Page 225 - Revista da Armada
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nam eficaz aquele exercício (embora não cana e inglesa, para combater tais ameaças, distribuição e entrega, e bem assim ma-
de uma forma que, inclusivé, poderia ser evitando, desta forma, o seccionamento de teriais conectos, por via marítima. Um
mais acutilante). circuitos económicos e o arquipelagamento dos pilares de preocupação presentes nos
O mar é uma via com características de determinados Estados da região. trabalhos (princípios de interdição, apro-
próprias, sobretudo face à sua dimensão, A apreensão dos novos objectivos das vados em Paris sob a forma de Declara-
às alternativas de circuitos de navegação redes terroristas terá que estar, pois, na ção, Statement on Interdiction Principles), é
que oferece, e portanto, devido à inviabi- primeira linha das estratégias de comba- a possível intercepção de carregamentos
lidade de um exercício de controlo total e te público ao fenómeno do terrorismo. A suspeitos, sobretudo aéreos e navais, no-
eficaz, considerando, ainda, a vasta diver- prioridade, isso é claro, tem que ser con- vas fórmulas de abordagens em alto mar
sidade de alvos existentes nos oceanos. A cedida à cooperação policial e aos servi- (e espaços jurisdicionais), controlos adua-
indetectabilidade de determinados fenó- ços de informações, porque, além do mais, neiros (em sede portuária) ou científicos,
menos, pela própria natureza do transpor- nem sempre os terrorismos de nova face e, ainda, troca de intelligence entre Estados.
te, e o quadro jurídico inerente aos espaços transnacional requerem o mesmo tipo de Particularmente, é elemento de considera-
marítimos (algo permissível pela nature- análise que – por exemplo - os movimen- ção específica a possibilidade de autoriza-
za da moldura internacional actual e pela tos de índole islâmica que têm objectivos ção prévia por parte de Estados a inspec-
morfologia do meio), cria, irrecusavelmen- políticos concretos, num determinado país ções a navios com o respectivo pavilhão a
te, uma teia de permeabilidade algo difícil ou região, podendo até fomentar vontades efectuar por navios terceiros, no quadro
de ultrapassar. É sabido que a via maríti- e mecanismos de operação diferenciados, do Acordo (quando estiver em plena exe-
ma tem sido usada como via de comunica- e ter graus de aceitação dispares. Funda- quibilidade). Os engulhos legais que o ac-
ção privilegiada para a movimentação de mental, perante a ameaça terrorista, são os tual quadro do Direito do Mar, em deter-
armas e outro equipamento, pessoal e di- sistemas e redes de informações. E o mar, minados espaços (ZEE e ZC), conceptual
nheiro, entre as bases logísticas e as células vimo-lo já, é uma via privilegiada de actua- e juridicamente ainda suscitam, trazem à
operacionais de todos os continentes, ten- ção. Pela vulnerabilidade natural, e pela colação, contudo, novas e profundas ne-
do as organizações terroristas, para prosse- ausência, na maior parte dos países, de sis- cessidades de reflexão.
cução dos seus objectivos e operações, que temas de informação de tratamento de in- A diferenciação dos alvos potencial-
dispor de navios mercantes de diversos ti- formação específica em âmbito marítimo, mente atingíveis, e os vários interesses
pos, quer operando como armadores, quer as quais exigem, claramente, cooperação que constituem a visão de estratégia ma-
por recurso ao charter, como lembra Fonse- reforçada entre autoridades de polícia, au- rítima do Estado nos seus espaços sobera-
ca Ribeiro (4). Tais actividades encontram- toridades portuárias e Flag States. nos e jurisdicionais, tornam cada vez mais
-se, o mais das vezes, associadas a fenóme- Em termos de abordagem à res mariti- visível a aferição das novas ameaças, sua
nos de procura do vazio ou do elemento ma, é, pois, imprescindível uma avaliação fenomenologia, e elementos de avaliação.
permissível da lei, isto é, procura de segun- sistémica ao perfil de Autoridade que os É por isso, também, que ao mar (tomado
dos registos ou os designados registos de Estados costeiros têm que assumir, em ter- em sentido amplo), cada vez mais, tem que
conveniência, alternativas para mudança mos de espaço marítimo, orla costeira e zo- ser dispensada uma visão pública interde-
de registos administrativos mais vulnerá- nas ribeirinhas, incluindo o – vulgarmente partamental, mas é nele, também, por ex-
veis, execução de obrigações inspectivas designado - domínio público marítimo. A celência, que o exercício unitário de auto-
em Estados previamente seleccionados, vulnerabilidade, dir-se-ia quase excessiva, ridade assume características de exemplo
e alteração/adulteração de designati- dos pólos logísticos ligados à actividade académico.
