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REVISTA DA ARMADA | 499

SAÚDE PARA TODOS                                                                                 27

BURNOUT

  Pode começar por uma intensificação da dedicação ao trabalho. Poderá começar a sentir que não é capaz de responder a todas as
exigências e agudizar o seu estado físico, descansando cada vez menos. De forma lenta, poderá começar a ter a sensação de que tudo é
complicado, difícil e desgastante. Finalmente, atingindo uma situação crítica na qual não se consegue organizar, tem completa ausência
de prazer na sua vida pessoal e profissional, e sente um forte descontrolo em tarefas que habitualmente estariam asseguradas.

Asíndrome de Burnout (to burnout, em             função. Portugal ocupa o sétimo pior lugar,        Este estado de exaustão física e psicológica de-
    inglês, significa queimar por completo)      entre os 33 países avaliados. Já relativamen-   senvolve-se de forma lenta e atravessa doze es-
é também designada por síndrome do es-           te ao consumo de psicofármacos, os portu-       tádios até atingir o seu nível mais grave. Os está-
gotamento profissional. É um distúrbio psí-      gueses ocupam o terceiro lugar na União         gios de Burnout podem suceder-se, alternar-se ou
quico definido em 1970 por Freudenberger         Europeia. O stress laboral é considerado um     ocorrer ao mesmo tempo, até que o quadro de
como «(…) um estado de esgotamento físico        problema de saúde pública, culpado pela re-     facto se instale:
e mental cuja causa está intimamente ligada      dução da qualidade de vida dos trabalhado-      1. Necessidade de autoafirmação: desejo de fazer
à vida profissional». Este psicanalista ame-     res e por custos avultados para os emprega-     tudo de forma perfeita, medo de errar e ambição
ricano autodiagnosticou-se com esta sín-         dores, já que existe diminuição da produti-     excessiva no emprego levam à compulsão por de-
drome: ele dedicava-se de forma excessiva        vidade do trabalhador, e aumento dos dias       sempenho;
ao seu trabalho, movido pelo desejo de ser       perdidos por faltas. Perante um quadro de       2. Dedicação intensificada: para fazer jus às expe-
o melhor, avaliando o seu valor em função        Burnout, o ideal é que o trabalhador procure    tativas exageradas, a pessoa intensifica a dedica-
do sucesso. Até que um dia “queimou”. Fi-        o mais rapidamente possível tratamento. O       ção e sente necessidade de fazer tudo sozinha e a
cou “frito”, como se diz em bom português.       prolongar da situação vai deteriorando, cada    qualquer hora do dia;
Ou, numa gíria mais tecnológica, “crashou”.      vez mais, as suas capacidades para se reor-     3. Desvalorização das necessidades pessoais: a
Já em termos náuticos podemos dizer: “es-        ganizar. Os empregadores/chefias têm tam-       vida profissional ocupa a maioria do tempo, a re-
ticou demasiado o cabo/corda” e não parou        bém eles um papel fundamental nesta sín-        núncia ao lazer e ao descanso é vista como um ato
a tempo.                                         drome, já que são eles os responsáveis pela     de heroísmo;
                                                 avaliação, prevenção e gestão dos fatores de    4. Evicção de conflitos: a pessoa percebe que algo
  Este quadro não é novo, sempre existiram       risco psicossociais no local de trabalho.       não está bem, mas não enfrenta o problema. É
pessoas que tiveram a fadiga crónica como                                                        quando se iniciam as manifestações físicas, tais
companheira, contudo, devido à crise finan-        A Agência Europeia para a Segurança e         como: dores de cabeça, tonturas, tremores, sen-
ceira e à consequente intensificação dos rit-    Saúde no Trabalho tem atualmente em cur-        sação de falta de ar, palpitações, oscilações de hu-
mos de trabalho, com exigências mais eleva-      so a campanha «Locais de Trabalho Seguros       mor, distúrbios do sono, dificuldade de concentra-
das e baixos recursos, bem como as fracas        e Saudáveis». Esta campanha tem três ob-        ção e problemas digestivos;
possibilidades de promoção, as reduções sa-      jetivos: (1) melhorar a compreensão e au-       5. Reinterpretação dos valores: isolamento e ne-
lariais, e os vínculos laborais precários, hou-  mentar a sensibilização no que respeita ao      gação das próprias necessidades. Amigos e passa-
ve um acréscimo considerável do número de        stress e aos riscos psicossociais no trabalho;  tempos são desvalorizados. A autoestima é medi-
