Page 109 - Revista da Armada
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Setting Sail
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              11. BRIGUE


              Brigue é o nome dado à armação que caracteriza o veleiro de dois  leituras, que a expressão «navegar à bolina» possa radicar na utiliza-
            mastros exclusivamente redondos. Ou seja, aquele em que a partir dos  ção deste expediente antigo. A sua acção obsta a que o vento entre
            dois mastros reais espigam outros tantos mastaréus, neles cruzando ver-  por ante a vante da vela redonda, proporcionando assim um certo
            gas que se desenvolvem simétrica e horizontalmente para ambos os  resguardo relativamente à situação de pano sobre, vulgarmente ape-
            bordos. Importa referir que o pano redondo pode ainda ser prolongado  lidada de «pano às costas».
            por velas auxiliares – varredouras, cutelos e cutelinhos –, na máxima
                                                               Braços – Cabos existentes aos pares, um em cada bordo, que fazem
            extensão dos respectivos paus. Esta armação conta também com ve-  arreigada no lais das vergas redondas, dizendo habitualmente para
            las latinas, de proa e entremastro, além da vela-ré. Em finais do século
            XVIII, altura em que em Portugal parece assomar o anglicismo brigue,   ré (5). Como vimos anteriormente, a sua função consiste em aguen-
            o nome começou por ser usado para classificar navios de guerra de   tar as vergas na posição desejada, podendo-se, através da respectiva
            menor porte, geralmente armados com 12 a 20 peças de artilharia, e   manobra, movimentá-las horizontalmente, de maneira a optimizar a
            cujo aparelho, acomodava, precisamente, as características enunciadas.   mareação das velas. No caso do brigue, dada a falta de espaço a ré
                                                              para actuar nos braços das vergas mais altas do mastro grande, estes
            Ao que apurámos, os indícios apontam no sentido deste ter sido, por
            essa época, adoptado do inglês brig – ainda hoje usado naquele idio-  trabalham dizendo para vante (6), embora a sua manobra seja, como
            ma para classificar este tipo de armação –, que por sua vez resultou da   se depreende, executada ao nível do convés, em sentido contrário.
            simplificação do vocábulo brigantine que se encontra na sua génese.   Cesto – Género de plataforma assente no calcês dos mastros reais,
            Embora, a raiz etimológica deste último pareça estar intimamente re-  ou dos próprios mastaréus, cuja finalidade é espalhar a enxárcia do
            lacionada com a palavra italiana brigantino, que qualifica aquele que  mastaréu que se situa imediatamente acima, servindo ainda como
            briga ou luta, tendo-se eventualmente constituído esta peculiar faceta  ponto de sustentação aos marinheiros que trabalham na mastreação.
            como a responsável pela designação itálica para aquela sorte de na-  Por vezes, para maior protecção destes, o cesto dispõe de uma pe-
            vios de guerra antigos, de meado do século XIV. Embora pouco exac-  quena balaustrada guarnecida com rede. Toma o nome do mastro ou
            tas para classificar este tipo de aparelho, podemos deparar-nos com a  mastaréu onde se encontra instalado: cesto do traquete (7), cesto do
            denominação barca de dois mastros ou ouvir dizer que o navio arma  grande (8), cesto de gávea do traquete ou do velacho (9), cesto de gá-
            em dois mastros de galera. Ainda relacionadas com a armação em aná-  vea do grande (10), etc.
            lise, ocorrem as variantes brigue-barca e brigue-escuna. Na primeira, as
            afinidades quedam-se pela evidência da própria grafia, uma vez que   Mastros – Gurupés (A), traquete (B), grande (C).
            é o termo com que no Brasil se classifica a armação de veleiro conhe-  Mastaréus – Pau da bujarrona (D), velacho (E), gávea (F), joanete de
            cida entre nós como barca. Quanto ao segundo caso, julgamos tratar-  proa (G) e joanete grande (H).
