Page 2 - Revista da Armada
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Viagem de Cadetes da Reserva Marítima
NE SAGRES – 1953
Foi no Verão de 1953 que, após vários dias de mar, sem
terra à vista, nem adivinhar para onde o Comandante
Dentinho nos estava a levar, acabámos por alcançar terra.
Era terra Lusa: Lagos (Algarve).
Já o Sol se encaminhava para outras longitudes, quando o
pano foi arreado e a SAGRES rumou com o seu fraco motor
para fundear na baía de Lagos.
Chegados que fomos ao ponto que o Cdt. Dentinho con-
siderou como mais conveniente para fundearmos, foi o
ferro largado.
Só que aconteceu o mais inesperado: ao bater no fundo,
o ferro soltou-se por se ter partido o anete. E assim ficou a
SA GRES com a amarra penduradíssima e à deriva...
Deixando-nos o Sol em adiantado estado de ocaso, nada
mais restou do que voltar à “segurança” do mar alto. Por
onde nos mantivemos durante toda a noite.
Logo que os primeiros laivos de luz se adivinharam no
horizonte, rumámos de novo a Lagos.
Arreado todo o pano, entrando com o motor muito devagar,
parámos perto da bóia de arinque. Desceu então o comandante
(“fardado” de calções e camisola de alças) para um bote onde
jingou até à bóia de arinque.
Aí chegado foi ele que, após localizar a prumada da bóia,
deu indicações para posicionar a SAGRES no local que lhe
pareceu mais conveniente.
E ordenou então o arriar do segundo ferro. E sondou
de novo a boia de arinque, após o que ordenou levantar o
se gundo ferro.
Ferro esse que, quando surgiu fora de água, nos surpreen
deu com a apresentação do ferro perdido no dia anterior pen-
durado numa das suas patas! O segundo ferro fora largado
com tamanha precisão e alguma dose de sorte que “pescara”
o primeiro. Aquele que, de outra forma, estaria condenado a
apodrecer na baía de Lagos. SÓ E ABANDONADO.
Abílio Ferreira
Capitão da Marinha Mercante Portuguesa
Ex-Cadete 393 da Reserva Marítima
O Comandante Luciano Sena Dentinho pertence àquele
grupo de velhos marinheiros de pele curtida pelo tempo,
pelo sol e pelo frio, de temperamento tenaz, vontade fér-
rea, que hoje para todos nós são já uma lenda!
São daqueles que nos vêm à memória quando evoca-
mos o Sudoeste Rijo!
Uma das suas últimas missões, mais visíveis, foi a de
comandar o Bergantim Real que transportou a Rainha
Isabel II de Inglaterra do iate “Britânia” para o Cais das
Colunas, no Terreiro do Paço, em 1957.