Page 190 - Revista da Armada
P. 190

este acordo foi  Melique Saca por temer   ser  carregada  pela  culatra  e  que.   a caravela conservavam, cada um, o seu
            que Chaul se viesse a transformar, com   movendo-se  sobre  um  pião,  podia  ser   batel,  artilhado com  uma peça de cali-
            O tempo, numa rival de Diu.  E mandou   apontada  em qualquer  direcção.  Eram   bre razoável e alguns -berços-, e devi-
            imediatamente sair para o mar Aga Ma-  peças de pequeno calibre que lançavam.   damente empavesado,  a  prOleger-lhe  a
            mude com todas  as  fustas  disponíveis,   geralmente, pelouros de pedra, mas com   popa.  Quanto às galés, não tinham, ob-
            que seriam em número de quarenta, com   elevada cadência de tiro e fáceis de apon-  viamente. qualquer dificuldade em, ma-
            ordem de impedir por todos os meios a   tar, sendo panicuJannente eficazes a cur-  nobrando a remos, manter as suas proas
            construção da fortaleza  naquela cidade.   ta  distância.  Passando  muito  peno dos   e,  consequentemente,  os  seus  canhões
               Mas essa construção já tinha come-  nossos navios.  puderam os bombardei-  principais voltados para o inimigo. Será
            çado,  indo as  nossas embarcações bus-  ros "mouros  .. tirar O máximo rendimen-  oportuno dizer que as nossas galés esta-
            car a pedra ao morro.  situado na  outra   to da sua artilharia, causando-Ihes muitas   vam annadas com três canhões à proa,
            margem do rio, em frente da cidade. En-  avarias na  mastreação e nas enxárcias e   dois de menor calibre à  popa  e  quatro
            tretanto. vindo de Goa, tinha chegado a   provocando-lhes  um  cena  número  de   "berços. a cada bordo. A  caravela, além
            Chaul  D.  Aleixo de Meneses com três   mortos  e  feridos .         de  outros  mais  pequenos,  dispunha  de
            galés e a notícia de que já se encontrava   Sendo os canhões portugueses mais pe-  três canhões de grosso calibre a cada bor-
            na  fndia o novo governador, D.  Duarte   sados (à excepção dos .. berços.) e de car·   do. Os galeões disporiam de seis a dez.
            de Meneses,  o que  levou  Diogo  Lopes   regar  pela  boca.  é  provável  que  só   Nestas  circunstãncias.  Aga  Mamude
            de Sequeira a apressar ainda mais os tra-  tenham podido disparar uma ou duas ve-  achou  mais prudente conservar os seus
            balhos.                           zes durante a  rápida passagem das  fus-  navios à distância, travando com os nos-
               Ceno dia, chegou de chofre a infor-  tas em contra-bordo.  Por outro  lado.  a   sos um duelo de anilharia que provocou
            mação de que Melique Saca se encontra-  marcação das  fustas  variava  muito de-  danos  reduzidos de  pane a  pane.
            va em Baçaim com uma grande armada   pressa, o  que tornava dificil  a  pontaria   Vinda a viração, dirigiram-se os na-
            e um numeroso exército para ir atacar os   com peças que. praticamente, não se mo-  vios portugueses para a barra de Chaul
            Portugueses.  Alvoroçados, os soldados   viam em direcção e eram bastante limi-  seguidos pelas fustas.Curiosamente, le.-
            abandonaram os trabalhos e dirigiram-  tadas em depressão. Por último, indo os   vavam os batéis a  reboque com a popa
            -se precipitadamente para a praia na  in-  nossos navios próximo uns dos outros e,   no sentido da  marcha,  de modo a con-
            tenção de se recolherem aos navios.  Teve   sensivelmente. cm linha. isto é, ao lado   servarem a proa e, portanto, os canhões,
            Diogo Lopes, que se enCOntrava presen-  uns dos outros. os nossos bombardeiros   apontados na direcção do inimigo!  Dis-
            te, tnuita dificuldade em serenar os âni-  tinham que ter muito cuidado para  não   positivo táctico extremamente engenho-
            mos,  conseguindo,  por  fim,  que  o   se atingirem  mutuamente.  No entanto,   so  que  mostra  bem  a  versatilidade,  a
            pessoal regressasse às obras da fortaleza.   apesar de todas estaS dificuldades. duran-  imaginação e a capacidade de adaptação
               Para enfrentar a armada de Diu. Dio-  te  a  passagem  da  annada de Diu  pelo   que eram apanágio dos Portugueses da-
            go Lopes de Sequeira organizou uma for-  meio da nossa, os ponugueses consegui-  quela época e que mais larde, infelizmen-
            ça  constitufda  por  lrês  galeões.  uma   ram afundar-lhe duas fustas e avariar-lhe   te,  nos vieram a faltar.  Não encontrando
            caravela e três galés que colocou sob as   mais algumas.             qualquer sector morto por onde pudes·
            ordens  de  D.  Aleixo de  Meneses.   A ideia de Aga Mamude, que não p0-  sem infiltrar-se sem risco, as fustas con-
               Num dos primeiros dias de Novem-  de deixar de ser admirada pela sua  au-  tinuaram a manter-se à distância, o que
            bro. soprando a viração (vento do mar),   dácia,  era  dirigir-se a  Chaul à força  de   só favorecia os nossos. cujos canhões ti-
            apareceu Aga  Mamude diante de Chaul   remo e, enquanto a  nossa armada  per-  nham maior alcance e lançavam projéc-
            com cerca de cinquenta fustas. das quais   manecia ao largo,  retida pelo terreal ou   teis mais pesados que os do adversário.
