Page 121 - Revista da Armada
P. 121
edificação de uma nova carta humana e A problemática africana veio a incrustar- Mota, Marcelo Caetano, antigo Ministro
geográfica do território. -se no pensamento de Teixeira da Mota. das Colónias, e que mais tarde chegará a
Avelino Teixeira da Mota vive intensa- Do gosto pela História e pela Geografia Presidente do Conselho, escreve: “há aí
mente esses anos. Estabelece contactos passara a interessar-se por ciências como a muita investigação, muito estudo e tam-
com personalidades conceituadas do Antropologia, Etnografia ou Topografia. bém o talento arquitectónico e agudeza de
mundo académico e da visão que fazem os ver-
investigação ultramarina, dadeiros escritores.”(3)
especialmente cientistas Também em famoso
franceses e ingleses, que ensaio sobre as “Ideias
frequentemente trabalha- Geopolíticas de D. João
vam em África. Na ver- II”(4) surge a nova di-
dade, a África Ocidental mensão da sua versatili-
Francesa, juntamente dade científica, adquiri-
com os territórios ingle- da em África e enrique-
ses, fervilhava de entusi- cida no aperfeiçoamento
astas, muitos deles inte- de métodos e técnicas,
lectuais e quadros admi- que incorporavam novas
nistrativos, que procu- problemáticas, divergin-
ravam um novo rumo do muito claramente, em
para os estudos africanos muitos casos, das cor-
e de um modo geral para rentes coevas, mais afec-
as ciências sociais. Com tas a uma ideia de
esse intuito começaram a história baseada nos
organizar encontros, feitos heróicos.
com assiduidade, procu- Em fins de 1947 Tei-
rando respostas para xeira da Mota passou à
uma realidade que se Missão Geo-Hidrográfica
transformara por comple- da Guiné. Para trás fica-
to depois da IIª Guerra va o seu brilhante traba-
Mundial. A dinamização lho em solo guineense,
do Centro de Estudos da que motivou um excep-
Guiné neste perío- cional louvor, concedido
do(1945-50) inscreve-se, pelo Governador daque-
assim, num movimento la colónia, “pela perfia-
cultural mais vasto, en- da, inteligente e decisiva
globando o intercâmbio actuação em vários sec-
e a troca de experiências tores da actividade cul-
com o exterior (1). tural da colónia, nomea-
Aproveitando sobeja- damente na organização
mente essa onda reno- do Boletim Cultural, na
vadora, Teixeira da Mota elaboração do Inquérito
enceta, durante os tra- Etnográfico e na prepa-
balhos da Segunda Con- ração das respectivas
ferência dos Africanistas, respostas para publica-
em Bissau, proveitosos ção, actividades em que
contactos com os mem- tem dado sobejas provas
bros da delegação francesa: Theodor O seu estudo sobre “A Descoberta da do seu muito saber, lealdade e superior
Monod, o chefe do grupo, naturalista, Guiné”, que saiu em 1946 no Boletim espírito de colaboração.”(5)
Raymaond Mauny, arqueólogo, A.Villeirs, Cultural da Guiné Portuguesa, agitou as Se antes trabalhara no mato, num con-
zoólogo, Duchemin, Mercier e Robim, águas da historiografia portuguesa, que tacto intenso com as populações e o meio
etnólogos. É com base nesse convívio nesses anos se debatia entre a tradição e a envolvente, agora navegava nos cau-
científico que nasce a ideia de publicar, renovação. O conhecimento directo das dalosos rios da Guiné, sondando, erguen-
através da série “Memórias” do Centro de populações e do meio geográfico, comple- do “torres” hidrográficas, cartografando as
Estudos, obras com interesse para os ter- tado com a utilização de antigos textos, costas e os litorais africanos. Em 1948,
ritórios da África Ocidental. Alguns destes muitos até aí desaproveitados, deram ense- Teixeira da Mota, publica o artigo “D. João
cientistas começam, inclusivé, a colabo- jo ao emérito oficial da Armada de resolver de Castro, navegador e hidrógrafo”(6). O
rar frequentemente no Boletim Cultural, o intricado problema da cronologia, e de objectivo parecia ser claro: convocar a
enquanto Teixeira da Mota é nomeado, todo o processo, que rodeou “descobri- mais conhecida figura científica das expe-
em 1948, membro do Conselho Científico mento” da Guiné. O estudo mereceu fortes dições oceânicas do século XVI para, dessa
do “Institut Français de l’Afrique Noir”, aplausos, de historiadores tão conceituados forma, associar à missão hidrográfica o
sediado em Dakar. como Duarte Leite, Damião Peres ou passado grandioso da Marinha Portuguesa.
Do lado português, por seu turno, tam- Magalhães Godinho. A promoção a Primeiro-tenente vem a
bém se incrementam os estudos e investi- A “experiência” africana culminaria na suceder no ano de 1953 (31 de Março).
gações ultramarinas, através de funcioná- edição, em 1954, em dois volumes, do Ainda nesse ano é encarregado pelo Minis-
rios do quadro administrativo da “Guiné” - estudo mais completo que se fizera até tério dos Negócios Estrangeiros de fazer o
António Carreira, Rogado Quintino, então sobre a “Guiné Portuguesa”(2). Os inventário e reprodução fotográfica da car-
Mendes Moreira ou Artur Meireles, que dois tomos são o resultado de mais de uma tografia portuguesa antiga e da cartografia
retiram importantes conclusões a partir do década de estudo, trabalho e recolha de dos territórios ultramarinos. Aproveitando a
Inquérito Etnográfico de 1946. elementos. Em postal enviado a Teixeira da interrupção dos trabalhos hidrográficos,
REVISTA DA ARMADA • ABRIL 2002 11