Page 312 - Revista da Armada
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próprio crescimento do turismo exógeno po- em África, quem chegar primeiro instala-se geoestratégicas importantes. Tem também
derá produzir sobre os seus mercados efeitos e ganha vantagem competitiva. Chegar pri- um profundo conhecimento das realidades
semelhantes (e cumulativos) aos da procura meiro significa estar mais bem posicionado africanas onde mantém uma forte presença
interna. Embora aqui tenhamos de ser cau- para a disputa de áreas vitais, contactos, ni- de comunidades lusas ou luso descenden-
telosos atendendo à crise mundial que o fim chos económicos, implantação de marcas e tes. Além disso, a sua estabilidade política
do petróleo barato vai gerar. A aplicação de produtos, contratos de fornecimento e co- e institucional interna, proporcionam-lhe as
novas técnicas sanitárias e a utilização de no- nivências políticas. Pensar que não vale a condições para poder olhar de novo para o
vos medicamentos destinados a erradicar as pena, porque os outros já lá estão, é outra exterior, em especial para os PALOP e para o
pandemias actualmente existentes poderão, forma errada de pensar já que não há outras Brasil. Há a referir também o espírito aberto
isoladamente ou em conjunto, contribuir grandes oportunidades estratégicas e o risco do povo português que lhe permite relacio-
ainda mais para o crescimento dos merca- é caminhar-se para a exiguidade. nar-se facilmente com outros povos.
dos africanos, neste caso pelo lado da po- Não é do poder político que se trata, mas Noutra vertente, como vulnerabilidades,
pulação. Podemos mesmo imaginar que um essencialmente do poder económico. Con- podemos referir e destacar, a dependência
dia a emigração para África seja superior à quista-se hoje espaço vital usando a econo- da nossa economia em relação à UE, a de-
imigração que lá se origina. O grande dita- mia. As economias são cada vez mais aber- pendência em termos energéticos, ausência
dor desta visão será o petróleo e a maior ou tas, os territórios cada vez mais penetráveis, de Marinha Mercante e a pequena dimen-
menor limitação que ele impuser. as redes transnacionais de negócios cada são da frota pesqueira. O investimento na
Nesta onda de pensamento não podemos vez mais abrangentes. Mas certo é, que na investigação é baixo e o desenvolvimento
deixar de imaginar África como destino mi- base dos interesses económicos, estão visões tecnológico ainda é modesto, embora te-
gratório já que o continente é relativamente geopolíticas de grandes lideres que conse- nha subido significativamente nos últimos
subpovoado (Angola tem anos. Constitui também uma
13,4 vezes o tamanho limitação o facto de Portugal
de Portugal e tem ape- ter uma população inferior a
nas cerca de 16 milhões 10 milhões de habitantes, em
de habitantes) e fica geo- boa parte envelhecida e com
graficamente próximo perspectivas de diminuir ain-
do colosso asiático, de da mais.
tal modo sobrepovoado Estas vulnerabilidades po-
que já hoje representa dem, no entanto, ser mini-
cerca de dois terços da mizadas se atendermos ao
população mundial. Es- facto de Portugal ser um país
tão a florescer condições homogéneo, ser membro da
de vida em África e já União Europeia, ter uma rela-
estamos a assistir ao flu- ção fraterna com os países lu-
xo de imigração asiática, sófonos e especial com a po-
sobretudo da Índia e da tência regional do Atlântico
China, mas também de Sul, o Brasil. É por esta cons-
outras regiões da parte sul ciência que Portugal tem pro-
da Ásia. A Europa, embo- Fotografia tirada por ocasião da instalação de um sistema radar e de receptores AIS em São curado minimizar as suas vul-
ra atravesse um período Tomé e Príncipe. O sistema foi fornecido e instalado pelos EUA e permite a STP acompanhar os nerabilidades assumindo um
de baixa natalidade, tem movimentos de navios e embarcações ao largo das duas ilhas. Segundo o Ten. EN-AEL Hamil- bom desempenho em vários
um excesso de cidadãos ton Nascimento de Sousa (formado na Escola Naval Portuguesa) detectam muitos navios em organismos internacionais.
trânsito lento, durante bastante tempo, mas não têm meios para investigar.
licenciados com poucas Os militares têm contribuído
oportunidades de emprego. É assim provável guem orientar toda a capacidade (poder) de de forma louvável para este objectivo. Por-
que África represente a oportunidade para um Estado para uma epopeia. É isto que a tugal é assim bem capaz de levar os líderes
muitos europeus com habilitações superio- China está a fazer discretamente, enquan- dos Países Africanos de Língua Oficial Por-
res ou competências técnicas, já que é deste to o mundo ocidental se consome na guer- tuguesa a sentirem a confiança necessária à
tipo de imigrantes que África precisa. Desta ra contra o terrorismo. A China e mesmo o materialização de projectos desejados por
forma, é de antever que muita mão-de-obra Brasil procuram mercados que lhes sejam fa- eles e por nós portugueses.
qualificada, que há em excesso na Europa, voráveis, usando como factor determinante
venha a vingar em África. o baixo preço. A “globalização económica” QUE PAPEL ESTRATÉGICO
Actualmente, já há sinais evidentes do in- está a transformar a paisagem geopolítica PARA PORTUGAL?
teresse por África sobretudo de economias do planeta.
de segunda linha, desejosas de exportar pro- O controlo geopolítico, incluindo a pre-
dutos de qualidade ainda inferior aos das POTENCIALIDADES E VULNERABILI- sença militar, e geoeconómico de África e
nações tecnologicamente mais avançadas. DADES DE PORTUGAL dos oceanos circundantes está na ordem
Produtos que são mais baratos e assim mais do dia. Os movimentos estratégicos nor-
adequados ao poder económico local. As Portugal, numa perspectiva de potencia- te-americanos, britânicos, franceses, chine-
potências económicas emergentes (Brasil, lidades no ambiente internacional, possui ses e indianos são a prova disso mesmo. Os
Índia, China) parecem muito interessadas uma posição geográfica que permite a apro- norte-americanos têm a visão estratégica do
em explorar as oportunidades que emergem. ximação aos três continentes banhados pelo que pretendem, mas têm dificuldade em
Multiplicam-se as investidas diplomáticas, as Oceano Atlântico, é membro da União Eu- conquistar o coração dos povos autóctones.
delegações empresariais, as concessões de ropeia e da NATO, participa nas principais Os franceses não vêem com bons olhos a en-
empréstimos, as aproximações políticas e organizações internacionais, tem relações trada de mais este actor a disputar interesses
outras iniciativas com vista a criar laços ou privilegiadas com os EUA e com o Brasil. que consideram históricos. Os chineses não
dependências. Na vertente interna pode dizer-se que valorizam as preocupações ocidentais com
Portugal e a Europa não podem pensar Portugal tem a grande potencialidade de ter os valores éticos e morais e dedicam o seu
que têm vantagem nesta corrida, na verda- a mesma “fala” e uma história em comum esforço directamente para as fontes de ener-
de todo o mundo espreita oportunidades com países africanos que ocupam posições gia ou para grandes obras como é o caso da
22 SETEMBRO/OUTUBRO 2008 U REVISTA DA ARMADA