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Stratεgia

A2 /AD RAÍZES MARÍTIMAS

No texto anterior abordaram-se os conceitos de Anti-access (A2)          espaço nem no tempo, apenas estando ao alcance de marinhas
     e de Area Denial (AD) – que aparecem, a maior parte das vezes,      muitíssimo poderosas. Por exemplo, a Marinha Britânica deteve
juntos, pelos seus acrónimos: A2/AD. Relembrando, o A2 compreen-         o domínio do mar durante boa parte dos séc. XVIII e XIX, o que
de as ações e capacidades, normalmente de longo alcance, concebi-        levou o Almirante John Jervis, em plena guerra com a França de
das para evitar que uma força opositora entre numa área de opera-        Napoleão, a escrever a célebre frase: “Eu não digo que os france-
ções. Já o AD abrange as ações e capacidades, normalmente de curto       ses não virão; eu apenas digo que eles não virão por mar”.
alcance, concebidas não para manter uma força opositora afastada,
mas para limitar a sua liberdade de ação numa área de operações.           Com o aparecimento do submarino e do avião, esta condição
                                                                         passou a ser praticamente inalcançável, pois nenhuma potência
   Estas expressões são uma evolução de alguns conceitos clássi-         marítima consegue assegurar o domínio global e continuado dos
cos da estratégia marítima, pelo que se justifica recordá-los, de        mares. Este conceito deu, assim, lugar ao de sea control ou, na
forma a perceber como se chegou ao A2/AD.                                terminologia portuguesa, controlo do mar.

THE GREAT COMMON O GRANDE ESPAÇO COMUM                                   SEA CONTROL CONTROLO DO MAR / SEA DENIAL
                                                                          NEGAÇÃO DO MAR
  O grande estrategista americano Alfred Mahan considerava o
mar como “the great common”. Cabe aqui referir que, desde a                O sea control designa, pois, a capacidade de uma marinha po-
idade média, a palavra common tem um significado bem preciso             derosa em dominar uma área marítima e usar o mar para o seu
na língua inglesa, designando um terreno sem dono, partilhado            proveito. Este conceito começou a ser empregue durante a guer-
pelos residentes de uma povoação e usado para benefício de to-           ra fria, numa altura em que era impossível a qualquer dos blocos
dos. Mahan aplicava esta ideia ao mar, considerando-o como o             deter o domínio absoluto do mar. Embora seja usado, por alguns
grande espaço comum da humanidade.

COMMAND OF THE SEA DOMÍNIO DO MAR                                        Sir Walter Raleigh: “whosoever commands the sea, commands (…) the world itself”

  Desde há vários séculos que historiadores e estrategistas teo-
rizam sobre a importância estratégica de garantir a liberdade do
uso do mar e de a negar a um oponente – capacidade habitual-
mente designada como command of the sea, que podemos tra-
duzir por domínio do mar.

  Essa importância foi sintetizada numa célebre frase de Sir Walter
Raleigh, escrita no princípio do séc. XVII: “for whosoever commands the
sea, commands the trade; whosoever commands the trade of the world,
commands the riches of the world, and consequently the world itself".

  Alguns séculos mais tarde, na viragem do séc. XIX para o XX,
dois dos maiores vultos da estratégia marítima, Mahan e Julian
Corbett, também abordaram o command of the sea.

  Mahan escreveu na sua obra capital (“The influence of Sea
Power upon History, 1660-1783”) uma frase que, embora não se
destinasse a definir command of the sea, lhe assenta que nem
uma luva: “aquele devastador poder no mar, que elimina de si a
bandeira inimiga ou que lhe permite apenas fugir; e que, domi-
nando the great common, fecha as rotas pelas quais o comércio
se move para e desde as costas inimigas”.

  Já o britânico Corbett dedicou ao command of the sea um capí-
tulo inteiro da sua obra-prima “Some principles of maritime stra-
tegy”. Aí, Corbett defendeu que “o objeto da guerra naval deve
ser sempre, direta ou indiretamente, assegurar o domínio do mar
ou evitar que o inimigo o assegure”. Corbett considerava ainda
que “a situação normal não é um mar dominado (commanded
sea), mas um mar não dominado (uncommanded sea)”.

  Independentemente das nuances com que cada autor usou
esta expressão, o domínio do mar designa uma condição estra-
tégica que tem um carácter global e continuado, ou seja, denota
uma superioridade marítima e naval que não está limitada no

4 JUNHO 2014
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