casos, com consequências alarmantes.             (2) fornecer orientação, apoio e ferramentas    da pelo trabalho;
                                                 práticas para a gestão de riscos; e (3) chamar  6. Negação de problemas: o profissional torna-
  Ocorrer mais a uns do que a outros não         a atenção dos trabalhadores e das empresas      -se intolerante, julga os outros incapazes, exigen-
resulta apenas das diferenças de personali-      para os benefícios da gestão dos riscos psi-    tes de mais ou indisciplinados. Os contactos so-
dade (como alguns pensam, erradamente),          cossociais.                                     ciais são evitados, cinismo e agressão são os sinais
mas da acumulação do stress laboral, que                                                         mais evidentes;
está na origem de várias perturbações psico-       Uma das ferramentas criadas no contexto       7. Recolhimento: a pessoa afasta-se dos outros,
lógicas. Portanto, qualquer um pode desen-       desta campanha foi o Guia eletrónico sobre      parece irritada e desanimada. No trabalho limita-
volver esta síndrome, apesar de ser mais co-     a gestão do stress e dos riscos psicossociais   -se estritamente ao necessário. Pode haver recur-
mum surgir em homens e mulheres a meio           no local de trabalho. Este guia está disponí-   so ao consumo de álcool e drogas;
da carreira. Na linha da frente desta nova       vel em vários idiomas, incluindo o português,   8. Mudanças evidentes de comportamento: quem
realidade estão os professores, médicos, co-     e é gratuito. Pode ser acedido em https://      era tão dedicado e ativo torna-se apático, tímido
merciais, profissionais de segurança e outros    www.healthy-workplaces.eu/pt/tools-and-         e assustado. Atribui a culpa ao mundo, mas sen-
em que a componente relacional é expressi-       -resources/a-guide-to-psychosocial-risks. Foi   te-se cada vez mais inútil. Dificuldade em aceitar
va, ou seja, aqueles que têm frequentes in-      concebido para responder às necessidades        certas brincadeiras com bom senso e bom humor;
terações intensas ou emocionalmente carre-       dos empregadores e trabalhadores, que co-       9. Despersonalização: desvalorização dos outros e
gadas. Contudo, a dinâmica sociolaboral pa-      meçam a abordar os riscos psicossociais no      de si próprio. Deixa de fazer planos, só pensa no
rece ter mais influência que a profissão em      local de trabalho e precisam de obter orien-    presente e a vida limita-se ao funcionamento me-
si. Os estudantes são também propensos ao        tação sobre os primeiros passos a dar.          cânico. Evita o diálogo e dá prioridade aos e-mails,
Burnout nos anos finais do ensino secundá-                                                       mensagens, recados, entre outros;
rio e no ensino superior. Curiosamente, este                                                     10. Vazio interior: sensação de que tudo é compli-
não é um tipo de Burnout relacionado com o                                                       cado, difícil e desgastante;
trabalho, mas com o estudo intenso continu-                                                      11. Depressão: indiferença, desesperança, exaus-
ado e com a privação do lazer, de atividades                                                     tão. A vida perde o sentido;
lúdicas, ou de outras experiências que moti-                                                     12. Burnout/Síndrome do esgotamento profissio-
vem felicidade.                                                                                  nal: estado de total exaustão física e psicológica.
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  O relatório da OCDE (Organização para a                                                        gio há necessidade de apoio médico e psicológi-
Cooperação e Desenvolvimento Económico)                                                          co urgente.
– Fit Mind, Fit Job – divulgado no passado
dia 4 de março de 2015, revelou que entre                                                                                          Ana Cristina Pratas
15% a 20% da população ativa desenvolve                                                                                                         1TEN MN
perturbações psicológicas no exercício da
                                                                                                         www.facebook.com/participanosaudeparaodos
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