vos e conjuntos identificativos em plena marítima, começando nos próprios navios- Z
operação/navegação. Todos estes casos, -plataforma, e nas instalações portuárias, Luís Costa Diogo
e mais alguns outros, tornam as tarefas elucida, de sobremaneira, a vastidão da Assessor do VALM DGAM
dos coastal states ciclópica, nomeadamen- preocupação. As infra-estruturas portuá- Notas
te ao nível da assunção dos mecanismos rias especificamente afectas ao gás natural (1) Este vocábulo – security - tem tido, repetidas
de controlo que hoje já se encontram ao liquefeito, aos químicos e aos crudes e bem vezes, noções diferenciadas, algumas das quais sem
qualquer tipo de tradução prática e, outras, signi-
seu dispor no âmbito do Port State Control assim espaços e zonas de desembarque, e ficados pervertidos face ao seu real conceito. A sua
(PSC). A nível da União Europeia, desde estada, de passageiros, exigem, cada vez oposição à definição de safety tem constituído, cons-
1995, tem sido desenvolvido um esforço mais, diagnósticos consistentes sobre ce- ciente e inconscientemente, a melhor forma de situar
sustentado e compacto para regulamen- nários de crise e planos de contingência. a sua substância que é, indubitavelmente, referencia-
da em termos de segurança de pessoas e bens. Física e
tar tais matérias, como é prova o asservo Assim como o exige a legislação marítima patrimonial. A ténue divisão que, contudo, o amplo
normativo já publicado: Directiva nº 95/ de especialidade sobre lotações de navios fenómeno da segurança marítima actualmente com-
21/CE, do Conselho de 19JUN, Directiva e níveis mínimos de operação (especifica- porta, designadamente ao nível de novos formatos
nº 96/40/CE, da Comissão, de 25JUN e mente em zonas mais afastadas das cos- de intervenção nos portos e águas interiores como o
Directiva nº 98/25/CE, do Conselho, de tas), designadamente ao nível de aborda- ISPS Code (que recebeu a tradução legal de Código
Internacional para a Protecção dos Navios e das Instala-
27ABR, entre algumas outras. gens vindas do exterior perpetradas por ções Portuárias, opção terminológica que não comen-
Não parece, contudo, abrangente o su- embarcações mais pequenas, ou, ainda, taremos), instituído no âmbito da Convenção SOLAS
ficiente, situar o já designado terrorismo acções puras de pirataria. (Safety of the Life at Sea), vem tornando cada vez mais
marítimo apenas no quadro dos ataques Neste campo, o contributo concep tual complexas as noções de segurança aplicadas somen-
te a pessoas e bens, e/ou aplicada ao fenómeno da
perpetrados por navios, embarcações de dos novos contornos da Proliferation Secu- navegabilidade segura.
abordagem e lanchas voadoras contra na- rity Iniciative (PSI), ou de outras iniciativas (2) Lembrando que a UE é o principal parceiro co-
vios mercantes. Como aconteceu, inúme- de igual teor, é fundamental. A sua base mercial de dois terços do planeta, constituindo um
ras vezes, durante a Guerra Irão-Iraque substantiva encontra-se sustentada num plano aberto de mercados e fronteiras um dos princi-
(1984-87), no Golfo Pérsico e no estreito documento do departamento de Estado pais objectivos da política comercial da União.
(3) Menciona-se, entre outros mecanismos, que os
de Ormuz, em que as lanchas iranianas norte-americano, de SET2003, designado navios terão que ter instalados, no mínimo, dois bo-
se especializaram na abordagem a navios Proliferation Security Iniciative: Statement tões de alarme em locais diferenciados do seu plano.
mercantes (sobretudo os que transporta- of Interdiction Principles, e num documen- Mas aferem-se, actualmente, quais os órgãos/enti-
vam determinadas cargas) de grandes di- to que inclui um anteprojecto de acordo dades responsáveis posteriormente ao ataque. En-
contram-se, também, previstos, níveis diferentes de
mensões. Os navios-escolta, e as cinturas entre os Governos visando a cooperação segurança, matéria que, pela sua extensão e particu-
de protecção marítima foram, entre outros, para suprimir a proliferação de armas de laridade, não aprofundaremos nesta sede.
cenários utilizados pelas Marinhas ameri- destruição em massa, seus sistemas de (4) Artigo da Revista Visão.
REVISTA DA ARMADA U JULHO 2004 7