Page 156 - Revista da Armada
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Não quiseram os serviços de fila-
telia de Macau deixar de perpetuar
estas lindas e invulgares janelas,
que o território implantou em muitas
das casas .. velhas .. , tão tipicamente
portuguesas e as portas de correr,
genuinamente chinesas, que, desde
as simples residências ao mais es-
condido templo, se encontram ao
virar de cada esquina. pequenos nadas que fazem as
São ainda fonte de inspiração de memórias de tempos já passados.
artistas e de todos aqueles quo se
deixam envolver pela beleza e sedu- Carmo Pinto,
ção destes expressivos motivos, ITEN OT5
Raio verde -isso existe?
.COIS Bleus~ de 21 de Dezembro do ano findo repro- o raio verde. Ia-me distraindo com as mudanças de forma de
duzia, da revista Navigatio", um artigo que intitulava um astro-rei que já perdera a dignidade de nào poder ser olhado
Ocomo vem acima, onde o autor, Pierre Estur, capitão directamente, e se exibia num generoso espectáculo de meta-
experimentado de longo curso, expunha as circunslâncias que morfose dos seus contornos. E de súbito, aquela inesperada
lhe tinham permitido observar várias vezes aquele fenómeno revelação de verde! O que me lembrava cadinho de oiro fun-
curioso. e para muitos imrigante, se não simplesmente digno dido, como vira, um dia, em oficina de amigo meu, ourives,
dum indulgente sorriso de incredulidade. Sendo o .Cols Bleus- e aJi no próprio Sol, feito luz, um amarelo dourado que instan-
o exemplo que o nosso último ministro. almirante Pereira taneamente se toma verde, movediço ainda, mas autêntica
Crespo, apresentava como paradigma do que ele pretendia que esmeralda de luz, que fazia suspender a respiração. Foram
fosse, como seu progenitor, a .. Revista da Annada .. , habi- 2 ou 3 segundos, não mais. Mas também não mais possfveis
tuámo-nos a lê-lo com regularidade. e O artigo agora citado de esquecer.
esteve mesmo para ser pura e simplesmente traduzido, não Há quem diga que esta cor verde não passa de fenómeno
fora o ligeiro senão de nos parecer. em conversa de redacção. conhecido da nossa visão. designado como reacção da cor
a gravura que o ilustrava pouco feliz na finalidade de tornar complementar: este fenómeno. de facto, existe, e pode
as coisas claras. Ta1vez nem estivesse mesmo exacta, como experimentar-se de uma forma bastante simples: olhe-se fixa-
cumpria. Daf que optássemos por redigir trabalho próprio mente qualquer imagem de uma cor intensa e bem iluminada,
sobre o tema. por 10 a 15 segundos; desviando o olhar, de seguida, para
Já não é a primeira vez que a .RA~ traz o raio verde para uma parede branca, a mesma imagem volta a aparecer-nos,
as suas páginas (I). Por mim, com uma carreira cheia de horas mas na cor complementar. Acontece, porém, que o verde não
de ponte. e de poentes, mas pesaroso de nunca a sorte me ter é a cor complementar daquele amarelo alaranjado, ficando até
bafejado com a visão do tal fenómeno raro, deixando-me a relativamente próximos no espectro. Por oulro lado. a colo-
imaginação naquela perplexidade de não atinar se era aparição ração verde é também visível no Sol ao nascer, portanto antes
do género faísca eléctrica, feixe de luz para os céus, como de aparecer o laranja. O que acontece ao nascer do Sol é que,
na Idade Média os desenhadores a faziam passar, por entre por efeito Doppler, toda a sucessão de mudança de cores é
as nuvens, do céu para a terra, ou quejandos e insólitos efeitos, mais rápida, portanto mais difícil de distinguir.
sentia-me agora à vontade porque um dia, exactamente na Outra explicação Q.ue se tcm adiantado para o raio verde,
última comissão de embarque a que fui chamado, inesperada- é a da absorção selectiva de cores pela atmosfera, onde, em
mente eu vi, claramente visto - como diria o poeta - o último certas circunstâncias de existência de vapor de água e de ozono,
pedaço de sol, que ia fugindo no poente, esplendorosamente as cores seriam quase todas absorvidas, excepto nos compri-
verde. dum verde esmeralda luminoso. puro como é a cor feita mentos de onda das colorações verdes. Todavia. o raio verde
de luz. tem sido observado em muito diversas condições de humidade
Navegávamos de Hong-Kong para Timor ao longo do aunosférica, incluindo o deserto.
arquipélago das Filipinas, o mar tranquilo. o céu claro, um Também se invocam fenómenos de refracção anómala. mas
horizonte sem nuvens, e deu-me para apontar o binóculo para parece que a explicação mais simples. e plausível. se deve
o sol, que já tangenciava o horizonte, vendo o seu enorme situar na refracção sim, mas refracção normal. Refracção por
disco laranja, ocupando boa pane do campo do binóculo, quase toda a gente conhecida como causa da separação das
modificar a regularidade dos seus contornos em sucessivas cores do arco-íris, seja num prisma. seja numa gOla de água.
fonnas de abajur, à medida que se ia escondendo horizonte A luz do Sol, ou luz branca. é constiturda pela junção de
abaixo. Penso que nem me passava pela ideia ver ou não ver todas as cores; quando esta luz atravessa, por exemplo. um
prisma, ela sofre um desdobramento nas suas cores consti-
(I) «R,t. n. Q /67 - pds. l/. tuintes - figura I - as quais se podem captar projectando-as
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