Page 35 - Revista da Armada
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NATAL: “DEUS PARA TODOS”
Talvez ninguém tenha culpa, mas o mundo em geral quando fala pedir, nada calar e sobretudo nada matar. Tentando sempre huma-
de Natal fi ca invariavelmente longe do seu senƟ do mais profundo nizar a humanidade”.
e verdadeiro. Morreu aos 92 anos, mas o seu legado será inesquecível. São
Perdoem-me a expressão, mas dentro da situação pandémica que homens como D. Pedro que lavam a história.
conƟ nuamos a viver, poderíamos chamar ao acontecimento do
Natal como o decisivo e defi niƟ vo “desconfi namento” de Deus. E agora, o Papa Francisco.
De facto, na nossa teologia, o Deus pouco menos do que inacessível Num gesto cheio de simbolismo, no dia 3 de outubro passado, o
desceu um dia à terra e no Seu Filho cumprimentou-nos da maneira Papa deslocou-se a Assis e lá assinou a Encíclica “Fratelli Tuƫ ” que
de que nós mais gostamos: cumprimentou-nos com o coração. nos guia de facto para o que é essencial. Na sua linguagem simples
E esse gesto é irreversível. E para todos. É isto o Natal. Agora só é mas sempre profunda, o Papa diz que é preciso “ver os outros como
necessário que cada um deixe que o seu coração se cruze com o d’ Ele. necessário complemento de nós mesmos”.
E mais um acrescento. Quando Deus se cruza com o nosso cora- Há oitocentos anos S. Francisco de Assis gostava de referir-se ao
ção, impele-nos a cruzarmos o nosso com os dos nossos semelhan- irmão sol e à irmã lua; agora o Papa Francisco sublinha o básico para
tes. Quando isto se torna verdade, a humanidade nunca mais é a o cristão: “Todos irmãos”.
mesma. E o Papa sabe que não é utopia. É por aqui que se transforma o
Aqui chegados, podemos depois acrescentar outras vertentes todas mundo sabendo que a fraternidade é o princípio e o fi m de tudo.
elas válidas e que nos são tão caras na quadra natalícia: a dimensão Este é um desafi o do primeiro Natal, mas que nós ainda não conse-
de festa, as luzes e as prendas, a reunião familiar, a troca de mensa-
gens de solidariedade e de paz. Tudo isto é cristão. guimos conjugar na totalidade. Ficamos muitas vezes como espec-
tadores quando devemos ser atores. Em vez de assisƟ r, parƟ cipar.
Ao longo da história do mundo, foram aos milhares os que enten-
deram o Natal não como uma utopia, mas como uma narraƟ va que Caríssimo leitor: neste contexto tão peculiar que atravessamos,
endereço os votos de que na família naval, nos tornemos ainda mais
guiou os passos das suas vidas e às vezes até duma maneira heroica.
próximos, construindo pontes de verdade e de paz.
Nesse senƟ do gostávamos de prestar aqui homenagem a um Memorizo as saudades dos que nos deixaram pela morte, evoco os
homem absolutamente diferente, desaparecido do nosso mundo
em agosto passado. Não é muito mediáƟ co, mas é uma vida que sofrimentos e as condições das nossas famílias, recordo quem vai
passar este Natal de 2020 longe de casa em Missões Internacionais.
impressiona pela simplicidade e pela verdade.
Falo de D. Pedro Casaldáliga, bispo emérito de S. Félix, Mato Grosso, Que o próximo Natal seja um momento sério e de compromisso.
Todos ganharemos com isso.
no Brasil. Sempre despojado de tudo mas repleto de coragem diante
de alguns atentados à sua própria integridade İ sica. O seu crime foi Feliz Natal para todos os militares, militarizados e civis da Marinha e
defender os direitos dos povos indígenas e dos mais marginalizados. de igual modo para todos os seus familiares.
D. Pedro marcou a sua vida pela “solidariedade pelos mais pobres
fazendo do seu ministério a sua poesia e da sua vida um canto à
solidariedade. Preocupado em nada possuir, nada carregar, nada José Ilídio Costa
CMG CAP
Painel de azulejos da Sé de Viseu.