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HIERARQUIA DA MARINHA 7
CAPITÃO-DE-MAR-E-GUERRA
Oposto de capitão-de-mar-e-guer- uma Consulta do Conselho Ultramarino, lutamente no seu navio, e é o mesmo que
ra é genuinamente português e datada de 7 de Outubro de 1677, que refe- Governador de uma Praça, e nele se não
surgiu nos princípios do século re uma petição colectiva dos capitães-de- deve obrar coisa sem a sua vontade”.
XVII. O documento mais antigo que se -mar-e-guerra dos navios que iam para a Relativamente às competências técnico-
conhece, datado de 5 de Novembro de Índia. Era pedido ao rei que lhes fossem -navais dos capitães-de-mar-e-guerra,
1617, diz respeito a D. Nuno de Sotto- atribuídos durante a viagem, para seu diz: “… deve saber marcar o Sol… co-
mayor, capitão-de-mar-e-guerra embar- serviço particular, um marinheiro, um nhecer a variação da agulha…,…safar
cado no patacho N. Sr.ª da Candelária, grumete e seis homens de armas. Afirma a nau para combate e manobrá-la para
que foi obrigado a arribar, quando fazia Valdez dos Santos (ob. cit. p 15), que o pe- ganhar barlavento”.
parte da Armada que, em 21 de Abril de dido foi deferido, como comprova uma
1617, partiu para a Índia, sob comando do certidão passada pelos oficiais da Casa da As atribuições dos capitães-de-mar-
Vice-Rei D. João de Coutinho. Índia e Mina, assegurando “ser uso anti- -e-guerra foram devidamente regula-
go darse essa regalia”. mentadas no regimento de 31 de Março
Segundo Valdez dos Santos, em A de 1722 (Regimento do Capitão de Mar
Hierarquia Naval (Academia de Mari- Um códice existente na Biblioteca da e guerra e mais officiais das Fragatas da
nha, 1984), o posto de capitão-de-mar- Ajuda, intitulado “Compendio do que Coroa, códice nº 185 da Colecção Pom-
-e-guerra foi atribuído aos capitães dos pertense a & obrigação de hum Cappam balina, Biblioteca Nacional, reservados)
navios que passaram a ter, além das suas de Mar e Guerra” (cota 46-VIII-26), não e no regimento de 24 de Março de 1736
funções náuticas, as de guerra, com o co- datado, mas com letra que parece ser da (Regimento dos capitães de mar e Guerra
mando de toda a tripulação, quer fosse 2ª metade do século XVIII, afirma que: “O em Segundo nas Naus do estado, e dos
gente do mar para a manobra, quer fosse capitão de mar e guerra deve ser ciente, capitães de Infantaria com exercício de
gente de guerra para combater. valoroso, robusto, sofredor de trabalho, capitães tenentes, e dos Tenentes e Alfe-
vigilante, afável, rigoroso, cortês, liberal e res que embarcassem nas mesmas, códi-
Do início do século XVII existem no sobre tudo bom Cristão.” ce nº 185, colecção Pombalina, Biblioteca
Arquivo Histórico Ultramarino várias pe- Nacional, reservados.
tições de capitães-de-mar-e-guerra. Con- António do Couto de Castelo-Branco,
tudo, é a partir de meados do século XVII na obra Memórias Militares (1707), refere António Silva Ribeiro
que são mais frequentes as referências que “o posto de Capitão de Mar e Guer- CALM
a este posto. Entre outras, pode citar-se ra é de grande autoridade, manda abso-
VIGIA DA HISTÓRIA 34
O PLANO INCLINADO
Durante muito tempo a reparação la cidade, o privilégio de estabelecerem sibilidade de reparar diversos navios ao
de navios era efectuada pelo em Lisboa “O Plano Inclinado ou Escor- mesmo tempo, quer quanto à redução,
processo de querenagem, que regadio para a Querena, Reparo, Con- de custos, das necessidades de mão de
consisitia em deitar o navio sobre um serto e Estacionamento tanto de Navios obra, da duração da reparação e ao au-
dos lados, quer na praia quer no mar, de Guerra como Mercantes“. mento da segurança.
neste caso sobre embarcações, e efectuar
o mesmo tipo de operações para a repa- Para a concretização do projecto iria A última vantagem enunciada pren-
ração no bordo oposto. ser constituida uma “Companhia Que- dia-se com a eventual redução dos pré-
renante Lusitana“ de que seriam sócios mios dos seguros já que seria possível
A técnica de reparação teve uma me- os concessionários e Manuel Luís dos com maior frequência fazer a verificação
lhoria significativa com a utilização dos do estado dos navios.
diques 1 e, após 1820, com o aparecimen- Santos, construtor naval 2, sendo o plano
to dos planos inclinados que, em Portu- instalado na Boavista, em Lisboa, na di- Com. E. Gomes
gal, “sempre tardo e vagaroso em abra- recção da Bica dos Olhos, encontrando-
çar as úteis invenções“ no dizer de Ma- -se prevista igualmente a construção, a Notas:
nuel Luís dos Santos, autor de uma me- curto prazo, de um outro plano inclina-
mória sobre o assunto, só começaria a do na cidade do Porto. 1 Ao tempo e durante muitos mais anos somente existia um
ser considerado em 1844. dique, o da Ribeira das Naus em Lisboa cujos defeitos o autor da
A memória de Manuel Luís dos San- memória refere e que era fundamentalmente para utilização dos
Em Agosto de 1844 foi concedido, a tos, publicada em Agosto de 1844, para navios de guerra.
João Eccles Martin, negociante inglês no além de descrever sumariamente o
Porto e a Bernardino Joaquim de Azeve- equipamento enuncia um conjunto de 2 Manuel Luís Santos foi também autor, em 1832 , de duas me-
do, construtor de navios também daque- vantagens relativamente aos processos mórias sobre a Real Escuna de D. Miguel I, assinando em ambas
existentes, quer no que se referia à pos- como construtor naval do Arsenal da Ribeira das Naus, o facto
de não o fazer na memória de 1844 faz supor que já não o fosse,
eventualmente devido à circunstância de ter servido D. Miguel.
29REVISTA DA ARMADA • JULHO 2011