            -se de pequena nuance do navio que arma em brigue, diferindo des-
            te pelo facto do mastro de proa não largar sobre-joanetes nem dispor   Velas de proa – Polaca (11), bujarrona (12) e giba (13).
            de cesto de gávea, contando o mastro grande igualmente com vela-ré   Velas do traquete – Traquete redondo (14), velacho (15), joanete de
            em latino, mas espigando aí um único mastaréu, onde tão-só larga gá-  proa (16) e sobre-joanete de proa (17).
            vea e joanete. Pelo que antecede se conclui, que, neste último caso,
            a primeira verga redonda será seca. Donde, em nossa perspectiva, a   Velas do grande – Grande redondo (18), gávea (19), joanete grande
            sua vantagem quase se esgotar no menor número de marinheiros que   (20), sobre-joanete grande (21), sobre-joanetinho grande ou sobrinho
            a sua tripulação exige, para além da mais simples e óbvia, que passa   (22), e vela-ré (23)
            pela inferior despesa em paus – vergas e mastaréus –, igualmente re-  Vela de entremastro – Vela latina que enverga em estai que passa
            flectida no preço duma andaina aquando da necessária substituição.   de um a outro mastro, fazendo maior ou menor ângulo relativamente
            Além da cambiante do brigue ora referida, existe uma outra apelidada   ao convés, ou à linha de água. A vela que nele enverga, regra geral
            de polaca, arcaicamente polacra, que conheceu particular utilização   toma o nome do local do mastro de ré onde esse estai faz arreigada.
            no Mediterrâneo. Esta somente difere das expostas particularidades   No caso da imagem do brigue que se apresenta em anexo, podem-
            do brigue pelo facto de a partir dos seus mastros não espigar qualquer   -se observar as seguintes velas de entremastro: vela de estai de gávea
            mastaréu, nem o seu aparelho contar com vaus ou cestos de gávea,   (24), vela de estai de joanete (25), vela de estai de sobre-joanete (26)
            cruzando nos mastros reais mochos, mais resistentes e de maior guin-  e vela de estai do galope do grande (27). De notar que, contando
            da, a totalidade das vergas redondas.             de baixo, a primeira e quarta velas de entremastro são triangulares,
              Amante de bolina – Conjunto de cabos composto pelo amante,   de resto o feitio mais comum, enquanto que as restantes têm forma
            poa e bolina, conhecido o ponto da sua junção como pé-de-galinha   quadrangular. O mesmo que vela de estai de entremastro.
            da bolina (1). Os dois primeiros fazem fixo por intermédio de ilhoses   Velas auxiliares – Cutelo do velacho (28) e cutelo, ou cutelinho, do
            ou garrunchos nas testas dos papafigos ou outras velas redondas, per-  joanete de proa (29). Estas envergam nos paus com o mesmo nome,
            mitindo, com a sua acção, chamar mais para vante a testa de barla-  que se prolongam a partir das respectivas vergas redondas. Saliente-
            vento da vela, nomeadamente nas situações em que se navega com   se que o lado superior e inferior destas velas recebem denominação
            vento escasso, ou simplesmente quando o valor da sua marcação se   idêntica à que encontramos no restante pano redondo, respectivamen-
            encontra claramente para vante do través. Poa (2) é a designação que   te gurutil e esteira, ao passo que os lados verticais tomam aqui nomes
            recebe o cabo inferior, cujos chicotes são fixos na testa da vela, for-  desiguais, testa de dentro (30) e testa de fora (31).
            mando como que uma pequena alça. O amante (3), o cabo superior,
            difere do primeiro pelo facto de apenas um dos seus chicotes fazer
            fixo na testa da vela, enquanto o outro, aguentado por um saptilho,          António Manuel Gonçalves
                                                                                                         CTEN
            enfia o seio da poa. No entanto, é a partir do seio do segundo que se              am.sailing@hotmail.com
            entra para levar a testa da vela para vante, alando, no convés, pelo
            cabo apelidado de bolina (4). Consideramos, pelo cotejar de variadas               Desenho: Aida Colaço
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