Page 145 - Revista da Armada
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Instalações da Marinha
Instalações da Marinha
4. O INSTITUTO HIDROGRÁFICO
O Convento das Trinas do Mocambo, prédio urbano onde está pedra. Dando para este claustro encontra-se a antiga secretaria das
actualmente sedeado o Instituto Hidrográfico, foi pertença de Cor- Irmãs Hospitalares, hoje o Refeitório que apresenta uma colecção de
nélio Wandeli, um flamengo que por sua morte o deixou, assim paineis em dois tons de azul com imagens de lazer, num conjunto
como o respectivo recheio, para a fundação de um convento, insti- coerente de molduras que sugerem uma intervenção na sua dispo-
tuição essa que inicia actividade em 1611 com as Irmãs das Trinas, sição no início dos anos 40 do século passado. Também com aces-
tendo o imóvel sido então denominado Convento de Nossa Senho- so ao claustro localiza-se a entrada para o antigo capítulo, ladeado
ra da Soledade. pela cruz que identificava as Trinas, local onde as irmãs se reuniam
No século XIX o Convento passa a albergaria das Irmãs Hospitala- para trabalho ou descanso é um espaço actualmente dividido entre
res de São Francisco que o habitaram até ao advento da República, a Secretaria Central e o Gabinete do Adjunto do Director-Geral, com
após o que sofreu várias transformações e ocupações. paredes de madeira colocadas de forma a não ferir os cilhares das
Decorria o ano de 1969 quando um incêndio de grandes propor- paredes que, embora comuns na época, constituem hoje um con-
ções destruiu as instalações do Instituto Hidrográfico, então situado junto digno de admiração. Continuando no mesmo piso, o outrora
na Sala do Risco do antigo Arsenal da Marinha. Perante esta situação refeitório conventual está ocupado pelo Centro de Documentação e
inopinada, um despacho expedito do Ministro das Finanças permi- a cozinha anexa – actual Sala de Leitura da Biblioteca é um verda-
tiu que alguns serviços do Instituto fossem alojados numa parte do deiro ex-libris de monumentalidade. As soluções práticas do antiga-
Convento das Trinas, enquanto se faziam as obras necessárias na mente: paredes cobertas de azulejos; abóboda para escoamento de
parte restante. O Convento era então em edifício degradado, pra- líquidos (onde se pode observar um painel dedicado ao anjo liber-
ticamente abandonado, servindo unicamente de arquivo morto do tador dos escravos); as bacias de pedra para lavagem e tratamento
Ministério das Finanças. dos alimentos; a chaminé e a salga, constituem hoje um espaço de
Passadas que são quase quatro décadas da presença do Instituto impressionante beleza.
no Convento importa fazer uma descrição das actuais instalações Quase em frente desta área fica outra sala abobadada – a botica do
e do que de original ainda existe. As infraestruturas compreendiam convento que serve de Sala de Refeições do Director-Geral, manten-
basicamente uma igreja, o edifício do Convento propriamente dito e do um sentir especial pela sua intimidade com as paredes cobertas
um anexo. Em 1969 a igreja estava desmoronada restando apenas a de azulejo, de desenho no estilo holandês mas de menores dimen-
parede exterior, a porta e o coro alto o qual é ocupado actualmente sões que os da cozinha, dispondo de uma fonte de água corrente e
pelo Auditório e mantem os antigos azulejos em três paredes estando exibindo no tecto a cruz do hábito das Trinas.
no tecto representada a Ascensão, imagem do último ciclo de vida O terceiro piso era ocupado pelas celas. Pavimento de paredes
de Nª Senhora. Nesta área que tem acesso, através de uma escada brancas descaracterizado ao longo dos tempos, é hoje ocupado pela
de madeira, ao piso das antigas celas das freiras, pode-se apreciar Direcção Financeira. Duas salas são no entanto de mencionar, uma
um frontal de talha com os símbolos das Trinas. Por cima do coro antiga capela de que só restam as paredes com azulejos policromá-
tinham, em 1920, sido construídos dois pavimentos que agora alo- ticos representando cenas de lazer, separadas por vazos de incenso
jam a Sala de Cartografia e acima, a Multimédia e a Escola de Hi- formando uma cintura e um fresco, no tecto abobadado, com sím-
drografia e Oceanografia. bolos da Paixão. A outra sala parece ter sido um recinto de oração
Inicialmente o piso térreo da igreja foi ocupado pelas Oficinas de tempos mais modernos mas com um toque clássico, provavel-
mas já no fim do século foram, nesse espaço, edificados dois pisos mente do século XIX.
que alojam o Serviço de Electrotécnia. O quarto piso é ainda mais descaracterizado que o anterior consti-
Reportando-nos ao edifício do Convento propriamente dito distin- tuído por salas com um grande pé direito dotadas de janelas abertas
guem-se nele cinco pisos. No primeiro piso ficou instalado parte do para o exterior e portanto de grande luminosidade – porventura ou-
Serviço de Artes Gráficas. Esta área foi utilizada originalmente como trora salas de trabalho – alberga a Direcção Técnica Científica.
habitação e nela situavam-se as cozinhas e os armazéns de serven- O quinto piso são as águas furtadas, ligadas ao edifício anexo,
tia, sendo ainda possível localizar o poço de água e as chaminés, construído antes de 1920 e depois completamente remodelado e
que foram há poucos anos tapadas. Também neste piso encontra-se onde se situam os Laboratórios. Ao nível do piso zero, encontra-se
o Depósito de Documentos Náuticos, o qual está aberto ao público também em anexo recentemente recuperado uma parte do Serviço de
através da moderna Loja do Navegante, com entrada pela Rua Gar- Artes Gráficas e as cobertas do pessoal da guarnição do Instituto.
cia de Orta (lado sul do imóvel). Além do prédio urbano ocupado em 1969 a Marinha adquiriu,
O segundo piso tem o seu acesso principal pela Rua das Trinas em 1982, à Casa Cadaval a Quinta da Cerca, terreno adjacente ao
(lado nascente) e é onde se encontra o património artístico mais no- Convento. Neste espaço está a ser construído um moderno edifício,
tável. Logo à entrada a portaria é revestida de paineis de azulejo do cuja inauguração se prevê acontecer em 2009, destinado a instalar
século XVII, em que um cilhar comum tem embutidos ao centro os a Escola de Hidrografia e Oceanografia, à ampliação do Arquivo
símbolos de Nª Senhora, sendo a porta interior e a roda dos expostos Técnico e a estruturas de apoio com destaque para o novo Auditó-
decorados com um painel dedicado à libertação dos escravos – mis- rio, Cozinha e Refeitórios.
são principal de primeira Ordem que ocupou o Convento. É esta a O Instituto Hidrográfico orgulha-se de ser morador num dos espa-
entrada principal do Instituto. A porta interior dá passagem ou para ços históricos da cidade de Lisboa e afirma o seu propósito de, como
um átrio de onde se tem acesso às Salas de Trabalho e à Secretaria, sempre tem feito, conservar dignamente as instalações anteriormente
todos estes compartimentos cobertos de azulejos, ou para um claustro ocupadas pelo Convento das Trinas do Mocambo.
também rodeado de paineis de azulejo que se encontra dividido em
quatro partes e cujo centro é ocupado por um lago igualmente de (Colaboração do INSTITUTO HIDROGRÁFICO)