Page 33 - Revista da Armada
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do de mencionar que esta se tinha agarrado ao à visada, que, no fim, até nem levou a mal a in- mais, adequada como local de “poiso” de um
grupo de militares portugueses “como uma ver- consciente ofensa. Ficou, porém, a lição para fu- marujo no regular exercício da sua missão). Ali
dadeira piranha”. Reparou, então, que a rapariga, turas ocasiões… pelo menos até ao dia em que, pude observar que além dos seus demonstra-
até aí toda sorrisos, tinha, repentinamente, mu- com a sua característica subtileza para compara- dos talentos no “Brasileiro”, fazia um estron-
dado a cor das suas faces para um vivo escarlate ções, decida “elogiar” o anfitrião afirmando que doso brilharete a falar Inglês. Isto vai, forçosa-
a rondar a tonalidade de um pimentão maduro. este é “elegante como um veado”, animal cujo mente, levar-nos numa segunda incursão pelos
Embasbacado com aquele súbito embaraço, o nome - como alguns leitores devem saber (para domínios do “Estrangeiro”, mas, se os meus
nosso “araújo” só viu esclarecidas as suas angús- quem não sabe aqui fica o aviso!) - é usado no impacientes leitores estiverem de acordo, va-
tias quando um camarada brasileiro lhe explicou Brasil como sinónimo de… “bicha”. mos respirar fundo e deixar o assunto pendente
que o termo “piranha” se empregava por aquelas Esta e outras aventuras ouvi da própria boca para uma outra história…
bandas para designar as mulheres de má vida ou, do nosso herói, quando o acompanhei num Z
no mínimo, de conduta duvidosa. A coisa lá se exercício da NATO em pleno interior alente- J. Moreira Silva
compôs com um discreto pedido de desculpas jano (cuja geografia não é, em condições nor- CTEN
18 de Novembro 2005
Exmo. Sr. Director
Foi com muita emoção que li o artigo relativo as lanchas de desembarque.
Sou o filho mais velho do Cabo M JORGE ANTÓNIO PEREIRA a caixa que neste
artigo foca o meu pai deixou nos meus olhos algumas lágrimas traiçoeiras.
Gostaria de compartilhar com o SENHOR algumas das coisas que me vieram
à memória quando li todo o artigo.
Fui criado sempre com a MARINHA muito presente, vivi a minha infância
na CAPITANIA DE PENICHE lá nasceu um dos meus irmãos, e como foi feliz
essa infância.
Tinha 17 anos, dois irmãos menores (8 e 6 anos), a minha mãe sem emprego,
quando fui confrontado com a terrível notícia da morte do meu pai.
Alguns sonhos foram desfeitos, entre eles, a minha ida para a ESCOLA NAVAL
Carta recebida na que vinha a ser planeada há já algum tempo, ainda hoje sinto uma enorme tristeza
por nunca ter tido a honra de vestir a farda da MARINHA. Apesar da infelicidade
Revista da Armada que se abateu sobre a minha família não guardo qualquer tipo de ressentimento,
tanto eu como os meus irmãos temos formação a nível superior e um enorme
orgulho da memória do meu Pai.
Desde miúdo que ouvi muitas histórias da MARINHA, convivi com MARI-
NHEIROS, os FILHOS DA ESCOLA, muitos ainda hoje me dão a honra de serem
meus amigos, como é o caso do Senhor Almirante Andrade e Silva, estas histórias
eram contadas com um brilho mágico nos olhos do meu Pai que contrastavam
com as lágrimas quando via partir um NAVIO e ele ficava em terra.
Tudo isto fez de mim um amigo profundo da MARINHA das coisas do mar
ao ponto de passar esta paixão aos meus filhos e de os meus amigos me chama-
rem por brincadeira MARUJO HONÓRIS CAUSA.
Fui confrontado e de surpresa pelo alistamento do meu filho na MARINHA
1º MARINHEIRO MANOBRA N.º 9327798 Pedro Jorge Évora Pereira a mesma es-
pecialidade do Avô, as mesmas pisadas, o mesmo orgulho de ser Marinheiro onde
quer o meu Pai esteja deve ter neste momento aquele brilho mágico nos olhos.
O meu Pai deixou o mundo dos vivos mas como todos sabemos só morremos
quando não houver ninguém para nos lembrar, isso com o meu Pai nunca vai
acontecer. O Cabo Pereira morreu a fazer aquilo que gostava profundamente,
servir a MARINHA e confesso não via o meu Pai a morrer na cama, tinha vida
de mais para isso.
Quando navego à bolina com o vento a dar-me na cara, o sabor a sal nos lábios,
sei que o meu ai está presente comigo como por boas e más razões também vai
estar a MARINHA até ao fim da minha vida.
Gostaria de fazer dois pedidos, primeiro e procurei isto 32 anos, o contacto da
pessoa que escreve a CAIXA e que julgo ser na altura o 1º Tenente António Maria
Catarino da Silva que me desculpe desde já a impertinência mas tenho há muitos
anos perguntas por responder.
O segundo e por certo perfeitamente compreensível obter cópia ou original do
louvor descrito na CAIXA acerca do qual nunca tinha tido conhecimento.
Agradeço desde já a atenção dispensada.
Respeitosamente
Licínio Pereira
REVISTA DA ARMADA U JANEIRO 2006 31