Page 5 - Revista da Armada
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Mais ou menos onde está hoje a Ponte de Santa Clara, que se vê   D. Dinis e do seu papel para a consolidação de Portugal indepen-
              na foto. Na zona alta – onde é a Universidade – fi cava o paço real,   dente, relacionava duas medidas complementares e estruturantes
              sucessivamente reformado até ao reinado de D. João III, quando foi   tomadas por este soberano: a criação da Marinha e a Universidade.
              cedido para as escolas. Mas, um pouco a leste desse paço, no local   A Marinha, porque defi nia uma via que garanƟ a a riqueza indispen-
              onde hoje é o Largo de D. Diniz e o ediİ cio da MatemáƟ ca, fi cava o   sável, vinda do mar e do comércio maríƟ mo; e a Universidade como
              castelo, cujas ameias se prolongavam a norte, com o aqueduto que   centro criador da cultura própria, a determinar uma maneira de
              o abastecia. Uma construção que data da época romana, reformada   estar e de ser português.
              pela úlƟ ma vez por D. SebasƟ ão e tomando o nome do respecƟ vo   Esta Universidade, ao tempo fundada em Lisboa, está desde 1537
              santo – Aqueduto de S. SebasƟ ão. A grande muralha circundava   em Coimbra e é – sem sombra de dúvida – o principal elemento
              esta acrópole, com uma forma poligonal irregular, que deixava o   icónico da cidade, determinando (praƟ camente) toda a sua vida até
              Mosteiro de Santa Cruz fora dos muros.              ao presente. E no momento que foi transferida encetou uma nova
               Na margem esquerda do rio foram construídos vários conventos e   fase da sua vida, como centro de conhecimento, fundamental para
              mosteiros, hoje quase todos desaparecidos, fruto do depósito pro-  o Portugal da Expansão, com tudo o que trouxe de novos saberes.
              gressivo das areias do Mondego, que se faz senƟ r há mais de um   Pedro Nunes foi com ela para Coimbra e foi lá que produziu as mais
              milénio. Sabemos que Afonso Henriques construiu a ponte, sobre   brilhantes obras de MatemáƟ ca e Astronomia, com impacto por
              pilares acrescentados de uma outra romana, porque a subida do   toda a Europa.
              nível das areias assim o exigia. Mas essa ponte foi sucessivamente   D. João III concedeu-lhe o paço real, para residência de lentes e
              reformada, pelas mesmas razões até à recente construção da Ponte   para as lições, mas Filipe II quis despejá-la obrigando-a a comprar o
              de Santa Clara. Dos cenóbios medievais da margem esquerda, pode   ediİ cio pela soma de 30 000 cruzados. Desde então sofreu melhora-
              ainda ver-se Santa Clara, a Velha, onde viveu a rainha Santa Isabel,   mentos diversos, mas mantém um traçado semelhante ao do século
              onde casou o rei D. Duarte e onde Inês de Castro teve a primeira   XVI, com o recinto rectangular, onde se entra pela Porta Férrea ou,
              sepultura, antes de D. Pedro ter mandado transferir o corpo para o   no outro extremo, pela Porta de Minerva. D. João V enriqueceu-a
              Mosteiro de Alcobaça.                               com a construção da torre e, sobretudo, da magnífi ca biblioteca, que
               Os restantes de Santana, S. Domingos e S. Francisco (de que apa-  fi cou com o seu nome. No tempo de D. José, contudo, todo o ensino
              recem vesơ gios na imagem de Georg Braun, do fi nal do século XVI)   em Portugal seria alvo de uma verdadeira revolução, que abrangeria
              desapareceram engolidos pelas areias. E recorde-se que foi neste   também a Universidade de Coimbra: novos estatutos, novas regras
              úlƟ mo que Ɵ veram lugar as importanơ ssimas cortes de Coimbra, de   de comportamento e empenho académico, nova forma de encarar
              1385, onde foi aclamado D. João I, como rei de Portugal. No século   os estudos. Nascia como que uma nova Universidade, que se man-
              XVII, foram construídos um novo convento de S. Francisco, um   teria como a única Universidade portuguesa até à implantação da
              pouco mais acima – onde ainda hoje está e onde teve lugar o Con-  República em 1910.
              certo Ofi cial do Dia da Marinha 2019 – e o de Santa Clara, a Nova.  A  Coimbra do presente, onde a Marinha entendeu comemorar
               Há cerca de dois anos, quando a Marinha comemorava 700 anos   o seu dia de festa, este ano de 2019, apesar de já não ser apenas
              da sua existência estruturada, o Prof. Francisco Contente Domin-  a cidade universitária, não deixará de estar marcada pela presença
              gues, numa palestra proferida na Escola Naval, onde falou do rei   desta vetusta insƟ tuição, onde foi formada a elite nacional, desde o
                                                                  século XVI até ao século XX.

                                                                                                       J. Semedo de Matos
                                                                                                                CFR FZ
                                                                  N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfi co






































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                                                                                                       Foto SMOR L Almeida de Carvalho
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