autor de um
uma notícia que vai espantar os leito-
res desta Revista. Nela se fala dum tal Christian Ellyat tinha acabado de pulverizar o recorde código de sinais, conhecido pelo Sistema T. A.,
Francis, homem de negócios libanês que, nas do Mundo de mergulho atingindo 313 metros, que, na sua opinião, era indispensável quan-
horas livres, é um apaixonado pelo mergulho. desafia-o para participar na operação. do o código de sinais da Navy se tornava in-
Por esta razão, a Universidade americana de Começa então a prospecção com a ajuda do suficiente. Tryon considerava ainda que aque-
Beirute, em 1996 andando empenhada no sonar, mas não encontra mais do que “um vas- le seu sistema de sinais dava maior iniciativa
estudo dos “buracos azuis”, essas formações to deserto de lodo uniforme”. Um dia, porém, aos estados-maiores e aos comandantes dos
geológicas submarinas, donde saem potentes surge uma situação que intriga estes pesquisa- navios. Todavia, o jornal The Times, criticou
geysers de água doce, convidou o Sistema nos seguintes termos:
Christian a efectuar mergulhos “pouco firme em teoria e perigo-
tendo em vista topografar algu- so na prática”.
mas daquelas formações geoló- Relendo os comentários dos
gicas. O pescador que o leva ao seus contemporâneos, percebe-
local, fala-lhe do naufrágio de um se que Tryon gostava de desafiar
grande navio de guerra inglês, pa- a inteligência e a perspicácia dos
rece-lhe que tinha o nome Victo- seus subordinados. E, apesar de
ria e que, há muitos anos, se tinha Tryon não conseguir encantar os
afundado ao largo de Tripoli. Uma camaradas mais antigos, parece
história que, como tantas outras, não haver dúvidas de que exercia
foram passando de geração em um formidável poder de sedução
geração, entre os pescadores da- sobre os seus subordinados.
quele porto. No dia 22 de Junho, a esqua-
Christian entusiasma-se pelo as- dra do Mediterrâneo – que era a
sunto e percorre o caminho cer- mais poderosa força naval inglesa
to para o sucesso. Vai ao Museu Fotografia subaquática do Victoria, onde se vêem os hélices. – deixou Beirute, capital do Líba-
Nacional de Greenwich e, logo no, para se dirigir a Tripoli, no nor-
ali, tendo acesso ao processo do Conselho de dores entusiastas: uma estrutura parece flutuar te deste mesmo país, onde ia fundear. O mar
Guerra que se seguiu ao desastre do Victoria, entre duas águas. Incrível! Assim, nesse memo- estava calmo. A esquadra era constituída por
descobre a correcta posição do local onde o rável 22 de Agosto de 2004, Christian e Mark onze unidades, dos quais oito eram navios de
navio se afundou nas proximidades de Tripoli e descobrem, a 77 metros de profundidade, uma linha couraçados. O vice-almirante Sir Geor-
140 metros de profundidade. Entretanto, como imponente massa, onde se destacam dois héli- ge Tryon, comandante-em-chefe, ia embarca-
manifestação de pesar pelos 358 membros da ces. Estão perante a estrutura do Victoria. Nem do no Victoria.
guarnição desaparecidos nesse naufrágio – se- mais nem menos! O navio, tal como se afun- Naquele dia, por volta das 14.00 horas,
guramente o mais tremendo desastre sofrido dou, mantivera-se na posição vertical cento e Tryon deu conhecimento a Archibald Bourke,
pela Marinha Inglesa em tempo de paz – visi- onze anos! E, como o fundo é de lodo – uma comandante do navio, e ao chefe do seu esta-
ta o cemitério da Marinha Inglesa em Tripoli, massa sem consistência – esta estranha posição do maior, que iria alterar a formatura para duas
que tem o nome de Victoria como o navio per- foi, seguramente, conseguida, porque a proa do colunas afastadas de 6 amarras (isto é 1.200
dido, e ali deixa no livro de ouro, o seguinte navio entrou, milagrosamente, numa fenda do jardas) ficando os navios, em cada coluna, à
prenúncio: “I will bring HMS Victoria back to fundo rochoso. Disparam a máquina e conse- distância de 400 jardas. Nas proximidades de
memory, diving”. guem a mais insólita e inesperada fotografia da Tripoli, inverteria o rumo, inward, isto é, para
Christian começa, então, uma longa e meti- milenária história dos acidentes marítimos. dentro das colunas. Depois diminuiria o afas-
culosa preparação deste seu projecto. Demora Em 1893 a Grã-Bretanha mantinha no Me- tamento das colunas para 400 jardas e, final-
anos. Até que se decide em Março de 2004. diterrâneo uma importante esquadra, coman- mente, rodando a esquadra 90º conjuntamen-
Obtém fotos do Victoria para se familiarizar dada pelo vice-almirante Sir George Tryon, te, fundearia em frente de Tripoli.
com a sua estrutura. No que respeita às carac- embarcado no Victoria, um couraçado com O chefe do Estado-Maior do almirante Tryon
terísticas deste couraçado, sabe que foi cons- as características que já referi. e o comandante do navio chamam a atenção
truído nos estaleiros da Armstrong Whitworth Sir George Tryon era muito considerado nos do comandante-em-chefe para o facto de con-
& Co. Ld., em Newcastle-on-Tyne. meios navais. No seu tempo, dizia-se que, ha- siderarem que a distância mínima entre as co-
O navio de 104 metros de comprimento, via oitenta anos – certamente para usar como lunas deveria ser 8 amarras (1.600 jardas) em
deslocava 11.020 toneladas e a sua artilharia referência o grande Nelson – que não existia virtude do diâmetro táctico dos navios ser da
principal constituída por duas peças Arms- um oficial tão brilhante. ordem das 800 jardas. Tryon responde “Sim,
trong de 16.25 polegadas, montadas numa Tryon era um homem grande, inteligente e, deverá ser 8 amarras”. Entretanto, são içados
torre com o peso excepcional de 111 tonela- apesar de fanfarrão, era apreciado pelos seus sinais para formar em duas colunas afastadas
das, faziam dele o mais potente couraçado de subordinados. Muito decidido, afirmava, fre- 6 amarras, as tais 1.200 jardas. Um dos ofi-
todo o Mundo. Todavia, estas peças raramente quentemente, que sem entusiasmo não se ia ciais ainda lhe pergunta se não há engano e
disparavam porque punham em perigo a estru- a parte nenhuma. Todavia, não seguia os con- Tryon certamente, para que não fiquem duvi-
tura do navio. selhos dos outros e raramente informava o seu das, entrega-lhe um papel com um “6” escri-
Para a operação subaquática Christian Fran- estado-maior das suas intenções. Enfim, um to à mão, confirmando assim as 6 amarras. A
cis, além de um sonar de pesquisa e uma câ- magister dixit que os seus subordinados acei- distância entre colunas fica, definitivamente,
mara estanque para filmagens, prepara uma tavam sem contestar. nas 1.200 jardas
embarcação de apoio e adquire equipamen- Sir George tinha uma especial predilecção A coluna de EB, que constitui a 1ª divisão,
to adequado para alcançar os 140 metros de pelos exercícios respeitantes à evolução de tem o Victoria como navio chefe, onde vai
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