            uma dezena era de Baçaim. cidade que,   pela  calmaria,  desmantelar  a  fonaleza   Chegada a armada portuguesa à bar-
            tal como Diu. obedecia ao rei de Cam-  que estava sendo construfda e dispersar   ra de Chaul  fundeou,  ficando.  graças à
            baia.  Preparou-se logo  D.  Aleixo para   os trabalhadores, ou até ocupá-Ia,contan-  viração.  com as  proas voltadas  para  o
            ir ao seu encontro mas, runuralmente. SÓ   do provavelmente com o auxílio do ca-  mar.
            O pôde fazer ao outro dia de manhã com   pitão da cidade, o xeque Mafamede, que   Durante mais algum tempo cominuou o
            o  lerreal  (vento da  terra).    estava mancomunado com Melique Sa-  duelo de artilharia. Mas. vendo Aga Ma-
               Nessa altura, encontravam-se as fus-  ca para expulsar os Portugueses. Porém,   mude que estava a sofrer mais avarias e
            tas bastante ao  largo. para onde tinham   logo que chegou às proximidades da bar-  mais baixas do que aquelas que nos con-
            abatido durante a noite, com as velas co-  ra,  pôde  verificar que dentro  do  porto   seguia causar, acabou por retirar, ao fun
            lhidas.  Foram  buscá-Ias  os  nossos  na-  estavam  numerosas  naus  portuguesas.   da tarde, para junto duns ilhéus que há,
            vios, levando os galeões e a caravela os   Compreendeu. então, que o  desmante·   perto  da  costa,  um  pouco  a  norte  de
            respectivos batéis a reboque. devidamen-  lamento ou a ocupação da forta1eza não   Chaul.
            te  artilhados  e  empavesados.  Porém,   seria tarefa fácil nem rápida e que, se en-  Neste primeiro dia de combate, em-
            quando as duas armadas chegaram ao al-  trasse em Chaul. acabaria por ficar en-  bora tivessem ficado consideravelmente
            cance de tiro, as fustas,  ao contrário do   curralado dentro do rio quando a nossa   maltratados,  conseguiram os  portugue-
            que seria de esperar, em vez de adoptar   armada, com a viração, regressasse. Re-  ses  avariar  gravemente sete das  fustas
            uma  táctica evasiva,  avançaram  contra   solveu, por isso, fazer meia-volta e apro-  inimigas, além das duas que meteram no
            a  armada  portuguesa à  voga  arrancada   veitar a calmaria que estava caindo para   fundo.
            e, disparando furiosamente a sua artilha-  voltar a atacar os navios portugueses, na   Ao outro dia de manhã, Aga Mamu-
            ria, passaram pelo meio dela e dirigiram-  esperança de repetir o sucesso que alcan-  de voltou a aparecer e recomeçou O duelo
            -se para a  barra de  Chaul t     çara um  mês  antes em Diu.        de  artilharia  com  a  nossa  annada que
               Cada fusta de Diu estava annada com   Mas os portugueses tinham aprendi-  preferiu conservar-se fundeada, possivel-
            uma bombarda roqueira,  su~eptfvel de   do bem a lição e tanto os galeões como   mente para evitar que, tal como estivera

            6
   185   186   187   188   189   190   191   192   193   194   195