Page 100 - Revista da Armada
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afundamento. Importaria, ainda, aferir, States (PS). A irregularidade de procedi- parece ser uma medida apropriada, quer
se o comportamento do Estado vizinho mentos assumida em sede de inspecções em termos preventivos, quer em termos
de alguma forma terá agravado o risco – num dado Estado, manifestar-se-á, sem de conceito de navegabilidade da ZEE.
que era já premente -, e se designada- qualquer dúvida, nos espaços marítimos Desde que devidamente enquadrados
mente reenviou a ameaça para outras de outro, o que obriga a esforços acresci- em termos de direito internacional,
águas, o que faria enquadrar o assunto dos de cooperação técnica e institu- tomando em consideração o nº2 do arti-
no artigo 195º da Convenção das Nações cional, designadamente a entendimentos go 56º conjugado com o artigo 87º, e
Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM). bilaterais ou multilaterais no sentido de nº2 do artigo 58º, todos da CNUDM,
Isto, insiste-se, confirmando-se alguns assumir esquemas mais fechados de fis- designadamente ressalvando a questão
elementos de facto dos quais se não dis- calização e controlo. da sua publicitação, e ponderando-se,
põe conhecimento oficial. 4. Se a CNUDM fosse (pudesse ser) claro está, a tipologia e gravidade das
totalmente exequível nos seus preceitos mencionadas irregularidades.
QUESTÕES AGREGADAS. O NAVIO programáticos e mesmo de índole técni- 4. A problemática das zonas de refú-
COMO FONTE DE AMEAÇA ca, o estipulado nos artigos 92º e 94º gio, por demais conhecida, assumindo-
deveriam ser de aplicação impositiva, o -se mesmo como uma das prioridades
Na sequência das preocupações insti- que obrigaria os Estados de bandeira a das políticas europeias de segurança
tucionais que se foram adensando desde manterem as suas frotas dentro dos li- marítima. Sem dúvida é uma medida
a ocorrência do caso “PRESTIGE”, mites standard exigidos pelas conven- necessária, desde que devidamente
assumiu-se como elemento de aprecia- ções internacionais, designadamente a enquadrada nas restrições ambientais
ção fundamental, relativamente a outros MARPOL e a SOLAS, o que, notoria- existentes nos quadros legais internos.
navios que normalmente navegam em mente, não ocorre.
águas jurisdicionais portuguesas, o Do que vem dito e em quadro breve
determinar se os mesmos constituem, de No âmbito do dramático enquadra- interessará reter os seguintes elementos
facto, uma ameaça ao meio marinho, mento factual ocorrido nas costas da conclusivos:
somente pelo facto de, estruturalmente, Galiza, os Estados francês e espanhol
serem navios-monocasco, ou já terem prepararam um texto protocolar cujo 1. Existindo um quadro de ameaça
uma determinada idade de construção. substrato substancial, assinado em efectiva ou potencial para o meio mari-
E, consequentemente, se tal condição Málaga em 26NOV2002, se baseia num nho sob jurisdição do Estado costeiro,
bastará para assumir, perante tais navios, quadro de preocupações actuais, legíti- designadamente no quadro de requisitos
procedimentos de Estado de tipo banning mas e notoriamente sensíveis em termos jurídicos esquematizado pelo artigo
das suas águas jurisdicionais, o que da actuação dos Estados costeiros. Neste 221º da CNUDM, existirá uma base sus-
equivaleria à sua qualificação, generalista sentido analítico, afigura-se que do texto tentada para se assumirem medidas
e a priori, como navio substandard. do protocolo devem ser ressalvados, pela específicas e proporcionais em relação
Assim, importará atentar na seguinte linha sua importância, os seguintes pontos: ao navio em causa. O Estado Português,
de apreciação: com sustento em tal moldura jurídica,
1. A criação de um certificado determinou a não entrada do “PRES-
1. A preservação do meio marinho é, europeu de conformidade que poderá TIGE” em águas jurisdicionais nacionais
sem dúvida, a grande prioridade para as ser utilizado para condicionar a entrada ao navio.
políticas do Mar do Séc. XXI, sendo em portos europeus. Esta medida, desde 2. Não parece existir uma predomi-
mesmo o exemplo perfeito da necessi- que sustentada legalmente, parece ade- nância abstracta e genérica do princípio
dade absoluta de conjugação dos quada e eficaz, e permite assegurar uma da protecção e preservação do meio
esforços dos Estados (fundamentalmente salvaguarda integrada das efectivas marinho em relação ao princípio da
os do território) na senda dos pressupos- condições de navegabilidade standard liberdade de navegação, embora se
tos conceptuais da assinatura da dos navios. entenda que a tendência internacional
CNUDM em 1982. A Convenção dedica 2. A obrigação imposta aos capitães parece caminhar no sentido de submeter
a este princípio, estruturalmente, toda a dos navios com deficiências previa- os interesses de cariz comercial aos de
Parte XII do seu articulado (artigos 192º mente detectadas de, no prazo de 48 h cariz ambiental. É no quadro casuístico
a 237º), entendendo alguma doutrina antes da chegada do navio ao porto, de cada situação em concreto que terá,
que esta parte constitui um verdadeiro notificar as respectivas anomalias refe- contudo, que ser encontrada a análise
código de direito ambiental do mar. renciadas. Medida analogicamente sus- devida.
2. A prioridade apontada em 1 encon- tentada, inclusive, nos procedimentos 3. Não se encontrando preenchidos os
tra-se perfeita e expressamente identifi- vigentes em âmbito do Port State requisitos objectivos do artigo 221º da
cada no ponto XI, nºs 41, 42 e, sobretu- Control, e que permitem uma verifi- CNUDM, apenas se entenderá como
do, 48, da Resolução aprovada recente- cação atempada da ficha técnica dos admissível um quadro de proibição (ou
mente em sede das Nações Unidas - dia navios e respectivas deficiências técni- restrição) à navegação em situações de
12DEZ2002 - sob o ponto de Agenda cas e estruturais detectadas em falta de cooperação objectiva por parte
25.a. e com o registo A/57/L.48/Rev.1, a inspecções anteriores. Tal verificação, dos responsáveis do navio, designada-
qual Portugal subscreveu. O ponto 48 ocorrida em tempo útil, permite – se mente pela não disponibilização de infor-
constitui mesmo, sabe-se, uma menção caso disso - activar determinações das mação e documentação relativa ao navio
directa aos recentes acontecimentos autoridades competentes do Estado da e à carga, sendo sempre possível, ainda,
ocorridos com o navio “PRESTIGE”. costa (autoridades marítimas, IPTM e activar medidas de visita/inspecção na
3. Os esquemas jurídicos criados para mesmo autoridades portuárias), no senti- oportunidade, distância e exigências tidas
instituir métodos de controlo e inspecção do de permitir ou restringir a navegação por necessárias e adequadas, mecanis-
a navios estrangeiros indiciam, num e rota do navio em causa. mos que encontram repouso no estipula-
quadro claro de pressupostos, a interli- 3. O estabelecimento de uma distân- do, entre outros, nos nºs 3 e 6 do artigo
gação institucional entre Estados e a cia preventiva suficientemente alargada 220º e artigo 226º, da CNUDM.
adopção de regras técnicas comuns entre para a navegação de navios de países
todos eles, quer actuem como Flag States terceiros que tenham sido objecto de Dr. Luis da Costa Diogo
(FS), quer actuem na qualidade de Port denúncia de irregularidades constatadas Assessor do VALM DGAM
26 MARÇO 2003 • REVISTA DA ARMADA