Page 370 - Revista da Armada
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O Amor Visitou a Terra
O Amor Visitou a Terra
e o Natal Nasceu
e o Natal Nasceu
grande segredo de Deus está desvendado: nasceu Jesus em palavras tão frágeis como “nascimento”, “criança” (...) tempo de
Cristo! Ele quis ser um de nós, assumindo a nossa condição tantos silêncios e de tantas contemplações. Tempo de preparar para
Ohumana e vivificando a nossa história pessoal. acolher, mais do que armazenar para consumir. Tempo de repartir
Este é o eterno mistério da fé, o grande segredo do amor: a vida, mais do que enviar recados e embrulhos. Tempo de procu-
Jesus Cristo acaba de nos visitar! Acto gratuito de quem é rar, tempo de inconformismo, tempo de criatividade, para que o
Deus: Et Verbum caro factum est. Na história da Huma- amor, o bem, a beleza, possam ser realidades e não apenas desejos
nidade o ontem cessou! de intenção.
Nunca saberemos a hora do nascimento de Jesus Cristo. Tempo de dar tempo a tanto esquecido e banalizado: bei-
A Igreja escolheu o dia 25 de Dezembro para cristianizar jos, abraços, lágrimas – há já quem não saiba chorar, ou
uma grande festa pagã que se fazia em Roma nesse dia: DIES mesmo já não tenha lágrimas para o fazer, dizer o quanto
NATALIS SOLIS. A partir desse momento esta é a festa do precisamos de alguém, sem vergonha de parecermos piegas.
Dies Natalis Domini que emerge na madrugada – uma sur- É o tempo favorável de perguntar: “há quantos anos, há quantos
presa escondida na noite. A noite que é sempre filha do caos e longos meses, desisti de renascer”? Tempo para contemplar o infi-
mãe do céu. Engen- nito na história huma-
dra o sono e a morte, na, o inesperado no
os sonhos e pesade- rotineiro, o divino no
los, a ternura e o en- humano, porque o
gano. A noite que rosto de um Homem,
sempre simbolizou o nos devolve o rosto de
tempo das gestações, Deus. Que paradoxo
das germinações, gratuito perante a vo-
que irromperão em racidade mercantil dos
pleno dia como ma- nossos dias!
nifestações de toda a É este Presente
força vital. O que o Eterno que nos en-
invólucro esconde é sina a verdadeira fra-
a semente poderosa ternidade. Ali não se
do dia. É portanto prega a luta de clas-
momento e tempo de ses. Lá estão os po-
virtualidades, de pul- bres – os pastores, e
sões interiores, de os ricos – os reis Ma-
pensarmos na pre- gos. Todos têm um
existência das coisas lugar no coração de
e das pessoas. Jesus. Deus não quer,
A noite de Natal é nem a exploração
tempo de conceber o nem a ganância, nem
futuro – “Quanto a revolta nem a inve-
mais negra é a noite, mais carrega em si o amanhecer.” ja. Quer a harmonia, a justiça e a caridade entre todos.
(Tiago de Mello). É tempo de preparação e espera activa do Como é possível apresentar ao género humano, do nosso tempo,
novo dia, donde brota, ao alvorecer, o sol invencível, a luz a experiência perturbadora duma PRESENÇA, sem excluídos, do
plena, o grito de espanto diante do calor de Deus eterno. Anunciador e Portador de uma graça, da ilimitada capacidade de
Uma criança que nasce de uma virgem (puer natus est conceder e pedir perdão, de enxugar todas as lágrimas,... se conti-
nobis) é sinal de contradição para ontem, para o hoje e para nuamos a afirmar e a usar o medo e o temor em vez da esperança; o
o nosso futuro. fogo do Inferno em vez do fogo do Amor; um vale de lágrimas em
O presépio é sempre uma realidade nua e crua, de gente lugar de caminhos de luz e de vida; de um desterro em vez de um
viva sem nome e sem terra, e que tem apenas a rua como reino já presente no meio de nós; de pobres pecadores – que além
acolhimento. É um teatro vivo, carnal, a transportar-nos até de pobres ainda carregam em si o estigma de serem pecadores, em
às origens da humanidade. No frágil e no pequenino pers- vez dos ricos em verdade e espírito.
crutamos o eterno. A madrugada fria e a ausência de cari- Esta FESTA que se faz e vive em nós, não desiste de novos céus e
nho desta humanidade, acolhe um corpo frágil: o Criador nova terra, onde reine a justiça e a paz (Ap. 21-22) apesar dos case-
do Universo, apenas envolto pelo calor da criação que quer bres onde esse Deus, feito menino, não encontra possibilidade algu-
ver vivo tudo o que nasce e deve viver. ma de nascer.
Os anjos preanunciam um novo tempo – vitória sobre a com- Entremos definitivamente no advento d’Aquele que vem do futuro,
plexidade e ansiedade, bem como a conquista da paz interior e da fermentando de muitos modos, e de muitas formas o nosso presente!
confiança em si mesmo. No amanhecer de Deus recebemos a Não resignes da condição de celebrante, tu que és NATAL!
madrugada de um mundo novo impregnado de luz e vida. Tudo
adquire a sua forma verdadeira. A todos os profetas da esperança, a todos os desanimados e abati-
Deus faz-se um de nós, leva-nos a dianteira no anúncio e na dos, um Santo Natal e um Ano Novo de eterna juventude!
busca incessante de um mundo repleto de bênçãos, de paz e
justiça para todos. P António Beltrão
e
Este é o tempo privilegiado de descobrir a novidade escondida CMG Grad/Capelão
8 DEZEMBRO 2002 • REVISTA DA ARMADA