Page 181 - Revista da Armada
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Património Cultural da Marinha
             Património Cultural da Marinha


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                    27. A OBRA DE VAN LINSCHOTEN NA BIBLIOTECA CENTRAL DA MARINHA


               A Biblioteca Central da Marinha possui várias obras dos séculos XVI e XVII referentes à histo-
             riografia da expansão incluindo relatos de viagens, nomeadamente de autores estrangeiros, com
             relevo para a obra de Van Linschoten que faz parte do legado do Almirante Gago Coutinho.
               O escrito que queremos destacar, provavelmente redigido em 1596, foi publicado em língua
             flamenga nesse mesmo ano e tal a sua importância igualmente editado em inglês e alemão em
             1598, latim no ano seguinte e em francês em 1610. O exemplar que a Biblioteca é detentora pertence
             à 3ª edição, em francês – Amesterdão, Evert Choppenburgh, 1638 – e é composta de três partes: a
             “História da Navegação”; o “Grande Roteiro do Mar” e a “Descrição da América”.
               Passando a apresentar cada uma das componentes da obra em questão constata-se que a “História
             da Navegação”, também intitulada  “Itinerário”, testemunha os conhecimentos do autor obtidos em
             parte no período de 1580 a 1593, durante o qual, conforme citado no artigo “A historiografia da
             expansão e a influência da obra de Van Linschoten no declínio do Império Português do Oriente”
             desta Revista, viveu em Lisboa, estabeleceu-se em Goa e no regresso à Holanda permaneceu em
             Angra do Heroísmo e escalou Lisboa. Esta parte compreende 100 capítulos contendo 36 gravuras (no
             exemplar da Biblioteca falta a página 40) e 5 mapas, 3 dos quais abrangem as costas banhadas pelo
             Oceano Índico, incluindo o Mar Vermelho e também pelo Oceano Pacífico, desde o Estreito de
             Malaca até às costas da China. Os outros 2 mapas são um planisfério da autoria de Petrus Plancio e
             uma representação de Van Langren da costa de África, da Serra Leoa ao Cabo da Boa Esperança,
             sendo assinalado também, neste mapa, o Cabo de Santo Agostinho na costa brasileira. O “Itinerário”
             tem uma edição em português datada de 1997 da Comissão Nacional para as Comemorações dos
             Descobrimentos Portugueses.
               Junto a esta primeira parte surge a “Descrição da Guiné” que consta de uma narração da costa de
             África desde a Guiné até à Etiópia seguindo a rota do Cabo da Boa Esperança. Este relato é feito com
             a colaboração de Paludamos e refere-se a uma região não incluída no roteiro de Linschoten.
               A segunda parte da obra, “O Grande Roteiro”, desenvolve-se por 57 capítulos onde são apresentadas
             as rotas mais convenientes em direcção ao Oriente nomeadamente para Malaca, Java, Sunda,
             China e Japão, para Sul com destino a África e para Oriente rumo às Antilhas e ao Brasil. Todas as
             descrições, que incluem costas, portos, escolhos, ventos e correntes foram formulados a partir de
             memórias e observações de pilotos portugueses e espanhóis. É inserida nesta parte uma listagem
             das alturas angulares de estrelas de referência correspondentes aos principais portos, rios, cabos e
             acidentes geográficos das costas roteadas e um registo com instruções respeitantes às declinações
             magnéticas na navegação de Portugal para a Índia. O “Grande Roteiro” é concluído com o
             “Extract” que compreende uma relação, referida ao ano de 1578, das rendas, domínios, direitos
             alfandegários, taxas, impostos, tributos, décimos, terças e rendimentos do rei de Espanha sobre
             todos os seus domínios e um breve apontamento sobre as origens dos reis de Portugal, os respectivos
             poderes e governos relativos ao reinado de Filipe II.
               Por último a terceira componente da obra, a “Descrição da América”, que comporta 25 capítulos,
             incluindo um mapa da América Austral, reporta-se aos respectivos países na sua extensão, religião,
             costumes dos seus habitantes e outras características regionais. As Américas Central e do Sul,
             particularmente com algum detalhe o Brasil, são também referidas nestes escritos.
               Conclui-se assim que Van Linschoten, ao coligir informações obtidas a partir da sua vivência em
             terras portuguesas e dos pilotos mais famosos da época, produziu uma obra que contribuiu para um
             melhor conhecimento, no século XVI, do mundo exterior à Europa e possibilitou que outros povos,
             após Portugal, iniciassem a sua expansão principalmente para o Oriente.


                                                                                       Biblioteca Central da Marinha
                                                                                 (Texto de José Luís Leiria Pinto, CALM)
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